Uma nova configuração geopolítica
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A principal característica da conturbada transição em curso é o declínio relativo da superpotência estadunidense e a emergência de novos polos de poder econômico, político, diplomático e militar. O fenômeno mais representativo desta tendência é o protagonismo da China socialista como potência e a recuperação do poder nacional da Rússia, ambas atuando em parceria estratégica, e a existência do Brics (acrônimo de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Acentua-se a disjuntiva entre o mundo unipolar – prevalecente no período do imediato pós-guerra fria, permanente ambição do imperialismo estadunidense – e a emergente multipolaridade. Esta disjuntiva, com potencial de gerar graves conflitos, faz parte das mudanças objetivas na correlação de forças internacional que decorre do desenvolvimento desigual das nações e de alterações econômicas e políticas que desembocam em uma nova configuração geopolítica internacional. Neste quadro, criam-se situações propícias à luta pela realização de projetos nacionais contra-hegemônicos.
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A deterioração do poderio relativo dos Estados Unidos se manifesta, entre outras coisas, no colossal endividamento público e privado, com as decorrentes implicações para o padrão dólar, na desindustrialização, no recuo de sua participação relativa no comércio exterior, bem como no ranking das aquisições e exportação de capitais. O dólar mantém-se como moeda de reserva e trocas internacionais, mas seu papel tem se reduzido com a crescente tendência à realização de acordos comerciais e cambiais que não tomam a moeda estadunidense como referência. É intensa também a demanda, principalmente por parte da China e demais países do Brics, por uma nova arquitetura financeira e pela reforma do sistema monetário internacional. Observa-se no interior do Brics o mais pujante crescimento econômico – casos de China e Índia – e o reforço do poderio econômico e militar da Rússia. O declínio relativo dos Estados Unidos manifesta-se também nas profundas contradições no seio de sua sociedade. Não se deve, contudo, subestimar o poder desta superpotência e de seus aliados. Os Estados Unidos têm mais de 20% do PIB mundial medido em dólar, força ponderável no sistema financeiro, gigantesco poder agropecuário e a maior capacidade em Pesquisa e Desenvolvimento. O poder militar está assentado no maior gasto mundial em defesa, bem como numa ampla rede de bases militares espalhadas por todo o mundo (sobretudo em regiões estratégicas, como estreitos e zonas de produção e escoamento de hidrocarbonetos).
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A República Popular da China, que fortalece sua soberania nacional e constrói o socialismo com características próprias, sob a direção do Partido Comunista, é a principal concorrente dos Estados Unidos, com potencial para tornar-se a principal economia do planeta (já é a maior se a medição for pelo critério de Poder Paritário de Compra – PPC), constitui um forte poder nacional e um fator preponderante nas relações internacionais. Além disso, amplia crescentemente a condição de principal parceira comercial de um número grande de países, hoje superior a uma centena. A China está no centro de uma mudança na arquitetura financeira mundial, criando alternativas à hegemonia dos Estados Unidos estruturada no sistema Bretton Woods (dólar, Banco Mundial e FMI). A nação asiática tem sido ainda a promotora do maior projeto de integração de infraestrutura (energia, comunicação e transportes) de que se tem notícia: a Nova Rota da Seda. Por ter o Estado como indutor central do desenvolvimento e propulsor da economia, combinado com o respeito à soberania dos países com os quais se relaciona, a China cumpre papel econômico e geopolítico decisivo na atual quadra histórica.
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As relações entre a República Popular da China e os Estados Unidos da América têm sido marcadas por uma dualidade: no discurso diplomático, por se tratar da relação bilateral mais importante do mundo, ambos os países fazem promessas de cooperação mútua; na prática, o imperialismo estadunidense busca conter a ascensão da China, enquanto o país asiático busca criar mecanismos para reformar o atual sistema financeiro liderado pelos Estados Unidos e modificar o ambiente político internacional a seu favor.
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Por seu turno, a Rússia recupera sua condição de potência e participa intensamente das disputas geopolíticas. A atuação russa no conflito na Síria opõe-se à política dos Estados Unidos e seus aliados. O prolongado conflito, palco de demonstração de forças das principais potências mundiais, propiciou o enraizamento da organização terrorista Estado Islâmico, que a Rússia tem combatido com protagonismo.
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A União Europeia (UE), sob hegemonia alemã, acentua sua natureza imperialista, oscila entre aliança e rivalidade com os Estados Unidos e atua como linha de frente no combate à Rússia. Mas a UE vem se enfraquecendo desde o início da atual crise capitalista. As dificuldades econômicas de Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha culminaram no colapso da Grécia, com a imposição de um ajuste sobre os ombros das classes trabalhadoras. O sentimento contrário à integração europeia tem crescido desde então. À quase saída grega da UE, seguiram-se a saída da Grã-Bretanha e o crescimento de candidaturas presidenciais com a mesma pauta política refratária à União Europeia.
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No Oriente Médio, o Irã atua como força regional oposta ao imperialismo estadunidense e ao sionismo israelense, que persiste em sua criminosa política de opressão ao povo palestino. Os Estados Unidos e Israel fazem também ameaças constantes a países da região – como o próprio Irã, a Síria e o Líbano, nomeadamente contra o Hezbollah – e concertam alianças com regimes autocráticos e reacionários, como o da Arábia Saudita.
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O continente africano é palco de intensas disputas econômicas, geopolíticas e militares. Persistem as chagas do subdesenvolvimento herdadas do colonialismo, a despeito dos esforços que fazem alguns governos agrupados no seio da União Africana. A África do Sul, como integrante do Brics, voltou a ser a principal economia da região. A paz, o desenvolvimento, o progresso social e a soberania nacional continuam como grandes aspirações dos povos africanos.
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A combinação de guerras com políticas neoliberais tem gerado massas de deslocados, migrantes e refugiados, destruição de economias, solapamento de instituições, miséria, desemprego e fragmentação territorial. Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), havia um total de 65,3 milhões de pessoas deslocadas por guerras e conflitos até 2015 – o maior da história. Somente na agressão imperialista na Síria, quase meio milhão de pessoas foram mortas. Não por acaso, os países com maior número de refugiados são justamente aqueles agredidos pelos Estados Unidos e seus aliados, entre os quais Síria, Somália, Iraque, Líbia e Afeganistão.
A crise sistêmica e estrutural do capitalismo
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Em meados de 2007 teve início a grande crise econômico-financeira mundial, com epicentro nos Estados Unidos. Hoje, 10 anos depois, o mundo ainda vive sob o signo desta crise, uma das mais longas e graves da história, equiparável às de 1873 e 1929. Uma grave e prolongada crise estrutural, indissociável de sua natureza de classe e das contradições que lhe são inerentes. Sua singularidade é a dimensão inédita de um fenômeno que constitui uma das características do capitalismo em sua fase imperialista: a hipertrofia do capital financeiro, que expressa sua dominação desde o século 20, tal como assinalado por Lênin. No capitalismo contemporâneo, neoliberal, a riqueza produzida é acumulada predominantemente na especulação e no rentismo. A massa de capitais financeiros segue expandindo e em 2014 somava US$ 232 trilhões, mais de três vezes o PIB mundial.
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A recessão nos Estados Unidos não demorou a contagiar os demais países e se transformar num problema global. Notadamente na Zona do Euro, a partir de 2008 a economia mergulhou na depressão, e a seguir na estagnação severa. Na União Europeia, às voltas com os dilemas do euro, o desemprego subiu a níveis inéditos na história. A crise aguçou as contradições sociais no interior das nações, bem como os conflitos internacionais.
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A crise decorre das leis objetivas próprias do sistema capitalista, dos mecanismos de obtenção de superlucros, de concorrência desenfreada pela produtividade do trabalho, de extração da mais-valia absoluta e relativa, de acumulação de riqueza num polo e expansão da pobreza em outro, de tendência à queda da taxa média de lucro, de superprodução relativa. A crise estrutural e sistêmica ressalta, como características essenciais da etapa imperialista e da crise atual, o predomínio do parasitismo financeiro, a concentração e centralização do capital, a divisão dos mercados entre os grandes conglomerados monopolistas-financeiros, o rentismo, a especulação, a extrema exploração dos trabalhadores, a destruição de forças produtivas, o desemprego em massa e o uso da inovação tecnológica e científica para aumentar os lucros e intensificar a exploração dos trabalhadores.
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A tendência do capitalismo à concentração e à centralização do capital e da renda, à polarização social e ao aumento do grau de exploração da força de trabalho foi notoriamente exacerbada. Estima-se que 1% da população no topo da pirâmide social se aproprie de 50% da riqueza produzida enquanto 75% de pobres dividem, entre si, míseros 3% do valor da produção.
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O caminho percorrido sob o comando do grande capital monopolista-financeiro no quadro da crise é o da adoção de uma espécie de ajuste com imensas proporções: o neoliberalismo em escala exponencial, com implicações devastadoras para as soberanias nacionais e os direitos dos trabalhadores, cujo nível de vida se degrada continuamente. A burguesia reage às perturbações econômicas radicalizando ainda mais o neoliberalismo. Na Europa, prossegue o desmantelamento do chamado Estado de Bem-Estar Social. O direito do trabalho também está sendo destroçado, a precarização avança e aspectos das relações sociais de produção retrocedem às condições existentes nos primórdios do capitalismo.
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Os desequilíbrios globais inerentes ao intercâmbio produtivo, comercial e financeiro dos Estados Unidos com o resto do mundo, destacadamente com a China, também constituem fatores ponderáveis da crise do capitalismo. Ou seja, os déficits gêmeos (fiscal, comercial e em conta corrente), assim como o formidável endividamento que deles decorrem.
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Não é possível compreender o aprofundamento e a extensão da crise sem enxergar sua associação com esses desequilíbrios, que também foram evidenciados nas medidas adotadas para contornar a recessão. Desde a eclosão da crise financeira em 2007, o mecanismo adotado para reanimar a economia consiste no aporte de estímulos financeiros, com a injeção de recursos públicos na banca e a emissão de todo tipo de papéis, o que só resulta em aumento do endividamento, da especulação e do rentismo – prenúncio de novas crises.
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De um lado, a intervenção inédita dos Estados capitalistas, em apenas aparente contradição com a ideologia neoliberal, não teve os efeitos esperados e alardeados pelos governos. A recuperação não veio no ritmo dos ciclos econômicos anteriores. De outro lado, os trilhões destinados ao socorro de bancos e grandes empresas falidas promoveram a explosão dos déficits e crises fiscais. Novas bolhas financeiras foram formadas e alimentadas. A emissão desbragada de dólares exportou a instabilidade cambial para o mundo.
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A crise expôs as contradições e os limites da ordem internacional remanescente dos acordos de Bretton Woods, fundada na hegemonia do imperialismo americano e no padrão dólar, refém da crise fiscal e dos desequilíbrios provocados pelos Estados Unidos. A Organização Mundial do Comércio (OMC) está em questão. Sob a administração Trump, abrangentes acordos globais dos Estados Unidos, como a Parceria Transpacífico (TPP, do inglês Trans-Pacific Partnership) e o tratado com a União Europeia, são encerrados, e os Estados Unidos anunciam uma política comercial voltada à recomposição de sua economia.
A crise do capitalismo e os trabalhadores
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A crise e o processo de reestruturação produtiva são fenômenos que interagem e têm efeitos devastadores para os(as) trabalhadores(as). Ampliação do desemprego, salários em queda e retirada de direitos e aumento da desigualdade de gênero compõem um quadro de precarização crescente do trabalho. Os avanços da denominada quarta revolução industrial ou da indústria 4.0 – inteligência artificial, robótica, internet das coisas, veículos autônomos, impressão em 3D, nanotecnologia e outras inovações – potencialmente permitem a diminuição do trabalho manual, a maior qualidade de vida do povo e refletem também no próprio trabalho intelectual. No entanto, estes avanços chocam-se com as relações de produção imperantes, que impedem sua generalização em benefício dos povos, ou são incorporados seletivamente, liquidando milhões de empregos e dezenas de profissões. A reestruturação produtiva tem mudado profundamente as características da classe trabalhadora e suas frações e atinge também estratos de outras classes sociais. Essa realidade põe em evidência a necessidade da luta pelo socialismo.
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Atualmente, a produção pode ser realizada em países ou locais diferentes, de acordo com os interesses do capital. A linha de produção é substituída por pequenas e flexíveis unidades produtivas e o uso crescente de novas tecnologias. Essas transformações no mercado de trabalho afetam a organização dos trabalhadores, que fica mais debilitada.
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Uma medida essencial, nos marcos desta nova realidade, é uma radical redução da jornada de trabalho. Ao lado disso, impõe-se a luta por uma legislação especial destinada a preservar a ocupação e a renda dos trabalhadores, taxando fortemente as demissões e criando alternativas para mitigar os efeitos negativos de tecnologias que desempregam. Entretanto, tais soluções também se chocam com a lógica do capitalismo contemporâneo de austeridade e cortes de direitos.
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A crise do capitalismo provoca o aumento e a intensificação da opressão sobre os trabalhadores. A consequência é o crescimento da resistência e da luta do proletariado. Os trabalhadores e seus aliados aprenderam a utilizar ferramentas que são suas – como as greves, os sindicatos, os comícios, as passeatas – e também os mecanismos da democracia burguesa, em sua ampla maioria conquistados por eles próprios em lutas heroicas, que vêm desde o início do século 19. O grande capital, a fim de ampliar a superexploração, busca liquidar não só os instrumentos típicos da luta dos trabalhadores, mas a própria liberdade política em sua ampla acepção. Reprime a ferro e fogo, ataca os sindicatos, as greves e o direito de associação, liquida os espaços públicos de convivência e encontro, e investe até mesmo contra os mecanismos típicos da democracia burguesa, como as eleições e os parlamentos.
Conflitos políticos e ofensiva imperialista
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Os acontecimentos atuais revelam que os processos de transição no mundo não ocorrem nem transcorrerão de forma tranquila e pacífica. Presenciamos uma crescente agressividade da potência hegemônica e, por conta disto, uma perigosa corrida armamentista no mundo. Os gastos militares globais consumiram US$ 1,7 trilhão em 2016, com os Estados Unidos respondendo por mais de um terço deste total. As tensões e os conflitos entre as classes sociais no interior das nações e entre as nações, no plano internacional, estão em alta. A possibilidade de grandes conflagrações já não parece tão remota. Apesar de diferenças significativas quanto à forma de enfrentar a crise econômica, as diversas facções do imperialismo estadunidense têm um importante ponto de convergência: todas defendem o reforço da hegemonia mundial dos Estados Unidos.
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Elemento essencial da situação internacional é a ofensiva do imperialismo estadunidense e seus aliados contra os direitos e a soberania dos povos, que implica golpes, intervenções e guerras, sempre resultando em violação da soberania, do direito internacional e ameaça aos direitos dos povos e à paz. Logo no início dos anos 1990 assistimos à intervenção no Golfo Pérsico com vistas a transformar o Oriente Médio em território de exclusiva influência dos Estados Unidos. Seguiram-se as intervenções no Afeganistão (2001), Iraque (2003), Líbia (2011) e Síria, onde está em curso, há seis anos, um devastador conflito provocado pelo intervencionismo das potências imperialistas (Estados Unidos e UE), do sionismo israelense e das monarquias reacionárias árabes. Além das intervenções diretas, multiplicam-se formas de intervenções indiretas. Os golpes se sofisticam, deixando de se restringir às quarteladas predominantes entre os anos 1950 e 1980. Têm ocorrido as chamadas “revoluções coloridas” como a da Geórgia (Revolução Rosa, em 2003), da Ucrânia (a Revolução Laranja, em 2004 e 2014), e do Quirguistão (a Revolução das Tulipas, em 2005), bem como golpes constitucionais em Honduras (2009), Paraguai (2012) e Brasil (2016). Ademais, está claro que a Primavera Árabe teve participação e estímulo externos, criando condições para intervenções em diversos países.
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Outro aspecto essencial para compreender a conjuntura internacional é a militarização. Em primeiro lugar, a expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) em direção aos países que faziam parte do antigo campo socialista. Após a desintegração da URSS, ao contrário de desaparecer, a Otan se fortaleceu, ampliando sua agenda política, com um discurso de segurança que abarca questões não só militares, mas também políticas, econômico-sociais e ditas “humanitárias”, e seu escopo geográfico, com a expansão para os Países da Europa Central e do Leste (PECL). A Organização mais que dobrou o número de integrantes: em 1999, ingressaram Hungria, Polônia e República Tcheca; em 2004, foram incluídas Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Romênia, Eslováquia e Eslovênia; e em 2009, aderiram Albânia e Croácia. Segundo, a expansão de bases militares no esteio da denominada “Guerra Global ao Terror” desencadeada a partir de 2001. Por fim, a ameaça nuclear e a tentativa de construir escudos antimísseis na Europa. Foi anunciado em 2016, na cúpula da Otan em Varsóvia, o início operacional do sistema defensivo de mísseis balísticos, integrando as funções dos radares instalados na Turquia, dos navios estadunidenses baseados na Espanha e a instalação interceptadora na Romênia contra a Rússia. Na Ásia está em processo de instalação o Terminal de Defesa Aérea para Grandes Altitudes (Thaad, na sigla em inglês) na Coreia do Sul contra China e Coreia Popular. Por fim, a Otan ensaia incluir em sua área de influência o Atlântico Sul, ameaçando o entorno estratégico do Brasil, Uruguai e Argentina.
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Há um entrelaçamento das novas tecnologias midiáticas e bélicas para potencializar os esforços intervencionistas. Por um lado, a grande mídia ocidental, em função dos novos meios de que dispõe, demoniza governos e insufla oposições como nunca antes, potencializando desestabilizações. Por outro, novas tecnologias ampliaram os meios de guerra das potências, por meio do comando do espaço (satélites) e da inteligência artificial que permitem a automação de diversas operações, como munições guiadas, drones, ciberguerra etc. Também na cúpula de Varsóvia a Otan deixou clara a tendência de militarização do ciberespaço, que caracterizou abertamente como um novo “espaço operacional”.
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O recurso ao método manu militari é o caminho pelo qual o imperialismo, quando não tem alternativa, tenta deter e inverter o seu declínio e impor à força sua hegemonia. Para além dos aspectos econômico, cultural e diplomático, os Estados Unidos levam a efeito uma estratégia intervencionista e militarista para assegurarem um domínio multifacetado de amplo espectro que pode levar o mundo a graves conflitos e perigosas conflagrações. Para robustecer a política belicista do imperialismo, Donald Trump aumentou o orçamento militar para US$ 603 bilhões em seu primeiro ano de mandato (2017). A crescente militarização do planeta, a expansão da Otan para o leste da Europa, visando à Rússia, o aumento do número de bases militares, a modernização das armas nucleares e a elaboração de uma estratégia militar centrada na Ásia, visando à China, são aspectos essenciais da ofensiva do imperialismo, além das investidas no Atlântico Sul com a reativação da 4ª Frota Naval.
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A crise econômica e os conflitos geopolíticos têm resultado em impasses políticos e descrédito das corrompidas instituições que conformam a democracia sob a hegemonia do capital. Décadas de aplicação do neoliberalismo, com suas consequências devastadoras, foram sustentadas na esfera da comunicação e da propaganda por um sistema midiático que apostou intensamente na despolitização e na incultura, como forma de alienar as grandes massas das verdadeiras causas das contradições sociais. Isso ajudou decisivamente a canalizar o desencanto com o neoliberalismo, não para saídas mais avançadas, mas para o ataque às próprias liberdades democráticas. Na verdade, assiste-se no plano político, em escala global, ao desenvolvimento de uma onda conservadora, de direita e de cunho fascista. Os resultados das últimas eleições presidenciais nos Estados Unidos e a disputa no segundo turno das eleições presidenciais na França, polarizadas entre a direita e a extrema-direita, são indicadores dessa tendência. A xenofobia se torna lugar comum, enquanto as políticas imperialistas ganham contornos racistas e colonialistas. Dissemina-se o individualismo exacerbado. Empreende-se sistemática campanha para desinformar e despolitizar a sociedade. Ataca-se a democracia. Procura-se excluir as forças progressistas dos parlamentos. Impõe-se legislações e novas constituições para atender aos interesses do capital financeiro. Realiza-se antirreformas para esvaziar o papel do Estado como fator de proteção dos direitos sociais e indutor do desenvolvimento.
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Também sofrem ataques os direitos individuais, que são solapados pela violência do Estado a serviço do grande capital. Há um processo de supressão de direitos e garantias individuais que foram conquistadas há séculos. Há restrições ao Estado Democrático de Direito e ao devido processo legal. As polícias, em todo o mundo, ampliam o recurso à violência e à arbitrariedade, seja quando atuam contra as lutas populares, seja no cotidiano das cidades, onde cresce a violência, dirigida especialmente contra os mais pobres.
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A generalizada insatisfação dos trabalhadores e dos povos com as sequelas da crise se expressa de forma contraditória tanto no plebiscito que consagrou a saída do Reino Unido da União Europeia, quanto na eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, como nos elevados percentuais da extrema-direita nas eleições presidenciais na França. Tais fatos expõem uma singularidade marcante, a de novos impasses da globalização neoliberal, com os riscos de chauvinismo, protecionismo, guerras comerciais e cambiais em defesa dos interesses nacionais dos países imperialistas e em detrimento dos países em desenvolvimento. O nacionalismo que emerge nos países imperialistas é por natureza reacionário e um perigo, pois só se realiza atacando outras nações, massacrando povos e promovendo choques interimperialistas. Esses fenômenos evidenciam a emergência da questão nacional, do anti-imperialismo e das causas populares como vetores principais da luta dos povos no quadro de um sistema internacional inerentemente anárquico e instável.
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As políticas neoliberais geram uma crise multilateral: ambiental, alimentícia e energética. Os países adotam políticas diferenciadas em relação ao tema. O governo dos Estados Unidos, sob Trump, nega as mudanças climáticas e subestima a questão ambiental. Já a União Europeia a reconhece, mas procura encontrar nela uma saída para a crise através da chamada economia verde. Com essa abordagem, pretende assegurar a exportação de capitais, tecnologia e venda de equipamentos de combate aos danos ambientais. Os países em desenvolvimento, por meio do G-77+China, defendem o desenvolvimento sustentável associado à afirmação da soberania nacional e a inclusão dos três eixos (econômico, social e ambiental) defendidos nas conferências internacionais como fundamento do desenvolvimento sustentável.
América Latina: Imperialismo tenta impor restauração conservadora
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A América Latina conheceu nas duas últimas décadas um ciclo progressista cujo ponto inicial foi a eleição de Hugo Chávez para a presidência da Venezuela em 1998. Desde aquele ano em que Chávez se elegeu, em doze países da região forças populares chegaram ao governo nacional por meio do voto: Venezuela, Brasil, Argentina, Uruguai, Chile, Bolívia, Nicarágua, Equador, Paraguai, Honduras, El Salvador e República Dominicana.
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A onda progressista repercutiu em toda a região, alterando significativamente a correlação de forças e contrapondo-se ao poder do imperialismo estadunidense que, isolado, sofreu derrotas e teve de reconhecer a Revolução Cubana e retomar as relações diplomáticas com a ilha caribenha, em dezembro de 2014.
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A luta contra o neoliberalismo e pela integração latino-americana avançou. Milhões de pessoas saíram da pobreza e foram criados valiosos instrumentos de integração regional: a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América – Tratado de Comércio dos Povos (Alba-TCP), a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e o Acordo de Cooperação Energética Petrocaribe.
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Os governos democráticos, patrióticos e populares da América do Sul, alguns deles revolucionários e com rumo socialista, basearam sua plataforma política na promoção dos direitos sociais, no reforço do Estado nacional, na nacionalização dos recursos energéticos e, em alguns casos, na realização de transformações estruturais.
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Está em curso uma ofensiva para liquidar essas conquistas. As forças reacionárias locais e o imperialismo estadunidense exploram as dificuldades econômicas e sabotam a economia com fins políticos. No caso da Venezuela, realizam literalmente uma guerra econômica para desestabilizar o governo revolucionário bolivariano. A inflação e o desemprego refletem-se fortemente no ânimo do povo – o que é incessantemente usado pela mídia e pelos conservadores. Essa situação resultou, no final de 2015, num revés: a vitória da oposição nas eleições parlamentares na Venezuela. Também em 2015, o neoliberal Maurício Macri vence as eleições presidenciais na Argentina. E, em 2016, acontece o golpe de Estado no Brasil. O retrocesso já consumado no Brasil e na Argentina marca um ponto de inflexão no ciclo progressista latino-americano.
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A mudança da situação na Argentina e no Brasil permite aos novos governos agirem de forma concertada nos aspectos essenciais da política externa em relação ao restante da região. O objetivo principal é solapar o processo de integração regional, esvaziar o eixo Sul-Sul, enfraquecer o Brics, e realinhar-se subalternamente aos Estados Unidos e à Europa. O vértice da integração sul-americana vem sendo desmontado. De forma gradativa, a Unasul é esvaziada, a Celac é ignorada e o Mercosul reflui para um simples tratado de livre comércio, renunciando a qualquer ambição de promoção do desenvolvimento comum dos países do bloco.
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Particularmente grave é a situação criada pelo imperialismo e as oligarquias na Venezuela, onde recorrem a métodos abertamente terroristas, contando para isso com o apoio e o incentivo do imperialismo e da mídia a seu serviço. Fica nítido que a oposição de direita resolveu apostar tudo na ruptura violenta, mas encontra pela frente uma revolução decidida a se defender, com base de apoio real na massa e que sustenta uma firme aliança do povo com as Forças Armadas Bolivarianas. A Revolução Bolivariana está, assim, diante de um desafio: restaurar a estabilidade econômica e política, fortalecer o diálogo e a unidade no seio do povo e seguir aprofundando as transformações políticas e sociais. O governo bolivariano decidiu enfrentar esses desafios por meio da convocação da Assembleia Nacional Constituinte.
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Honduras, em 2009, e Paraguai, em 2012, sofreram golpes de Estado, com a deposição dos seus presidentes. Bolívia, Equador e El Salvador também enfrentam turbulências com características bastante semelhantes às da ofensiva em outros países da região. Estas características revelam uma clara articulação internacional do imperialismo com os setores conservadores e reacionários em cada país da América Latina. Também no alvo da ofensiva do imperialismo, Cuba continua sob bloqueio econômico. A administração estadunidense, sob o comando de Trump, adotou medidas restritivas ao comércio e ao turismo, que afetam os acordos feitos entre o governo socialista cubano e o governo estadunidense anterior.
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Na América Latina e Caribe, apesar da ofensiva conservadora, Cuba, Venezuela, Uruguai, Chile, Bolívia, Nicarágua, Equador, El Salvador e República Dominicana continuam com governos que se situam no campo progressista (com diferentes características e conteúdos), mas o fato de os dois mais importantes países da América do Sul – Brasil e Argentina – passarem às mãos da direita é fator de desequilíbrio em desfavor da jornada patriótica, democrática e popular.
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No contexto da crise do capitalismo e da intensificação dos conflitos geopolíticos, acentua-se a luta de classes no plano mundial. A intensificação da ofensiva imperialista contra direitos, liberdades e soberania nacional desperta a luta democrática, nacional e libertadora dos povos. De variadas características e formas, variados graus de intensidade, composição nacional e social, é uma luta de classes multilateral, combinada com fatores democráticos, nacionais e sociais, que converge para o leito do anti-imperialismo. Isto impõe a busca de alternativas que assegurem a soberania das nações, a prosperidade e o desenvolvimento dos países, a integração assentada na cooperação mútua entre Estados e povos, a democracia, os direitos sociais e a paz.
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É nesse quadro que atuam e se desenvolvem – em meio a grandes dificuldades políticas, ideológicas e organizativas – as forças progressistas, anti-imperialistas, revolucionárias e comunistas. A correlação de forças no plano mundial mantém-se desfavorável às correntes revolucionárias, nacional-libertadoras, anti-imperialistas, entre elas os partidos comunistas, o que implica objetivamente um prolongado processo de acumulação revolucionária de forças. O novo quadro geopolítico em curso no mundo exerce forte impacto sobre as lutas dos povos. As contradições entre as potências imperialistas, ao tempo em que aumentam os perigos de guerras e intervenções, causam fissuras que dão maior margem de manobra à resistência nacional e popular e precisam ser tomadas em consideração na luta pela paz e por uma nova ordem em que prevaleçam a democracia, o direito internacional, a soberania e a autodeterminação dos povos. Não obstante as dificuldades, intensifica-se objetivamente a luta de classes, que é – em sentido amplo, incluindo neste conceito a luta anti-imperialista – um dos traços que caracterizam o momento histórico. Diante do sistema capitalista-imperialista, de sua profunda crise estrutural e sistêmica, da execução de políticas neoliberais, das políticas de guerra, da natureza reacionária do sistema político e econômico burguês, ganha relevo a tarefa de firmar em cada país e em interação uns com os outros as forças revolucionárias capazes de abrir caminho para superar os graves impasses em que a humanidade se encontra. O PCdoB, ao mesmo tempo em que reafirma que são artificiais as tentativas de impor estratégias e táticas rígidas ao conjunto do movimento comunista, defende a intensificação dos intercâmbios de opiniões e experiências.
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Em cinco países, onde vivem mais de 20% da população do planeta, partidos comunistas dirigem experiências de construção e de transição ao socialismo. China, Vietnã, Cuba, República Popular Democrática da Coreia e Laos, cada um com suas peculiaridades e com diferentes níveis de resultados, empenham-se na luta por uma nova sociedade, em meio a situações nacionais complexas e a um quadro mundial hostil. O seu fortalecimento como nações soberanas, os esforços que fazem os seus povos, sob a direção dos partidos comunistas dirigentes do Estado, para viabilizar as estratégias de desenvolvimento e a transição ao socialismo, as ações de cooperação internacional e em prol da paz, têm o apoio e a solidariedade do PCdoB.
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Além das experiências socialistas citadas, governos populares e não alinhados com as potências são bastiões de luta contra forças imperialistas. Não obstante as dificuldades, há inúmeros povos que mantêm suas lutas anti-imperialistas e de libertação nacional. Cabe destacar a brava luta de resistência do povo palestino pela constituição de seu Estado, diante da histórica violação por Israel de todas as decisões da ONU desde a Partilha. O caso da luta do povo do Saara Ocidental também é ilustrativo, pois sobrevive a todas as adversidades. O povo heroico da Síria e seu governo realizam uma resistência que se transformou em uma das principais frentes de combate ao imperialismo.
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Na situação mundial de crise – em que se revela a incapacidade do capitalismo de responder aos anseios de paz, desenvolvimento e progresso social dos povos –, as forças revolucionárias e comunistas devem reforçar que o socialismo é a única alternativa capaz de pôr fim às guerras, à miséria e à precarização da vida dos trabalhadores.
Luta anti-imperialista e internacionalismo
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O quadro de ofensiva do imperialismo exige das forças progressistas e do PCdoB que reforcem ações políticas, movimentos de massas, iniciativas unitárias para reforçar a luta anti-imperialista e pela paz. O PCdoB rege-se pelo princípio do internacionalismo proletário, com rica experiência acumulada neste terreno. Apoia as políticas e iniciativas contra-hegemônicas, em defesa da paz, da autodeterminação das nações, do desenvolvimento soberano com justiça social, do direito internacional, da democratização das relações internacionais, que têm lugar no âmbito de blocos de países como o Brics, a Celac e de organismos multilaterais. A causa nacional é parte indissociável da luta anti-imperialista e pelo socialismo. Os comunistas dedicam-se com afinco a atuar no Conselho Mundial da Paz (CMP) e no Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz) e em entidades internacionais dos trabalhadores (FSM), da juventude (FMJD), das mulheres (Fedim) e outras correlatas dos movimentos sociais.
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O 14º Congresso reitera o compromisso com a solidariedade para com os povos em luta pela paz, a soberania nacional, a justiça social e a revolução política e social. No exercício das suas tarefas internacionalistas, o PCdoB participa em encontros de partidos comunistas, de convergência entre forças amplas de esquerda e em movimentos anti-imperialistas. Ao longo dos anos, a ação internacionalista dos comunistas brasileiros intensificou-se, diversificou-se, ampliou-se, projetando o Partido como uma destacada força no cenário do movimento comunista internacional e da luta anti-imperialista, com a perspectiva do socialismo, ideal de emancipação dos trabalhadores e dos povos. Nas relações com o conjunto do movimento comunista, seja no âmbito multilateral, seja no bilateral, o PCdoB atém-se ao método da unidade, independência, igualdade, do respeito mútuo e da não interferência nos assuntos internos de outros partidos e organizações.
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Por uma feliz coincidência, o 14º Congresso realiza-se no momento em que em todo o mundo são feitas justas homenagens ao centenário da Grande Revolução Socialista Soviética. Destacamos seu caráter internacionalista e a grande influência que exerceu ao impulsionar as lutas libertadoras ao longo do século 20. A Revolução Soviética representou um apoio colossal aos trabalhadores e povos em todo o mundo. Nenhum outro acontecimento político-social materializou com tamanha dimensão a palavra de ordem lançada seis décadas antes por Marx e Engels: “Proletários de todos os países, uni-vos!”. A Revolução Socialista de 1917 teve extraordinário impacto internacional, exerceu influência direta sobre acontecimentos subsequentes, mudou a face do mundo e deixou marca indelével na história. Para os comunistas brasileiros, a Revolução Russa, triunfante em 1917, seu rico legado, bem como as lições extraídas dos erros e insuficiências, serão sempre uma fonte de inspiração e ensinamentos nos combates que se realizam hoje, sob novas condições, na resistência à feroz ofensiva do sistema capitalista contra os trabalhadores e os povos e para abrir caminho à nova etapa da luta pelo socialismo.
II – BALANÇO DOS GOVERNOS LULA E DILMA E AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DO PCdoB
O ciclo dos governos Lula e Dilma
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Para o PCdoB, a análise do ciclo dos governos Lula e Dilma (2003- 2016) tem como referência os passos e realizações na direção de um novo projeto nacional de desenvolvimento. E, noutro polo, as condicionalidades, as insuficiências, os erros que – associados aos efeitos da acirrada luta de classes entre os campos em disputa – levaram ao golpe que pôs abaixo o governo da presidenta Dilma Rousseff.
O legado: quatro eixos de realizações
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O legado pode ser sistematizado em quatro eixos que estão abaixo discriminados. O Brasil se levantou, retomou o desenvolvimento, promoveu amplo progresso social. O país percorria um caminho que o direcionava para se tornar uma Nação crescentemente soberana, democrática e próspera. O ciclo demonstrou, mesmo levando-se em conta os erros, a capacidade das forças de esquerda de governarem com êxito o país.
1) Política externa “ativa e altiva”
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A política externa foi vitoriosa em contribuir para o esforço de o país retomar o crescimento econômico e, ao mesmo tempo, para o impulso da integração continental e de uma nova correlação de forças no sistema internacional, defendendo a paz e o desenvolvimento soberano dos países. O Brasil ampliou e diversificou o leque de seus parceiros comerciais, e se projetou no mundo como um ator importante de novos polos estratégicos como o grupo Brics. Teve destacado desempenho para inviabilizar o projeto neocolonial da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), ao mesmo tempo que fomentou a criação da Unasul e da Celac, além de fortalecer o Mercosul. Contribuiu para garantir a participação do movimento social brasileiro nos espaços de participação da sociedade nas organizações de integração regional.
2) Estado e desenvolvimento
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Os governos Lula e Dilma enfrentaram o dogma do “Estado mínimo” e deram passos na direção de recompor o papel do Estado nacional como alavanca do desenvolvimento. Neste contexto, colocou-se fim às privatizações e foram fortalecidas as empresas estatais, entre elas a Petrobras, com a riqueza do pré-sal explorada por meio do regime de partilha, e também foi fortalecido o polo de bancos públicos, principalmente o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em 2007, foi lançado o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC). Foram valorizados e aumentados os efetivos dos recursos humanos do Estado. Ações conjugadas do governo envolvendo investimentos e obras de infraestrutura, entre outras, desencadearam uma crescente participação do Norte, Centro-Oeste e Nordeste no Produto Interno Bruto (PIB) nacional e substantivo crescimento da renda das famílias dessas regiões. Fortaleceram-se setores importantes como a agropecuária, a produção de alimentos, a engenharia nacional, a construção civil, a indústria naval, a cadeia de petróleo e gás, o projeto de submarino de propulsão nuclear com tecnologia nacional, entre outras iniciativas.
3) Crescimento e distribuição de renda
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Os governos Lula e Dilma associaram crescimento econômico e distribuição de renda. Mais de 36 milhões de pessoas foram retiradas da condição de pobreza extrema. Entre 2003 e 2012 houve a geração de quase 20 milhões de empregos formais, o salário-mínimo, regido por uma política inédita de reajuste entre 2002 e 2014, obteve um aumento real de 71,5%, constituindo-se num dos principais fatores que promoveram uma mobilidade para cima na pirâmide social em escala de milhões. Para além da redução progressiva da desigualdade no Brasil pelo índice Gini, houve aumento do valor real médio dos salários no país por doze anos consecutivos – o que configura uma importante vitória da economia política do trabalho sobre a economia política do capital no início da estruturação de um novo projeto de desenvolvimento nacional. A renda dos pequenos agricultores elevou-se, bem como o crédito subsidiado à agricultura familiar. O programa Minha Casa, Minha Vida proporcionou moradia digna para 6,8 milhões de brasileiros, e o Luz para Todos beneficiou 15,6 milhões de pessoas. Na saúde, embora tenham persistido deficiências graves devido principalmente ao subfinanciamento, houve esforços para se fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS). Programas como Mais Médicos, Farmácia Popular, Brasil Sorridente e os que concorreram para a significativa redução da mortalidade infantil proporcionaram importantes conquistas ao povo. A educação teve expansão significativa. A partir de 2003 foram criadas 18 universidades federais, quase dobrando o número de matrículas. O Programa Universidade para Todos (ProUni) beneficiou 1,2 milhão de estudantes e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) firmou 2,5 milhões de contratos. Até 2002, o Brasil possuía apenas 140 escolas técnicas. De 2003 a 2016, 500 novas unidades foram criadas.
4) Resgate do processo de construção da democracia
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O processo de construção da democracia foi retomado, com a questão democrática entrelaçada à questão social. As entidades e manifestações do povo foram valorizadas. O diálogo e a negociação foram a base da relação entre o governo e os movimentos sociais. As centrais sindicais foram legalmente reconhecidas. As conferências temáticas, que reuniram centenas de milhares de pessoas jogaram papel importante na elaboração de políticas públicas. Secretarias especiais e programas foram implantados para promover os direitos humanos e civis. Houve avanços significativos na promoção de políticas públicas para as mulheres, a juventude, os negros e a população LGBT. O racismo foi combatido, bem como a homofobia. Foi criada a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir). Houve, em especial, forte avanço das políticas públicas de gênero com o objetivo de promover a representação política das mulheres, combater a desigualdade no âmbito do trabalho, melhorar a saúde integral, assegurar os direitos sexuais e reprodutivos e combater a violência. Foi criada a Secretaria de Políticas para as Mulheres, com status de Ministério, e houve grande aumento do número de organismos de políticas paras mulheres. No governo Dilma, foi atendida uma reiterada reivindicação das forças democráticas para constituir e concluir os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade.
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Prevalecem as conclusões do 13º Congresso do PCdoB (novembro-2013) de que tais feitos e realizações ocorreram “no âmbito de uma transição, ainda em curso, marcada pela luta entre o neoliberalismo que persiste e o novo desenvolvimento nacional que emerge”. Ressalta-se, entretanto, um balizador importante: o PCdoB valoriza o rico legado, mas em nenhum momento considerou que o neoliberalismo fora superado.
Os erros e as lições do ciclo
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Com base nas reflexões acumuladas, o PCdoB apresenta uma sistematização das insuficiências, lacunas e dos erros de condução política e econômica. Procura extrair lições que ajudem as forças progressistas a elaborarem um novo programa e a abrirem um caminho que as conduza a retomar a hegemonia política e o consequente apoio das amplas massas.
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Foi um erro grave ter mantido intacta a estrutura conservadora do Estado que decorreu, entre outros fatores, da não realização de uma Reforma Política democrática. Na verdade, a democratização, a modernização do Estado e o combate ao poder exorbitante das corporações de agentes públicos foram um tema que passou ao largo e, no geral, foi tratado quase sempre com o falso republicanismo que reforçou instituições que passaram a agir de forma autônoma no âmbito do Estado, rompendo com o equilíbrio entre os Poderes, e mesmo se sobrepondo a eles. Prova disso é o protagonismo de setores do Judiciário, do Ministério Público, da Polícia Federal e de outros órgãos de Controle na trama e consecução do golpe de 2016.
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Igualmente grave foi ter sido tratado como intocável o monopólio dos meios de comunicação. Mais do que isto, os governos Lula e Dilma fortaleceram a grande mídia com vultosas verbas publicitárias. A regulamentação, em alguma medida, dos artigos da Constituição que vedam o monopólio no setor, deveria ter sido realizada. Programa de políticas públicas poderia ter criado um forte canal de TV estatal e uma abrangente rede de rádios e tvs comunitárias e públicas, bem como a existência de inúmeros blogs e perfis nas redes sociais que, em conjunto, poderiam ter reforçado a capacidade do governo e do campo democrático e popular na esfera da luta de ideias.
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Não obstante as quatro vitórias eleitorais consecutivas de um mesmo bloco de forças políticas, algo único na história da República, não se conseguiu sedimentar em camadas largas do povo as razões da dura luta política que se travava. Houve uma subestimação da luta de ideias, da necessidade de informar e politizar o povo através de meios e instrumentos diversos.
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A perda de hegemonia política da esquerda, cujo marco inicial foram as manifestações de junho de 2013, deu-se após prolongada ofensiva do consórcio golpista. Consumou-se a reviravolta pró forças neoliberais no decorrer de 2015 pela junção dos danos da recessão econômica com o uso pesado e manipulado de uma velha arma da direita: “o combate à corrupção”. Desde o chamado “mensalão”, em 2005, ficou clara a indispensabilidade de uma reforma política que fortalecesse o Estado, ampliasse a democracia, acabasse de pronto com o financiamento empresarial de campanha e que retirasse a atividade política da secular condição de refém do poder econômico e financeiro. Contudo, o governo não se empenhou devidamente pela Reforma Política democrática, pelo fim do financiamento empresarial de campanhas eleitorais. A direita sempre pautou a Reforma Política com o objetivo de mutilar a democracia e manter esse tipo de financiamento. Já a esquerda e os setores progressistas se dividiram, entre outros motivos, por visões conflitantes em relação à convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva, e assim não tiveram força para viabilizar a Reforma Política. Sem essa reforma, a bandeira do combate à corrupção foi assumida, oportunisticamente, pela direita. O governo adentrou em um verdadeiro campo minado que, estruturalmente, o expôs a escândalos de corrupção que, manipulados e potencializados pela grande mídia, provocaram uma fratura na confiança que o povo depositava no governo e na esquerda.
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Provou-se correta a concepção tática de que a esquerda nem vence e nem governa sem alianças, sem constituir maioria no Congresso Nacional e na sociedade. Não houve erro em pactuá-las. São indispensáveis coalizões amplas, firmadas em torno de programas, e que, para terem condução consequente, precisam ser lideradas pelas forças progressistas e de esquerda. As coalizões abarcaram um arco amplo de classes e estratos de classes, partidos de conteúdo político-ideológico discrepantes, refletindo o quadro político-partidário do país. Enquanto a esquerda teve capacidade e condições para polarizar as forças políticas de centro, o governo pôde promover um conjunto de conquistas. Quando o centro passou a ser liderado pela direita, em virtude da perda de hegemonia da esquerda, o governo se debilitou e a escalada do golpe se fortaleceu. O fato de o centro ter sido fator decisivo para assegurar a maioria do governo no Parlamento, por sua vez, impôs negociações e modulações quanto à profundidade das mudanças. Simultaneamente, o fato de a esquerda ter sido minoria no Congresso Nacional, associada ao peso grande do campo conservador durante todo o ciclo, foi um elemento objetivo de freio às reformas.
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Mesmo assim, foi um erro a não realização, ainda que de modo parcial, das reformas estruturais democráticas. No período 2007-2012, estabeleceu-se correlação de forças mais favorável, criando espaço de oportunidade para se tentar implementar as reformas, mas os governos Lula e Dilma não souberam aproveitá-lo. Faltou-lhes visão, convicção e decisão política.
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Ao PT, pelo seu papel e força, cabia exercer a hegemonia da coalizão, mas ao exercê-la ele incorreu em erros e distorções. Minimizou o papel da esquerda na condução do processo político. Teve deficiências para exercer a direção política da aliança. Por um lado, faltaram-lhe um horizonte estratégico e convicções em torno de um projeto de Nação para impulsionar a transição, adotando com frequência uma posição intermediária ou de cedência política. Por outro, agiu com exclusivismo, concentrou poderes, não soube partilhar e construir decisões com os aliados.
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O desenvolvimento contínuo do país a taxas robustas, indispensável para a existência de um ciclo longo no qual avance um Projeto Nacional, não teve a prioridade necessária. Prevaleceu uma política econômica híbrida, com direções opostas: uma dirigida ao desenvolvimentismo, enquanto a outra beneficiava o rentismo tanto pelas políticas monetária e cambial, quanto pelo superávit primário. Foi mantido – com mitigações no segundo governo Lula e no início do primeiro governo Dilma – o chamado tripé macroeconômico ortodoxo. E isso agravou a perda de competitividade da indústria, funcionou como uma trava ao desenvolvimento e canalizou grande parte do orçamento federal para os rentistas. Revelaram-se insuficientes e pouco ajustados à realidade os esforços para se investir na infraestrutura do país, com capital estatal e privado, nos serviços e na produção. Foram também insuficientes, embora tenham avançado, as políticas e os programas relacionados à produção científica e tecnológica articulada em torno de um sistema nacional de inovação. A experiência também evidenciou que os dilemas para se enfrentar as amarras do poderio empresarial e financeiro não se resolvem nem com cedência, nem com voluntarismo.
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Para governar e avançar nas mudanças é essencial a mobilização política do povo, força motriz das transformações sociais. Os movimentos sociais são essenciais para a realização de um projeto nacional de desenvolvimento. Avanços nesse sentido foram conquistados em decorrência da luta e da mobilização dos trabalhadores e do povo.
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Os fatos positivos, no entanto, não podem ocultar erros e insuficiências tanto do governo quanto dos movimentos. Em diversas oportunidades, o movimento sindical não alcançou a politização e a unidade política compatíveis com o grau de acirramento do confronto com a oposição. O governo, no curso da acirrada luta política, se relacionou insuficientemente com a sua base de movimentos sociais, salvo em momentos críticos. Subestimou também o papel das entidades organizadas na Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) e de importantes organizações da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Lideranças do governo alimentaram a concepção errônea – com respaldo de certas áreas dos movimentos – de que a mobilização popular poderia desestabilizá-lo. Essa concepção inculcou o imobilismo e reduziu o papel crítico e impulsionador dos trabalhadores. Partidos e outros segmentos políticos com presença nos movimentos sociais (conservadores ou esquerdistas) em muitas ocasiões se somaram à oposição ao governo, principalmente no segundo mandato da presidenta Dilma – inclusive em apoio ao golpe. Os ensinamentos desse período apontam no sentido de que as entidades e os movimentos dos trabalhadores e do povo devem alcançar outro patamar de politização, ter autonomia e protagonismo na luta pelo poder. Precisam combinar o apoio aos governos progressistas às jornadas por suas bandeiras, buscando impulsionar o governo pelas mudanças e, ao mesmo tempo, exercer o indispensável combate às forças conservadoras.
Desempenho do PCdoB nos governos Lula e Dilma
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Terreno novo e até então inexplorado no Brasil pelos comunistas, pela primeira vez na história da legenda, o PCdoB passou a fazer parte do governo da República. Cabe ressaltar que esta participação se dá nos marcos do capitalismo, num governo de coalizão no qual os comunistas eram força minoritária. Esta condição e o fato de não ter se constituído um núcleo de esquerda na coalizão governista, por incompreensões do PT, resultaram num fator acentuadamente limitante na capacidade de o PCdoB influir nas decisões e rumos do governo.
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O Partido, na sua 9ª Conferência Nacional realizada em junho de 2003, aprovou a tática de apoiar e participar do governo Lula com o objetivo de impulsioná-lo “na condução das mudanças que consistem no aprofundamento da democracia, e na adoção de um projeto nacional de desenvolvimento, voltado para a soberania e o progresso social”.
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Além do objetivo assinalado, são importantes também para o balanço os parâmetros indicados por aquela Conferência para reger esse papel político inédito do Partido. Os comunistas atuam numa frente ampla, interpartidária, política e social, orientados pela diretriz “unidade e luta”. Sobretudo por se tratar de uma frente com responsabilidade de governo, a relação predominante é de “unidade”, pois se a ênfase for “a luta” a aliança se desfaz. O referencial para se aferir o desempenho do governo é o programa da coalizão e não, de modo absoluto, o Programa do Partido, mais avançado. Ao apoiar, ao participar do governo, o PCdoB deve preservar sua independência política e refutar o seguidismo.
Revelou-se acertada a posição de apoio, participação e independência
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O significado e o legado do ciclo dos governos Lula e Dilma à Nação e aos trabalhadores, e as contribuições dos comunistas a esse legado, atestam a correção e a importância da primeira participação do PCdoB no governo da República.
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A dialética do apoio e da independência regeu as relações do Partido com o governo. Foi aplicada com êxito, e os erros cometidos, no fundamental, não a comprometeram. Esse juízo pode ser atestado pelas condutas e os posicionamentos da Direção Nacional e pela atuação da bancada comunista no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, bem como na sua linha de atuação nos movimentos sociais.
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Lideranças do PCdoB exerceram responsabilidades de governo em áreas importantes, resultando em realizações reconhecidas pelos setores diretamente vinculados ao tema e pela sociedade em geral. Marca da participação dos quadros comunistas foi uma atuação empreendedora que produziu realizações e políticas em prol dos interesses do Brasil e dos direitos do povo. Pautaram-se, de acordo com a prática recorrente dos comunistas, pelo rigor com a defesa do patrimônio público. O PCdoB alcançou, com a participação no governo federal e em demais esferas, uma nova dimensão em sua experiência de gestão pública, de elaboração e de prática política concreta, de aplicação de elementos de seu Programa, notadamente dos conteúdos e bandeiras do Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento. Alargou suas relações com amplos setores e auferiu mais visibilidade e aproximação com amplas camadas do povo.
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É preciso, entretanto, uma análise multilateral do fato de o PCdoB ter ocupado a pasta do Ministério do Esporte durante três dos quatro mandatos, enquanto, apenas por curto espaço de tempo, esteve à frente da Secretaria de Relações Institucionais, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e, em seguida, do Ministério da Defesa (MD).
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A presença prolongada no Ministério do Esporte – tendo à frente Orlando Silva, que substituiu Agnelo Queiróz, e posteriormente Aldo Rebelo – propiciou ao Partido uma participação em cascata nas secretarias estaduais e municipais de esporte. Isso permitiu-lhe ampliar o relacionamento com o segmento esportivo e com o povo, marcar sua capacidade de gestão (coordenação dos Jogos Pan-Americanos, da Copa do Mundo e toda a preparação dos Jogos Olímpicos). Todavia, este fato restringiu seu arco de atuação, deixando-o de fora de setores e áreas estratégicas na esfera direta de ação do governo. Debilidade minorada, é verdade, pelo importante trabalho realizado por Haroldo Lima na Agência Nacional de Petróleo Gás e Biocombustíveis (ANP) e por Manoel Rangel na Agência Nacional do Cinema (Ancine), bem como por Aldo Rebelo no MCTI e MD. Além da presidência da Embratur por Flávio Dino e da Finep por Luis Fernandes.
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A bancada comunista e as lideranças na Câmara dos Deputados e no Senado Federal tiveram uma atuação de apurada qualidade durante os dois governos (Lula e Dilma) e no período de enfrentamento ao golpe. Da atuação da bancada resultou um elenco de conquistas vinculadas aos trabalhadores e aos interesses da Nação.
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Ante o acirrado confronto político entre o governo e a oposição neoliberal, o PCdoB se postou sempre na linha de frente em defesa do governo. Esta conduta se deu tanto na tentativa de golpe para depor o ex-presidente Lula, na crise do chamado “mensalão” de 2005, quanto na ofensiva reacionária desencadeada no início de 2015 pelo consórcio oposicionista que derrubou o governo da presidenta Dilma.
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O Partido manteve sua voz própria. Publicamente, alertou, criticou, divergiu do governo sempre que julgou que políticas governamentais haviam entrado em conflito com o programa da coalizão, com os compromissos assumidos pelo governo com a Nação e os trabalhadores. A persistente oposição à manutenção do chamado tripé macroeconômico ortodoxo, em particular a política de juros altos e de câmbio flutuante valorizado, é um dos muitos exemplos que demonstram a face crítica do apoio que foi prestado ao governo.
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Desde 2007, embora não tenha obtido êxito, o Partido persistiu, junto ao governo e à sua base, pela premência de se realizarem as reformas estruturais democráticas, principalmente a Política e a dos meios de comunicação. Em torno dessas duas bandeiras, envidou esforços para aglutinar forças sociais e políticas e destacou quadros e frentes de trabalho para elaborar e construir linhas de ação.
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A conduta de independência do Partido também se evidenciou quando, ainda em 2007, ao avaliar o papel estratégico do movimento dos trabalhadores, os comunistas apoiaram e incentivaram a criação de uma nova central sindical: A Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), central plural e classista, que de lá para cá vicejou e se expandiu. Houve com a CTB um salto importante no trabalho sindical do PCdoB.
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Há convicção de que o Partido estimulou nos movimentos sociais em que atua a concepção da autonomia e contribuiu para um melhor entendimento do papel político que eles precisam desempenhar. Houve avanços significativos quando reivindicações dos movimentos foram encampadas pelo governo e impulsionadas por mobilizações sociais, como a conquista da política de valorização do salário-mínimo, a garantia e regulamentação de direitos para as trabalhadoras domésticas, a expansão das universidades e dos institutos federais, a reserva de vagas, o ProUni, os 10% do PIB para a educação, entre outros. No geral, o PCdoB cresceu e aumentou sua influência nos movimentos sociais, bem como contribuiu, por intermédio de sua militância, para o fortalecimento de entidades e movimentos comprometidos com as causas populares. Persistem e ampliam-se os desafios de relacionar bandeiras e causas candentes dos movimentos sociais com a centralidade da luta por um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento, bem como contribuir para elevar a capacidade de mobilização política do povo.
Foi aplicada a tática de impulsionar o governo a lançar um novo projeto nacional
Nas quatro campanhas presidenciais, o PCdoB, ao pactuar o ingresso nas coligações que sustentaram as candidaturas de Lula e Dilma, apresentou plataformas focadas no objetivo de o governo promover um novo ciclo de desenvolvimento robusto, duradouro, assentado na crescente soberania nacional, dinamização da integração latino-americana e ascendente ampliação da democracia.
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O Partido procurou, ao longo do ciclo, empreender uma leitura multilateral do resultado geral do governo, lidando, objetivamente, com seu conteúdo e compromissos contraditórios. No choque entre os polos, os comunistas, por exemplo, asseveraram que, no primeiro governo Lula, a vertente neoliberal, que se confrontava com a desenvolvimentista, havia transformado o Ministério da Fazenda e o Banco Central em verdadeiros “enclaves rentistas” no seio do governo.
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A resolução política do 12º Congresso, novembro de 2009, enaltece os êxitos do segundo governo Lula, sublinha avanços na transição, mas alerta que, “de certo modo”, ainda se mantinha o pacto dual da Carta ao Povo Brasileiro. Já o 13º Congresso, novembro de 2013, caracteriza como rico e promissor o legado de uma década decorrida do ciclo, mas alerta que as significativas conquistas “não foram suficientes para democratizar o Estado e remover outros obstáculos estruturais políticos, sociais e econômicos herdados em séculos de história (…). Assim, impõe-se destravar e acelerar as mudanças.”.
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Desse modo, o Partido que, em 2007, lançara o Manifesto Audácia – propondo ao governo uma conduta política mais assertiva, mais corajosa, tendo em vista a realização das mudanças e das reformas democráticas – reafirma sua convicção de que sem realizá-las seria impossível avançar na direção de mais desenvolvimento, mais democracia e soberania nacional.
Defesa de um núcleo de esquerda no âmbito da aliança
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O Partido sempre lutou pela constituição de um núcleo de esquerda, no âmbito da ampla coalizão de governo. Após a reeleição, em 2006, o PT e o ex-presidente Lula apoiaram-se com mais ênfase no PMDB, menosprezando os partidos de esquerda. Em consequência, o PCdoB, sem negar a importância da coalizão, formou, conjuntamente com o PSB, PDT e outras legendas, o Bloco de Esquerda. Esse Bloco, como avaliou o 12º Congresso, “definiu uma plataforma avançada, na defesa de um projeto que impulsionasse o governo na superação das amarras neoliberais, instasse o PT a não se desgarrar do campo de esquerda.”. O Bloco enfrentou acentuada resistência do governo que agiu no sentido de dissolvê-lo.
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No primeiro governo da presidenta Dilma, a coalizão se manteve ampla, mas houve regressão na indispensável liderança do titular da presidência da República sobre a base governista. A presidenta e seu staff de articulação política evidenciaram graves debilidades nesta exigência crucial. Não houve também, no governo Dilma, um núcleo de esquerda. Na verdade, foram se criando diferenciações, distanciamentos, e mesmo divergências públicas entre a presidenta Dilma e seu próprio partido, o PT. Esse fenômeno reverberou como fator dispersante no conjunto da esquerda e no seio da aliança como um todo.
Erros e insuficiências do PCdoB e o acúmulo de forças conquistado
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No 11º Congresso, realizado em 2005, o PCdoB já explicitava que, ante o ineditismo de sua participação no governo da República, seria impossível não cometer erros, e, além disso, aflorariam as insuficiências do Partido.
Foi débil a defesa da democratização do Estado brasileiro
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No que concerne ao grave equívoco de se ter mantido intacta a estrutura conservadora do Estado – em que pese o Programa Socialista e outros documentos partidários destacarem a necessidade da democratização e modernização do Estado, da reforma do Poder Judiciário –, foram limitadas e de pequeno alcance as iniciativas do Partido para persuadir e pressionar o governo quanto à indispensabilidade de uma reforma do Estado, para promover na sociedade a disputa política e ideológica no alcance que a correlação de forças permitia.
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O PCdoB tinha evidentes divergências, mas não demarcou, nem se confrontou de público com o falso republicanismo que grassou nos governos Lula e Dilma. Neste tema, incluem-se a abdicação de prerrogativas e poderes da Presidência da República, de ministérios estratégicos, em benefício das corporações do Estado; uma leitura acrítica do conteúdo da legislação de combate à corrupção que deu instrumentos para as corporações afrontarem o Estado de Direito; as indicações e as prerrogativas dos órgãos de controle, a composição dos tribunais superiores, o papel do Ministério da Justiça, a autonomia da Polícia Federal; entre outras iniciativas que acabaram se voltando contra o próprio governo, contra a democracia e a soberania do voto popular.
O acúmulo de forças do Partido e a afirmação de sua visibilidade e identidade
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Definida a orientação política, a 9ª Conferência (2003) também indicou as novas linhas de acumulação de forças do PCdoB, renovando as diretrizes de sua estruturação. Objetivo central fixado foi o fortalecimento do Partido, em suas distintas dimensões.
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Uma avaliação, em particular, chamava a atenção. Estava claro que a aliança, no plano nacional, com o PT desde 1989, a par do acerto político e dos resultados satisfatórios, trouxera também consequências negativas a serem corrigidas. Conforme diagnóstico da 9ª Conferência, “aos olhos de grande parte da população”, a imagem do PCdoB ficara restrita a uma legenda “coparticipante do consórcio eleitoral petista”. A identidade, a visibilidade e a independência do Partido ficaram diluídas.
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Para corrigir tais fenômenos negativos, e para direcionar o Partido a uma nova etapa de ganho de força, vieram políticas e diretrizes como: uma nova tática eleitoral com lançamento de candidaturas majoritárias e chapas próprias ao legislativo municipal e estadual; a combinação disso com a luta social e de ideias, a conduta política de audácia a reger todas ações e frentes de trabalho (2007) da qual estrategicamente nasceu a CTB; o Programa Socialista, aprovado em 2009; o novo Estatuto (2005); e a Política de Quadros (2009).
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O número de filiados evoluiu de 151 mil, em 2002, para 356 mil, em 2015. A relação entre o número de filiados e de participantes em Congressos tem a seguinte referência: em 2001, 151 mil filiados e 34 mil participantes do Congresso partidário; em 2013, 353 mil filiados e 109 mil participantes do Congresso partidário; em junho de 2017, o PCdoB atingiu o total de 393.312 filiados.
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Nas disputas majoritárias, em 2000, foi conquistada somente uma prefeitura (Olinda), pois o Partido se atrasou em relação à alteração na tática eleitoral para as disputas majoritárias. Fruto da correção que empreendeu a partir de 2004, em 2016 o Partido elegeu 82 prefeitos, entre eles Edvaldo Nogueira, eleito pela segunda vez prefeito de Aracaju. Edvaldo retoma e dá continuidade a uma gestão vitoriosa do seu primeiro mandato, que fez a cidade ser reconhecida como a “capital brasileira da qualidade de vida”. No Senado Federal, entre 2010 e 2014, o Partido ocupou duas cadeiras, pela primeira vez, sendo que em 2010 o PCdoB foi a quarta legenda mais votada para o Senado, mas em 2014 não elegeu senador e recuou a uma cadeira.
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Em 2014, o PCdoB elegeu Flávio Dino governador do Maranhão, um feito inédito. Mesmo no curso de uma recessão que afeta os estados e municípios, o governo de Flávio Dino vem conseguindo êxitos para desenvolver e democratizar o Maranhão e promover crescente melhoria na vida do povo. Ele também se destacou na luta contra o golpe e hoje se empenha pela restauração da democracia. É uma destacada liderança nacional das forças progressistas e democráticas.
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Comparativamente ao período anterior a 2003, pode-se afirmar, mesmo com os reveses sofridos, que nos 13 anos dos governos Lula e Dilma o PCdoB colheu frutos na esfera da expansão (filiados, militantes, base territorial), na sua força eleitoral, na participação em governos, na inserção no movimento sindical e nos movimentos sociais, e na batalha de ideias, e além disso elevou sua autoridade política. Saiu também desse ciclo com um conjunto de deficiências que estão elencadas em outra parte deste documento.
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Uma acumulação de forças sem saltos, modesta, consoante à época histórica de defensiva estratégica das forças revolucionárias, mas contínua e gradativa em razão das condições políticas favoráveis advindas da histórica vitória de 2002, razoavelmente aproveitadas pelas renovadas linhas de ação política e estruturação do Partido. Além de suas próprias insuficiências, concorreu, também, para conter um maior crescimento do Partido o fato de o campo político e social da esquerda ter sido, neste período, ocupado e hegemonizado pelo PT.
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No âmbito eleitoral, conforme as estatísticas acima evidenciam, houve esforço em participar de forma mais planejada e mais ousada das disputas, inclusive majoritárias. Com isso, o Partido obteve votações mais amplas, projetou a legenda e várias lideranças no parlamento e nos governos. Mas o resultado concreto foi modesto, como demonstram o número e o tamanho das prefeituras conquistadas, no tamanho da bancada na Câmara dos Deputados – que em nenhum momento ultrapassou 15 cadeiras –, e também no Senado Federal. Nas eleições de 2014 o Partido reduziu a sua votação para a Câmara dos Deputados e, em 2016, obteve um resultado satisfatório nas eleições municipais, embora tenha perdido importantes prefeituras e cadeiras em Câmaras Municipais das capitais, sobretudo das regiões Sudeste e Sul.
Questões importantes a serem superadas
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O Programa Socialista do PCdoB – destacadamente, a luta pelo fortalecimento da Nação, o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento (NPND) como caminho brasileiro para o socialismo – foi o norte orientador da direção nacional do PCdoB nos governos Lula e Dilma. Conteúdos, bandeiras, reformas do NPND foram elaborados, desenvolvidos, dando clareza à centralidade da questão nacional como exigência da luta de classes na contemporaneidade, dialeticamente relacionada à luta pelo socialismo. Todavia, apesar dos esforços, o Programa não foi disseminado suficientemente na sociedade, nem dele se extraíram todas as consequências para a orientação política do Partido. Igualmente, ele ainda não foi assimilado pela maioria do conjunto das direções estaduais e municipais, tampouco pelas bases do Partido. Ainda se está longe da meta de que o Programa, efetivamente, seja a bússola orientadora, no cotidiano, do coletivo militante.
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Isso afeta diretamente a questão da identidade do PCdoB. Qual marca, qual identidade o Partido vinca, se não efetivamente o seu Programa? Ainda, não assimilado, não assumido na dimensão devida como guia de ação. Obviamente, a marca “Nação forte. Rumo socialista” – que sintetiza o Programa – não é suficientemente projetada e, além disso, suas frentes de trabalho, seu coletivo militante, passam a ser permeados de conteúdos e plataformas conflitantes com a elaboração estratégica do Partido, fazendo prevalecer, por vezes, pautas segmentares e corporativas dissociadas de um projeto de nação.
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A questão da identidade requer que o Partido cresça nas três frentes de acumulação – a luta de massas, a presença e o trabalho nos parlamentos e governos, e a luta de ideias; que tenha fortes vínculos junto aos setores estratégicos da Nação, e também que se torne uma influente corrente de massas e eleitoral. Necessita expandir o coletivo militante, fortalecer sua estruturação desde os municípios e dotar-se de envergadura, instrumentos e capacidade econômico-financeira que lhe possibilitem disseminar seu Programa, conquistar visibilidade, ser visto e reconhecido com a sua singularidade pela Nação e pelos trabalhadores.
III – GOVERNO ILEGÍTIMO CONTRA O BRASIL E O POVO
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O impeachment da presidenta Dilma Rousseff em 31 de agosto de 2016 foi um golpe de novo tipo contra a democracia, perpetrado pelo Parlamento, endossado pelo Judiciário e capitaneado por um poderoso conjunto de forças políticas, judiciais, midiáticas e empresariais, com ativa participação de setores da Polícia Federal. A mídia monopolizada teve papel de destaque na mobilização de uma base social reacionária e intolerante.
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A trama golpista foi longamente preparada e teve apoio externo, como parte de disputas geopolíticas que visam a conter o papel de países em desenvolvimento e polos emergentes de poder, como o papel progressista do Brasil na América do Sul. Esteve relacionada à descoberta do pré-sal, com interceptação de comunicações da Petrobras e da presidenta Dilma pelos serviços de inteligência estadunidense. Cooperações descentralizadas no âmbito de acordos bilaterais de estruturas do Estado brasileiro, como o Ministério Público, com órgãos de outros países foram lesivas aos interesses nacionais.
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A trama representou um atalho das forças conservadoras para o poder, sem votos. Elas se uniram em consórcio para a destituição do governo Dilma e pela implementação de uma “nova” agenda para o Brasil – na verdade, o programa neoliberal do PSDB, assumido também pelo PMDB. Programa este derrotado quatro vezes consecutivas em eleições presidenciais. Promovem célere desfiguração da Carta de 1988 e a implementação de nova ordem ultraliberal, conservadora e autoritária, com forte componente neocolonial. Entretanto, agravou-se o impasse político nacional, que põe em questão o ciclo da Nova República aberto com a Carta de 1988. O governo Temer vive em grande instabilidade, com inédita impopularidade, e o país vive a maior crise econômica de sua história, com forte deterioração da situação social.
Um ano do impeachment: a “agenda maldita”
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A “agenda maldita” entreguista e neoliberal, expressão dos interesses das grandes potências e do capital financeiro, fragiliza as bases da soberania nacional com o desmonte do Estado e dos mecanismos indutores do desenvolvimento. Estão no alvo a Petrobras e a cadeia de petróleo e gás; o BNDES e os mecanismos de financiamento de longo prazo; a política externa como instrumento do desenvolvimento. Desmontam-se empresas privadas estratégicas para a economia brasileira, entre elas as da indústria da defesa. Vendem-se vastas extensões de terra e aliena-se concessões na província petrolífera do pré-sal a grupos estrangeiros, tramando também o fim do regime de partilha. Debilita-se o Estado nacional deixando-o sem condições de fomentar a indústria e reverter a desindustrialização. A ociosidade na indústria brasileira bate recordes. Em 2016, a utilização da capacidade instalada foi de 63%. Isso significa que 37% das máquinas, equipamentos e instalações da indústria ficaram parados. A participação dessa atividade no PIB caiu 3,8% em 2016 em relação ao ano anterior. Em 2016, o Brasil teve a pior taxa de investimentos dos últimos 20 anos, de 16,4% do PIB, e o investimento oriundo das estatais caiu em 50% entre 2013 e 2016. A recessão, em 2015 e 2016, acumulou queda de 7,2% do PIB, trajetória que se mantém em 2017. Enquanto isso, os juros sobre a dívida pública drenam para o rentismo, anualmente, 45% do orçamento federal.
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Ao mesmo tempo, o governo ilegítimo promove o receituário mundial do neoliberalismo de austeridade, que se traduz no corte de direitos trabalhistas e dos gastos sociais, elevando a exploração do trabalho. A terceirização generalizada já foi aprovada e se prepara também o ataque à estrutura sindical, mediante o fim da Contribuição Sindical dos trabalhadores. Destroça-se a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em vigor há 70 anos, dela retirando direitos e garantias, e institui-se o predomínio do negociado sobre o legislado, que só favorece o capital. Na aposentadoria, pretende-se liquidar a Previdência Social como parte da Seguridade Social, e ardilosamente privatizá-la, destruindo o maior instrumento de distribuição de renda do país, em prejuízo especial das mulheres e da população mais pobre.
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Houve piora sensível do empobrecimento do povo. O Brasil atingiu o recorde de 14 milhões de desempregados, 25% dos quais jovens de 18 a 24 anos. Em 2016, a média dos reajustes salariais do país se reduziu a 0,52% e só 19% dos dissídios coletivos alcançaram aumento real de salários. Endividadas, as famílias e empresas congelam a economia. O ajuste recessivo produz queda na arrecadação, nos orçamentos dos estados e municípios e, a cada dia, aumenta a deterioração dos serviços públicos. A Constituição foi alterada para institucionalizar o engessamento dos gastos públicos em saúde e educação por 20 anos. A tensão social é latente, como na segurança pública – rebeliões em presídios, greves de policiais militares e aumento das chacinas. O número de famílias vivendo nas ruas ampliou-se exponencialmente.
Radicalizada luta de classes política e ideológica
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O Brasil vive, desde as manifestações de junho de 2013, prolongada fase de mobilizações de massas, muitas vezes com conteúdos conflitantes, ebulição radicalizada da luta de classes política e ideológica. O setor hegemônico das classes dominantes prega diuturnamente contra a capacidade de realização do povo e da Nação, promove descrença, desesperança, baixo sentimento de autoestima e de orgulho com o país. Dissemina que é inexequível um caminho de autodeterminação no mundo da globalização neoliberal; ao contrário, exige adotar amargas antirreformas neoliberais, para reduzir o Estado e os direitos que “não caberiam” no PIB e alinhar o Brasil de modo subordinado às grandes potências. Do mesmo modo, usa como arma política a denúncia de corrupção, afirmando ser ela a maior chaga do país e justificando até medidas de exceção em seu combate. Estimula a intolerância e saídas individualistas e meritocráticas em detrimento da solidariedade social. Promove a desmoralização da atividade política, no contexto do esvaziamento da democracia produzida pelo neoliberalismo – expressa na crise de representação dos partidos – e busca promover o surgimento de nomes pretensamente “limpos” e “salvadores da pátria” para disputar eleições.
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Em oposição a isso, estão vivas na memória popular as conquistas alcançadas no último ciclo e é crescente a consciência de que o impeachment foi um engodo contra os interesses do povo. As forças progressistas disputam as ideias de que o Estado, sob sua direção, é indispensável na defesa do desenvolvimento; que a agenda neoliberal só favorece o rentismo por intermédio dos altos juros sobre a dívida pública e sequestra o papel do Estado em benefício de seus interesses; que os direitos sociais não são ônus, mas essenciais para se retomar o crescimento econômico, ao elevar a renda do trabalho, o consumo e a arrecadação, equilibrando o déficit fiscal. Enfim, que a corrupção só pode ser combatida respeitando-se as garantias constitucionais e indo-se à raiz dos problemas – a relação entre Estado conservador e poderes econômicos, inerente ao sistema das classes dominantes capitalistas e o sistema político onde impera o poder do dinheiro.
A Lava Jato e o Estado Democrático de Direito
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O PCdoB se pauta pelo zelo e defesa do patrimônio público e defende eficaz combate à corrupção. Entretanto, tem leitura crítica da Operação Lava Jato. Constituída em 2014 por setores do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal, ela promove, com apoio da grande mídia, e alcançando apoio popular, uma cruzada contra esquema de corrupção montado na Petrobras. Desde então, tem pesado decisivamente na vida política e institucional. Entretanto, optou por caminhos que não são eficazes no combate à corrupção e que a desvirtuaram. Com o apoio do PSDB para promover o impeachment, pôde sistematicamente agir com nítido viés político partidarizado, criminalizando o PT e a esquerda como um todo. Consumado o impeachment, sem retirar a esquerda do alvo preferencial, marcha também contra os próprios chefetes do golpe: Michel Temer, Eduardo Cunha e Aécio Neves.
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A dita Operação transplanta, de modo acrítico, modelos e conceitos jurídicos de outros países, provenientes do combate ao crime organizado. Em operações descentralizadas de cooperações com os Estados Unidos e outros países, recebe treinamento e partilha informações, favorecendo que instituições estrangeiras promovam ações contra os interesses nacionais. Aniquila empresas, extermina postos de trabalho, dificulta a realização de acordos de leniência. Os resultados são quedas expressivas no PIB, desnacionalização da economia brasileira e aumento de taxas de desemprego.
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Ao lado de largas parcelas de estudiosos do direito, o PCdoB considera que a Operação Lava Jato se constituiu em embrião de poder paralelo, instituindo o Estado de exceção em lugar do Estado Democrático de Direito. O protagonismo político autônomo da Lava Jato é indevido, fere o sistema de pesos e contrapesos entre os poderes da República e macula a legitimidade dos representantes eleitos pelo voto popular – entre os quais não estão integrantes do Judiciário ou da alta burocracia de Estado. O modelo de combate à corrupção que a Lava Jato quer impor agride a norma democrática ao condenar com base em delações premiadas sem necessidade de provas, abusar de conduções coercitivas e manter prisões preventivas por tempo indevido, violar garantias constitucionais como o direito ao devido processo penal e a presunção de inocência, além de promover recorrentes vazamentos seletivos. Outros setores do Judiciário em boa medida deixaram-se encurralar pela agenda política da Lava Jato, omitem-se em face de suas transgressões, o que compromete a isenção sem a qual não se faz justiça.
Campos políticos e sociais em confronto
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Crescem e alargam-se as mobilizações políticas do campo popular. Desde o impeachment, a luta contra as antirreformas da Previdência e trabalhista tem sido fator de unidade e avanço da oposição ao governo, nas ruas e no Parlamento. Cresce o protagonismo dos trabalhadores em jornadas de paralisações nacionais com claro conteúdo político. Papéis destacados tiveram o Fórum das Centrais Sindicais, as frentes Brasil Popular e Povo sem Medo e partidos como PT, PCdoB e PDT. A resistência alcançou apoios de repercussão internacional com a adesão de forte campo de juristas constitucionalistas e trabalhistas, das igrejas, do mundo da cultura, das artes e comunicação, e personalidades marcantes do país. Além das lutas sociais, formaram-se a Frente Parlamentar em Defesa das Diretas Já e a Frente Ampla Nacional por Diretas Já e Contra as Reformas, reunindo expressivas organizações da sociedade civil. O PCdoB dá destacada energia a isso e saúda o papel combativo da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), da União Nacional dos Estudantes (UNE) e da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), da União Brasileira de Mulheres (UBM), da União de Negros pela igualdade (Unegro), da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam) e de tantas outras entidades onde atuam os comunistas.
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No entanto, segue o desafio de ir além dos setores tradicionalmente organizados. A maioria silenciosa do povo tem patente insatisfação e ainda não se expressou nas ruas. Sofre os efeitos, por um lado, da campanha de desmoralização da política e dos partidos e, por outro, da fragmentação social que afeta a subjetividade do povo e faz arrefecer laços de solidariedade social. Entrementes, as bandeiras por Diretas Já e contra as antirreformas neoliberais têm potencialidade de se alastrar, inclusive junto a setores médios que, mesmo tendo rejeições ou diferenças com os governos Lula e Dilma, também sofrem as consequências da crise.
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A unidade do campo popular, progressista e democrático é indispensável e carece do debate crítico de desafiadoras questões, com métodos justos em busca de convergência. Destacam-se, entre outros, os temas da relação entre projeto nacional de desenvolvimento, o papel do Estado e o da sociedade civil; a justa e necessária integração das candentes causas dos direitos civis, identitários e difusos – próprias das contradições da formação nacional no seio do povo –, sob o primado de um projeto de desenvolvimento nacional e da unicidade do povo brasileiro. E, também, a suplantação de pautas e interesses corporativistas que confrontam os interesses de toda a sociedade; a justa compreensão da luta pela hegemonia no processo político, sem hegemonismos exclusivistas. Finalmente, a própria noção da indispensabilidade da unidade de forças em frente ampla – respeitados os legítimos interesses de partidos e movimentos integrantes.
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Os comunistas atuam em todas as causas que envolvem anseios populares, nos termos da realidade contemporânea na ampla variedade de vivências sociais, reivindicações, formas de organização e de ativismo digital. Buscam dar-lhes consequência sob a perspectiva de seu Programa Socialista para o Brasil. No entanto, estabelece-se no campo da luta social uma nova estratégia política movimentista com base no multiculturalismo que se quer “progressista”, mas que resulta na fragmentação do povo. São forças que exploram a crise de representação política da sociedade – o que é mais propriamente uma crise da democracia, esvaziada sob a agenda neoliberal – em contraponto à esquerda partidária e às grandes organizações do movimento social brasileiro, consideradas “tradicionais” por afirmarem o papel central dos trabalhadores como sujeito central na luta pelo socialismo e adotarem o caminho da “disputa do Estado”. Embora críticas ao status quo, reforçam pregações conservadoras já hegemônicas da negação da política. Não apresentam alternativa sistêmica de sociedade, nem concebem a necessidade de um projeto nacional de desenvolvimento – sem o qual não se promove a cidadania, o progresso e a inclusão social –, com o poder de Estado induzindo um rumo democrático e progressista para abrir caminho às transformações sociais.
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O campo conservador, que liderou o golpe, de outra parte, mantém-se em ofensiva, mas tem contradições no seu âmbito, com choques entre seus integrantes. O “partido” da Lava Jato é o mais agressivo do consórcio golpista, que em conluio com a mídia atua para derrogar o sistema político, atentando contra o Estado Democrático de Direito. O governo capitaneado pelo PMDB e PSDB tem farta maioria política parlamentar, composta, desde a consumação do impeachment, por legendas da direita e centro-direita, agrupadas no autodenominado “centrão” constituído por Eduardo Cunha. Tal maioria, acossada pela Lava Jato e o rechaço popular à agenda do governo, é instável e suscetível a reposicionamentos. As forças dominantes tentam blindar a condução da política econômica do quadro de instabilidade permanente. As crises política e institucional contribuem para manter o ciclo recessivo, resultando num cenário desalentador para os investimentos do empresariado.
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O consórcio golpista financiou a arregimentação de uma base social disposta a ir às ruas. Estrato decisivo para isso, em ligação com a mídia monopolizada, tem sido a alta classe média, derivando posições também para outros setores médios tradicionais que, ressentidos, comportam-se como o “partido político da elite”. Suas demandas, alimentadas pelo antipetismo e pelo discurso moralista da Lava Jato, mantêm-se ativas, mas as mobilizações entraram em refluxo, dada a desfaçatez de defender “reformas” intragáveis para a população e a corrupção escancarada no governo Temer. Aos poucos vai se indispondo com o governo golpista e o próprio PSDB. Entretanto, essas forças dão base a candidaturas de negação da política ou de correntes de opinião de extrema-direita, em reforço da ordem ultraliberal autoritária.
A instabilidade é a marca da crise política e institucional
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O impeachment agravou o estado de instabilidade estrutural crônico e o quadro de incertezas em que vive o país, que põem em questão o ciclo da Nova República, aberto com a Constituição de 1988. O curso político evolui em paroxismos e torna imprevisíveis os desfechos possíveis. Há uma crise recorrente de governo, face à qual Temer busca demonstrar que o custo de sua saída seria maior do que mantê-lo no governo, para aprovar as antirreformas, e sinalizar à base política de apoio o enfrentamento aberto à Lava Jato. Há feridas abertas nas instituições, produzindo conflitos e desequilíbrios entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com graves consequências.
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De conjunto, essa evolução expressa agudo e grande impasse político. O campo conservador reacionário tem dificuldades manifestas em dar saídas à crise. As disputas afloram abertamente, com dificuldades de pactuar rumos para a hipótese de eleições indiretas pelo Congresso ou mesmo eleições presidenciais antecipadas. Entretanto, apesar de dissensos, as forças que promoveram o golpe se mantêm unidas no essencial: assegurar a agenda das antirreformas trabalhistas e previdenciária, evitar eleições diretas antecipadas e impedir Lula de se candidatar. Por outro lado, o ascenso das mobilizações populares e as divisões no bloco governista abrem novas possibilidades para a luta política por saída legitimamente democrática para a crise de governo e o retorno da normalidade política e institucional mediante a soberania do voto popular em eleições presidenciais.
Frente Ampla para Novos Rumos ao Brasil
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Nesse quadro de turbulência política, alcança novo marco a encruzilhada histórica do país entre dois projetos antípodas para o Brasil. O PCdoB entende que a pretendida transição à nova ordem liberal, autoritária e neocolonialista é tumultuada e instável, e que a luta contra a coalizão que a sustenta será dura, intensa e de longo fôlego. É nesse contexto que firma a orientação política para apresentar perspectivas para o Brasil e novas esperanças ao povo.
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O centro da orientação política do PCdoB é a oposição firme ao governo golpista e à agenda neocolonial, antipopular e antidemocrática imposta ao país. Visa a acumular forças para derrotar o curso antinacional e antipopular e criar condições para as forças patrióticas e populares reconquistarem o governo da República e, assim, retomar em novas condições o desenvolvimento soberano, democrático e de inclusão social, com a ampliação dos direitos do povo, a valorização do trabalho e da produção.
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A realização desses objetivos só é possível com a união de forças em frente ampla, para além da esquerda política e social. O PCdoB tem empenhado todos os esforços para isso, bem como para construir a unidade da esquerda brasileira para que ela possa constituir-se no núcleo condutor da Frente Ampla. Na história brasileira, quando se uniram vastas forças com clareza de objetivos e unidade de ação no rumo do interesse maior do Brasil e do povo, elas venceram.
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A Frente Ampla reunirá os trabalhadores, a juventude e as mulheres, com toda a diversidade das organizações de luta para aglutinar extensas camadas populares; os setores progressistas e patrióticos, do universo jurídico constitucionalista, do mundo cultural e da intelectualidade progressista; segmentos médios profissionais, entidades e movimentos do empresariado interessado no progresso do país. Para aglutiná-la, a pauta imediata é restaurar a democracia, o Estado Democrático de Direito, as garantias constitucionais fundamentais no combate à corrupção; assegurar a soberania nacional e retomar o crescimento econômico, com o estímulo à produção nacional; a defesa da Petrobras e do regime de partilha no pré-sal, contra as desnacionalizações, privatizações e demolição das empresas brasileiras de engenharia de grandes obras; a manutenção e ampliação dos direitos do povo, com a valorização do trabalho, empregos, distribuição de renda e inclusão social.
Barrar as antirreformas neoliberais, Fora, Temer! e Diretas Já!
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Na instável conjuntura presente, em meio às disputas de saídas para a crise, o PCdoB toma como referência a conjugação de três pontos essenciais: paralisar e derrotar as antirreformas, garantir a realização de eleições e restabelecer a normalidade das relações institucionais e políticas para a disputa democrática de rumos para o país. As consignas barrar as reformas neoliberais, Fora, Temer! e Diretas Já! reúnem forças como bandeiras amplas e radicais a um só tempo, que dão protagonismo à luta do povo brasileiro.
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A mobilização política do povo é o fator mais decisivo para se reverter a correlação de forças hoje ainda desfavorável ante a ofensiva conservadora. A partir dos avanços obtidos com o ascenso da resistência ao golpe e às antirreformas, é preciso pôr em ação largo repertório de formas de luta, para alcançar a maioria do povo e recuperar a confiança de vastas parcelas da sociedade que não se opuseram ou ficaram indiferentes ao impeachment e deixaram de votar nas forças da esquerda em 2014 e 2016.
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A isso se conjuga a luta política na esfera institucional, em especial no Congresso Nacional, que requer firmeza de pertencimento de campo político e sagacidade para não isolar, mas sim ampliar a resistência. É indispensável explorar contradições e disputas do consórcio político dominante, isolar os alvos principais a cada situação, dividir e neutralizar o que for possível da ofensiva da ampla frente conservadora. Parte desses segmentos, tendo apoiado o impeachment, busca se reposicionar, como é o caso do PSB e de parlamentares de vários partidos, inclusive no PMDB. Deve-se disputar ativamente essas forças, presentes em instituições políticas e da sociedade civil e em setores econômicos. Esse campo sempre foi fator destacado em todas as composições políticas no Brasil e carece de um núcleo de forças consequentes para galvanizá-lo como alternativa factível de outro rumo democrático e progressista para o país.
Em defesa da democracia
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A defesa do Estado Democrático de Direito inscrito na Constituição Federal de 1988 é o ponto de partida da Frente Ampla. É despropósito reacionário tentar fazer terra arrasada da atividade política. É mediante a política que se pratica a democracia, sendo os partidos os pilares e legítimos instrumentos para seu exercício, para o que a Constituição assegura a liberdade de organização partidária. Os reordenamentos do sistema político, partidário e eleitoral competem ao Legislativo, que a Justiça Eleitoral deve respeitar.
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O Brasil precisa de reforma política para aprimorar o voto proporcional com o voto em lista fechada, que assegura o pluralismo na representação dos brasileiros e amplia a participação dos trabalhadores e das mulheres nos destinos do país. É preciso impedir quaisquer modalidades de voto majoritário distrital que produziriam ainda maior elitização do sistema partidário; instituir o financiamento público de campanhas, mantendo a proibição de doações empresariais; assegurar a liberdade partidária para se estabelecer alianças e coligações; impedir cláusulas que instituem outras barreiras às já existentes e que suprimem ponderáveis parcelas do voto popular. Os comunistas defendem a reserva de no mínimo 30% das cadeiras do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e demais casas legislativas para as mulheres.
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A Constituição de 1988 – não obstante as limitações e já ter sido muito adulterada – é ainda base indispensável para a resistência, bem como a revogação das emendas constitucionais promovidas pelo governo ilegítimo. A convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, em tempo político oportuno, teria como marco indispensável a reconquista do governo central pelas forças da esquerda, progressistas e democráticas como parte da ampla disputa para reverter a atual correlação de forças políticas e ideológicas na sociedade, em favor de uma hegemonia que permita estabelecer reformas estruturais democráticas e refundar o Estado Democrático de Direito.
Projeto nacional de desenvolvimento para dar novas perspectivas ao país
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A Frente Ampla precisa convergir também para a formulação de um novo programa que contribua para retomar o diálogo e a confiança com a maioria do povo e setores vitais da Nação. É preciso apresentar soluções para os candentes temas do cotidiano da população. Isso implica laborioso e perseverante esclarecimento do que representou o ciclo de governos no período 2003-2016 em contraposição ao que está em curso no país, situados no contexto internacional de impasses da globalização neoliberal, com novas ameaças e oportunidades ao desenvolvimento das nações. Considera que o projeto ultraliberal neocolonizador, definindo o lugar do Brasil na divisão internacional do trabalho como produtor extrativista, estrangula a possibilidade de desenvolvimento soberano com distribuição de renda e inclusão social.
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O PCdoB apresenta-se ao debate com bandeiras agregadoras para coesionar a maioria da Nação, tendo por base seu Programa Socialista, alcançando esse objetivo maior mediante o caminho do Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento. Seus pilares são a defesa da soberania nacional e da democracia; o desenvolvimento econômico com valorização do trabalho e diminuição das desigualdades sociais e regionais; a proteção do meio ambiente com desenvolvimento sustentável; e a integração com parceiros da América do Sul. Engloba as reformas estruturais democráticas do Estado nos sistemas político, judicial, financeiro e tributário, além das reformas sociais na questão urbana, agrária, da saúde e da educação e, no plano da sociedade, a democratização dos meios de comunicação, como medidas decisivas para se conformar a base social necessária a esse intento.
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Passo decisivo é o fortalecimento do Estado nacional, reestruturado como ente democrático, indispensável para assegurar e promover a soberania do país, planejar e induzir o desenvolvimento e proteger os interesses estratégicos econômico-sociais, institucionais, científicos, culturais, diplomáticos e da defesa do país. É preciso contar com a força do Estado nacional sob direção progressista, juntamente com a necessária luta classista dos trabalhadores por seus direitos, para confrontar os interesses mundiais do rentismo e do imperialismo, as forças mais poderosas que agem contra o desenvolvimento e sequestram a democracia e a autodeterminação das nações.
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O Partido julga ser essa a rota para elevar o Brasil a um novo ciclo civilizatório, afirmar a Nação e o papel autônomo do Brasil no contexto internacional, elevar o bem-estar material e espiritual do povo brasileiro. A saída da crise brasileira passa pela retomada de amplo consenso em torno da centralidade do desenvolvimento nacional soberano, como missão para realizar as amplas potencialidades do Brasil e de seu povo. Trata-se de combater o enxovalhamento diuturno da nacionalidade, que produziu quadro de desalento e ceticismo para com o Brasil, de forte clivagem entre os brasileiros, agudamente crescente desde as jornadas de junho de 2013, e dispersão da própria ideia e o sentido de Nação. Para trilhá-la, o PCdoB considera necessário conformar um bloco político histórico que constitua nova maioria política para vencer nas urnas, na mobilização popular e na luta de ideias, em prol dos interesses do Brasil, do povo e da democracia.
Ir ao encontro dos anseios do povo
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Na mensagem de novas esperanças para o povo, a valorização do trabalho e dos direitos sociais se destaca como fator estruturante do desenvolvimento. Medidas para a elevação da renda do trabalho e da massa salarial; política institucionalizada de valorização do salário-mínimo e garantia da aposentadoria digna; a liberdade de organização sindical dos trabalhadores; direitos iguais para as mulheres trabalhadoras; entre outras, promovem espiral virtuosa envolvendo renda, estímulo ao consumo, demanda de crédito popular, maior demanda agregada para o campo da indústria, agricultura e serviços, e maior arrecadação e orçamento da União, dos estados e municípios.
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Em especial, é preciso apontar soluções para os candentes temas do cotidiano – empregos, segurança pública, carências urbanas em moradia, mobilidade e saneamento, reforma agrária e estímulo à agricultura familiar, serviços públicos universais, direitos sociais e civis em geral. Deve-se promover autêntica revolução na oferta da educação e saúde públicas, universalizadas e de qualidade. Para isso, serão revogadas as emendas constitucionais que instituíram o teto de gastos, contra os direitos sociais, do trabalho e da Previdência, bem como o desmonte, levado a cabo após o impeachment, dos avanços alcançados na participação popular e cidadania, dos programas sociais que beneficiaram a maioria do povo, da promoção cultural com a regulação e o estímulo do conteúdo nacional e regional.
Superar a crise e retomar o crescimento econômico
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A condição básica para isso é a retomada da economia com uma rota sustentável. Recompor a capacidade de indução e planejamento do Estado é passo decisivo, tendo por centro nevrálgico a elevação da taxa de investimento. Isso envolve várias frentes de ações simultâneas da política econômica, mobilizando o papel das estatais, as bases do sistema nacional de financiamento de longo prazo, restaurando o papel do BNDES, as parcerias público-privadas e as parcerias que permitam o acesso a fundos de investimentos como o do Brics. Especialmente, pode-se compor um fundo de investimentos utilizando parte das reservas internacionais. Essa medida reduz o custo fiscal das reservas para o Tesouro e permite fortes investimentos em infraestrutura, que elevam a competitividade brasileira, e investimentos sociais que elevam o índice de desenvolvimento humano, também compreendidos como parte da estratégia de desenvolvimento.
146
A economia será alavancada pelos setores industriais, em especial os de bens de capital e da defesa, a cadeia produtiva do petróleo e gás – estimulando também produtores de pequeno e médio portes –, biocombustíveis, indústria química e petroquímica, a construção civil, a agropecuária. A Petrobras deve ser fortalecida como empresa-chave da economia brasileira e, para isso, há que se considerar irrevogável o regime de partilha no pré-sal, fortalecendo a justa política do conteúdo local. Nova política de crédito público e privado é necessária para se renegociar as dívidas das empresas, estimular o consumo popular e reduzir os spreads bancários. Acordos de leniência devem ser concluídos com as grandes empresas da engenharia nacional, sem lesá-las devido a eventuais crimes de seus dirigentes, para que possam voltar a crescer e impulsionar o desenvolvimento. Com essas medidas, e a mobilização das forças do trabalho e da produção, o país pode sanar progressivamente suas grandes desigualdades sociais e regionais.
147
O Brasil precisa superar o longo ciclo de moeda apreciada instituído por meio do tripé macroeconômico determinado desde a década de 1990, que acelerou a desindustrialização. A indústria segue sendo fator por excelência para o desenvolvimento, emprego e renda, e a chamada quarta revolução industrial carece de uma estratégia nacional, combinando políticas setoriais e sistêmicas de estímulo. O revigoramento da base industrial deve ser ancorado em fortes investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação, a partir dos polos dinâmicos potenciais da economia.
148
No âmago disso, é indispensável uma nova política macroeconômica, tendo por missão expandir e sustentar investimentos em infraestrutura e inovação, reduzir estruturalmente a taxa real de juros, manter sob controle a trajetória da dívida pública, assegurar a higidez fiscal do Estado e defender a moeda. Essa nova macroeconomia deve ser compreendida como política de Estado para o plano estratégico de desenvolvimento e demanda novos marcos institucionais. O regime fiscal precisa dotar o Estado de condições para exercer políticas anticíclicas quando necessário, bem como fazer face à situação crítica das contas dos estados e municípios – contando também com a reforma tributária progressiva, com taxação sobre grandes fortunas, patrimônio e riqueza. Necessita-se ampla reforma no Banco Central, com um duplo mandato de controle inflacionário e geração de emprego e renda. É preciso estimular a indústria e o agronegócio com a administração da taxa de câmbio e regulamentação da entrada e saída de capitais, bem como acomodar choques de oferta com horizonte maior que o de um ano para cumprimento da meta inflacionária.
Unidade é a bandeira da esperança
149
O PCdoB tem claro o projeto de Brasil pelo qual se bate, e se dispõe a discuti-lo com o povo brasileiro e os setores vitais da Nação. Para realizar esse projeto – que considera essencial para a retomada de rota próspera para o Brasil e digna para o povo –, aponta o caminho da unidade como bandeira de esperança do povo, em ampla frente de forças políticas e sociais, para disputar os rumos do país.
150
As eleições presidenciais são palco das articulações de todas as forças políticas e terão papel decisivo para a luta dos brasileiros. Também os esforços da luta da Frente Ampla convergem para elas. O PCdoB buscará protagonismo nessa disputa, e pode apresentar ao povo e às forças políticas progressistas uma pré-candidatura presidencial que contribua para a concretização desses objetivos. Quer interagir, com sua identidade programática própria, com o povo e os setores vitais da Nação, os anseios e mutações que se processam na complexa sociedade brasileira para descortinar rumos. Entretanto, nesta hora, o debate não deve partir de nomes e candidaturas, mas sim de uma agenda para o país que consolide a unidade da esquerda e das forças patrióticas e democráticas em Frente Ampla.
151
Nas eleições de 2018, o PCdoB visa a fortalecer-se com a reeleição de Flávio Dino governador do Maranhão e ampliar a bancada de deputados federais mantendo-se presente no Senado Federal. No ambiente conspurcado pela criminalização da atividade política, serão eleições muito difíceis para todos. Dadas a sua dimensão e as ameaças da reforma do sistema político e eleitoral em curso no Congresso Nacional, os comunistas devem preparar o projeto eleitoral e de campanha desde já, em todos os planos da ação partidária, e contam com o apoio das forças que os acompanham como eleitores, simpatizantes e amigos, para dar sustentação a esse desafio. A todos e todas nas fileiras partidárias, indica o caminho do fortalecimento das inserções sociais e das organizações partidárias, base essencial para a conquista de postos institucionais eletivos.
152
O PCdoB aprendeu na experiência histórica própria de seus 95 anos ininterruptos, que é preciso se temperar nas crises, nos períodos de acirramento da luta política de classes. Os comunistas e a democracia estão entrelaçados na história do Brasil e são imprescindíveis ao país. Confiam em que a classe operária, uma vez mais, desempenhará o papel histórico de combatente de vanguarda pelo progresso. O PCdoB confia nas convicções da imensa maioria do povo brasileiro – que defendeu a democracia em distintas situações ao preço de muito sacrifício e mesmo da vida de vários e várias combatentes –, e também no patriotismo do povo e de vastos setores da nacionalidade, para voltar a disputar os rumos por um Brasil soberano, livre e justo, como caminho para o socialismo, seu ideal maior.
IV – FORTALECER O PCdoB E ELEVAR SEU PAPEL NA RESISTÊNCIA
153
O novo ciclo político pós-golpe de 2016 exige um Partido Comunista com identidade política e ideológica nítida e destacada, mediante a assimilação plena do Programa Socialista pelo coletivo partidário, para que o Programa seja de fato, e na prática, o guia maior na ação política e na estruturação do Partido. A identidade e a perspectiva políticas do PCdoB estão em sua ideologia, em seu Programa e em seu Estatuto, são o que diferencia o PCdoB dos demais partidos. A experiência política nesta situação histórica vai demonstrando de forma viva e concreta a superioridade de um partido de novo tipo, marxista-leninista, para o nosso tempo. Uma política revolucionária, na realidade brasileira atual, deve fortalecer o PCdoB e as forças de esquerda e populares, e elevar a consciência dos(as) trabalhadores(as) e do povo.
154
Construir, estruturar o PCdoB é uma tarefa estratégica que tem uma dimensão política, uma dimensão ideológica e uma dimensão organizativa – na qual devem se empenhar todos os membros do Partido, em especial os quadros de todas as frentes partidárias. Segundo o Programa Socialista do PCdoB, “a conquista da hegemonia pelas forças interessadas na transição ao socialismo exige acumulação de forças de caráter revolucionário” e “tal processo tem dois eixos básicos: o político e o prático. O primeiro é o movimento pela aplicação deste Programa, pelo crescimento e fortalecimento partidário e de demais forças revolucionárias e progressistas.”.
155
O lugar político do PCdoB, nas condições de hoje, é ser uma força da esquerda consequente, patriótica e anti-imperialista, em luta pelo socialismo nas condições concretas do Brasil, impulsionadora e construtora da Frente Ampla na luta democrática, popular e patriótica, que abra caminho para a superação da crise atual que vive o Brasil, enfrentando as forças reacionárias promotoras de um Estado de exceção. Além disso, é preciso extrair todas as consequências do Programa Socialista do PCdoB na ação política e prática do coletivo partidário, para a afirmação desse lugar político próprio dos comunistas no Brasil de hoje.
156
Para os próximos anos, visando já ao seu centenário em 2022, exige-se um Partido com ação planejada, mais unido, mobilizado, estruturado e autossustentado, principalmente nas capitais e nos municípios estratégicos. Apesar das ameaças reacionárias, o Partido pode e deve elevar a sua atuação política na resistência democrática e estruturar-se mais e melhor, no seio do povo, em especial entre os(as) trabalhadores(as), ousando lutar estrategicamente pela hegemonia na classe trabalhadora brasileira, dando os passos necessários para isso desde já.
157
Com a consumação do golpe de Estado no país, em 2016, as condições para a atuação do PCdoB, dos demais partidos de esquerda, das forças progressistas e dos movimentos populares se alteraram bruscamente: estão mais difíceis, pelas consequências da derrota política e ideológica que o campo popular sofreu, em razão do desrespeito à legalidade democrática, devido à criminalização da atividade político-partidária e das manifestações populares, e à rejeição à política e aos partidos, fenômeno tenazmente “fabricado” pela grande mídia. E tais dificuldades podem se agravar no próximo período.
158
O PCdoB saiu prestigiado da luta contra o golpe, pois destacou-se por sua clareza política em denunciar a preparação golpista – na 10ª Conferência Nacional, de maio de 2015 –, e por sua coragem e combatividade em todas as frentes de luta pela democracia, e em defesa da soberania nacional, dos direitos trabalhistas e conquistas sociais.
159
Se, por um lado, é verdadeira a afirmação da 10ª Conferência Nacional do PCdoB de que há “restrições a um crescimento extensivo e espontâneo” de suas fileiras, como aquele que prevaleceu durante o período dos governos de Lula e Dilma, por outro, é possível preservar as forças auferidas e mesmo buscar um crescimento de caráter mais consciente, intensivo e estruturado. Um Partido Comunista é desafiado a mostrar a sua fibra nesses momentos de radicalização da luta de classes. O PCdoB saiu da ditadura militar (1964-1985) mais forte do que entrou – o que foi uma grande vitória dos comunistas.
160
Diante das adversidades, importa muito a atitude que o Partido terá, que deve ser de resistência ativa. O Partido e as forças populares precisam lutar com coragem, flexibilidade, sagacidade e inteligência, sem voluntarismos e visão idealista – no sentido filosófico. O papel dos quadros será decisivo nesse novo período. Do mesmo modo, será preciso avançar no fortalecimento dos Comitês Municipais, Distritais e Organizações de Base (OBs).
161
A defesa do Partido requer, também, uma atuação política ampla e incisiva no Congresso Nacional e no Poder Judiciário para reverter as normas antidemocráticas que estão sendo impostas à vida e ao funcionamento dos partidos políticos, negando-lhes autonomia e impondo regras, controles e multas que, na soma, praticamente os inviabilizam institucionalmente, sobretudo as legendas programáticas e ideológicas.
162
Desde os anos 1990, com a consigna lançada por João Amazonas de “cuidar mais e melhor do Partido”, o PCdoB vive um rico processo para atualizar a teoria e a prática de construção partidária no quadro da realidade brasileira. Nesse percurso, colhe êxitos e reveses, realiza marcantes acertos e comete erros, em meio às vicissitudes da realidade objetiva — uma experiência que interage com a de outros partidos comunistas e revolucionários da América Latina e do mundo. Entre os êxitos se destacam um pensamento político denso e avançado sobre o Partido e boa quantidade de quadros com bom nível político-ideológico e ação militante abnegada.
163
Entretanto, será necessário sistematizar criticamente a trajetória recente de prática de estruturação partidária (nos planos político, ideológico e organizativo), extrair lições dos erros e acertos. Esse exame crítico e autocrítico deve ser feito no processo do 14º Congresso do Partido e ainda durante os próximos anos. O PCdoB, além desse estudo crítico e autocrítico, precisa continuar elaborando sobre o tema Partido, polemizando com outras correntes de esquerda – que negam o leninismo e o papel histórico da classe trabalhadora, negam a nossa concepção de Partido revolucionário e a sua atualidade –, e desbravar novas formas de organização, consoantes às singularidades do Brasil e da contemporaneidade.
164
O Partido teve importante papel, por vezes até protagonista, na luta política nos últimos 14 anos, e se ocupou dos desafios com significativo êxito. No entanto, ante as imposições objetivas da luta de classes, sofreu pressões e influências pragmáticas, liberais, corporativistas e também dogmáticas, e descuidou em certa medida da realização prática da política de estruturação partidária. Essas pressões e influências descritas acima levaram a um certo rebaixamento do papel da militância e a deficiências ideológicas e orgânicas. Os(as) novos(as) filiados(as) que aderiram ao Partido nos esforços eleitorais ainda não assimilaram suficientemente a ideologia, o Programa e o Estatuto do PCdoB. Daí criou-se uma situação, diante da derrota política e ideológica que a esquerda sofreu no Brasil, em que há dificuldades na vida orgânica em geral, com tendências à dispersão e ao enfraquecimento de organizações partidárias, e em vários casos até ausência de vida orgânica regular em Comitês e Organizações de Base.
165
A partir de junho de 2013 se intensifica a contraofensiva da direita contra a esquerda e as forças progressistas, e contra o sistema político democrático fruto da Constituição de 1988. Nessa contraofensiva, surgiram movimentos, pretensamente novos, sob o comando de forças conservadoras, e por elas financiados, com intenso uso da internet, disseminando a intolerância, o ódio contra a esquerda, em especial contra os comunistas. Desde um pouco antes, o PCdoB já vinha perdendo influência política, organicidade e votos em capitais e em grandes centros urbanos, em especial nas regiões Sudeste e Sul do país. O conjunto do coletivo partidário, com exceções, demorou para perceber os novos fenômenos político-sociais, em âmbito nacional e internacional, que influenciam as condições existentes para a sua atuação política e para a construção partidária. Surgiram novos movimentos e reivindicações, e novas formas de luta e de organização, entre elas as “horizontais”. Cresceu enormemente o papel da internet e das redes sociais como instrumentos de mobilização da sociedade.
166
O PCdoB tem se destacado na promoção da participação das mulheres como elemento indispensável para aprofundar a democracia, reforçando a concepção da emancipação feminina como um tema estratégico vinculado ao avanço da sociedade. Questão que está expressa no Programa Socialista e no Estatuto do Partido, na realização de duas Conferências partidárias sobre o tema, na criação da Secretaria da Mulher na esfera do Comitê Central e demais direções, nas suas representações parlamentares, além do Fórum Nacional. No curso da crise capitalista e do recrudescimento do neoliberalismo, com o desmonte das políticas públicas, com a desregulamentação do mundo do trabalho, com o fortalecimento de ideias conservadoras sobre o papel das mulheres na sociedade, torna-se ainda mais necessário desenvolver e impulsionar a visão emancipacionista, na dimensão pessoal e coletiva. O projeto nacional de desenvolvimento precisa conter a bandeira da emancipação das mulheres e a igualdade integral de direitos como condição para o progresso social. O Partido deve dar sequência à sua política de valorizar o papel das mulheres na estrutura partidária, nas suas ações políticas, e se empenhar para fortalecer crescentemente o protagonismo feminino em todas as esferas da vida da nação.
167
O documento Política de quadros comunistas para a contemporaneidade, aprovado no 12º Congresso do Partido, em 2009, ressalta os desafios político-ideológicos que o PCdoB tem enfrentado nas duas últimas décadas, e a luta para firmar uma concepção leninista, brasileira e contemporânea de Partido Comunista de quadros e de massas, em luta contra as pressões do “dogmatismo, que leva a uma postura engessada ou defensiva frente às mudanças, dificultando a emancipação do pensamento; o liberalismo, que produz o afrouxamento dos compromissos com o Partido; o corporativismo, que limita os horizontes de formulação de um pensamento político e a aspiração por constituir os trabalhadores como classe que almeja o poder político nacional, restringindo-os à mera luta social; e o pragmatismo, produto da luta política no nível atual, que leva a perder de vista objetivos fundamentais em prol do imediato, à pressão pela autonomização de grupos de interesse no interior do Partido, à perda de referenciais estratégicos na atuação no seio das instituições vigentes, à burocratização”. Tais pressões, se não enfrentadas consciente e corretamente, são “entraves tendentes a rebaixar o sentido estratégico da luta do Partido e do próprio instrumento partido”.
168
O Partido tem dificuldade de mobilizar o conjunto de seus militantes e filiados, os trabalhadores e o povo na ação política de massas, e tem sérias debilidades na sua estruturação em nível municipal, distrital e de base. Tais deficiências, que em parte resultam de vicissitudes do próprio processo de crescimento extensivo do ciclo político anterior, dificultam o poder de ação política, de combate, a ampliação da força-política eleitoral e também a democracia interna do Partido, a formação ideológica e política de seus membros. Essas dificuldades também criam obstáculos para a incorporação dos(as) novos(as) filiados(as) que chegaram ao Partido no último período, não potencializando a sua energia renovadora.
169
A nova situação do Brasil pós-golpe de 2016 gera grandes impactos nas condições objetivas de acumulação de força e da construção partidária. Para o próximo período, diante das dificuldades concretas da luta político-ideológica, será preciso persistir no desenvolvimento da teoria de Partido, e na atualização da política de estruturação partidária.
170
A política de estruturação partidária do PCdoB parte do desafio de construir um partido revolucionário de quadros e de massas – de militantes e filiados organizados e mobilizados nas bases partidárias – capaz, nas condições do Brasil de hoje, de empreender a mobilização política do povo e de amplo campo democrático e patriótico, para acumular forças no sentido de conquistar seus objetivos estratégicos, contidos no Programa Socialista para o Brasil.
171
Uma tática correta e uma política atualizada de estruturação partidária são necessárias, mas insuficientes. A política comanda a organização, e a organização realiza a política. É preciso também organizar (planejar e realizar) a ação política e a ação estruturadora do Partido. Além disso, diante de um período adverso como o atual, é preciso tornar mais efetiva a construção de um Partido Comunista de quadros e de massas de militantes e filiados organizados.
Diretrizes para o PCdoB no percurso até o seu centenário, em 2022
PCdoB mais forte para disputar a hegemonia e conquistar seus objetivos programáticos
172
Durante os governos de Lula e Dilma, a esquerda, em decorrência da correlação de forças de então, não teve a hegemonia em todos os poderes de Estado, apesar de ter chefiado o Poder Executivo da União. Uma das lições que fica destes governos, do ponto de vista tático-estratégico e da construção partidária, é a necessidade de disputar a hegemonia no Estado e também no povo, disputar a consciência popular.
173
No processo de acumulação de forças e de luta pela hegemonia, não é suficiente a ocupação de espaços políticos no Estado, é preciso também avançar na politização, na mobilização e organização das massas trabalhadoras, além de construir o PCdoB e fortalecer as demais forças do campo popular, conforme orienta o Programa do Partido.
174
O problema da acumulação de forças e da construção partidária é, na verdade, uma questão de orientação política e de concepção de Partido, que deve ser avaliada pela prática política. Somente um PCdoB de muitas centenas de milhares de filiados(as) e militantes organizados(as), e muitos milhões de simpatizantes, eleitores(as) e amigos(as) exercerá um papel hegemônico de liderança da classe trabalhadora e das demais forças revolucionárias e progressistas na conquista de um novo poder político, e na condução da transição ao socialismo; não há atalho nesse caso, e esse é o caminho que o Partido tem que percorrer nas atuais condições do Brasil e do mundo.
175
O PCdoB luta hoje por um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento como caminho brasileiro para o socialismo, uma longa e complexa caminhada, de muitas idas e vindas, na qual a convicção no rumo é imprescindível. Nessa luta é importante que o Partido apreenda a realidade estadual e regional, e conheça com profundidade as circunstâncias específicas próprias do contexto histórico, econômico, social, ambiental, político e cultural, e as forças políticas e sociais, de cada estado e região. Assim, o Partido poderá elaborar propostas concretas para cada localidade, baseadas em seu Programa, para unir na luta amplas forças populares.
Planejar e realizar, de forma sinérgica e integrada, a ação política e a estruturação partidária
176
O PCdoB iniciou uma mudança de longo fôlego em 2015, ao optar pelo planejamento sistêmico de toda a sua atividade. O desafio do Sistema de Ação Planejada em implantação é associar, de forma inseparável, a ação política e a estruturação partidária. Isso significa abordar de forma integral e sinérgica todas as dimensões da ação política e da estruturação partidária, acompanhar e controlar a evolução do planejado, avaliar e fazer as adequações e atualizações necessárias. É preciso flexibilidade frente às alterações da conjuntura. Se muda a situação, também muda o plano. E a direção pelas ideias deve ser associada à direção concreta, pois as ideias não se realizam por si só.
177
A ação planejada “três por quatro” precisa relacionar praticamente, e de forma equilibrada, intensa e simultânea, as três modalidades de ação política na luta por acumular forças – a ação política de massas, a ação política eleitoral e nas instituições do Estado, e a ação política na luta de ideias – com as quatro áreas da estruturação partidária – organização, finanças, comunicação e formação.
178
O planejamento da ação política e da estruturação partidária, como concepção e prática de direção, exigirá persistência até que se difunda mais em todo o Partido a atual política de estruturação, e que se consolide uma nova cultura. Aprovado o Plano, a cada reunião do Comitê e da Comissão Política se discute a execução, a realização do que foi planejado, ou seja, a pauta das direções será, na prática, a situação política relacionada com as ações políticas e de estruturação partidária. Assim, se institui um processo que assegura o planejamento, a execução, o acompanhamento e a avaliação, de forma sistemática e permanente.
179
Com diretrizes estratégicas até 2022, ano do centenário do PCdoB, a serem definidas no 14º Congresso, a ação planejada se concretiza em planos bienais (2018-2019 e 2020-2021), com projetos, ações e metas, a exemplo do que ocorre com o plano bienal 2016-2017, e as etapas anuais do Plano, como a de 2017, na qual se destaca a Campanha de Estruturação Partidária.
180
A efetiva implantação e o êxito do Sistema de Ação Planejada irão demandar a gradativa incorporação dos Comitês Estaduais e de Comitês Municipais estratégicos, por meio da formulação de planos próprios que considerem a força do Partido, a conjuntura local e a realidade socioeconômica, promovendo – na definição dos seus objetivos, projetos, ações e metas – as eventuais adaptações a cada realidade.
181
As ações de estruturação partidária, durante os Planos Bienais 2018-2019 e 2020-2021, devem ter como diretriz estruturar melhor e com mais rigor as organizações partidárias de nível municipal, distrital e de base – apoiadas nas noções de consciência voluntária do(a) filiado(a) e militante, e de obrigatoriedade de certos procedimentos advindos dos deveres estatutários.
Mais ações e campanhas políticas de massa, com a participação decidida das organizações partidárias, mobilizando os comunistas e o povo
A consciência revolucionária, socialista, se forma na militância, na assimilação da teoria revolucionária, o marxismo-leninismo, e na participação política – daí a importância da atividade de mobilização de massas a partir das organizações partidárias. Um partido marxista-leninista, de quadros e de massas, precisa continuamente mobilizar a sua militância e os(as) seus(suas) filiados(as), realizando permanentemente campanhas políticas e de estruturação partidária. As mobilizações populares, as campanhas eleitorais e demais campanhas políticas, e as campanhas de estruturação partidária, devem contar com a participação decidida dos Comitês e Organizações de Base do PCdoB, com planos de ações e metas para cada organização partidária.
183
As campanhas eleitorais são grandes campanhas políticas de massa, e o PCdoB precisa aproveitá-las melhor para a sua acumulação de forças. A Reforma Política conservadora pode criar uma cláusula de desempenho e o fim das coligações proporcionais, entre outras medidas restritivas – o que desafiará o Partido a atualizar a sua tática eleitoral. Já o fim do financiamento empresarial das campanhas eleitorais é uma vitória democrática, e exige do PCdoB a realização de campanhas eleitorais com maior participação consciente dos membros do Partido, e dos(as) simpatizantes, eleitores(as) e amigos(as), impulsionando o financiamento popular das campanhas, com ferramentas digitais.
184
No sentido de promover a sua atuação nos movimentos sociais, faz-se necessário promover conferências e encontros temáticos para compreender a nova realidade das lutas e dos movimentos populares no Brasil, e aperfeiçoar a intervenção unificada e organizada do Partido nessas lutas e nesses movimentos, além de fortalecer o Fórum de Movimentos Sociais (FMS) – do PCdoB –, e criá-lo nos estados e municípios onde não houver, com foco nas capitais e nos municípios estratégicos. O funcionamento regular do FMS é fundamental para se avançar na coesão e unidade das lutas sociais, para ampliar a capacidade de mobilização política do povo e superar a tendência de dispersão e fragmentação das pautas, questão recorrente no âmbito dos movimentos sociais. O FMS também deve coordenar a atuação dos comunistas no âmbito das frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo.
185
O PCdoB, como Partido de classe, sobretudo quando se aprofunda o confronto classista, precisa lutar pela hegemonia na classe trabalhadora atual, posicionar-se como Partido do presente e do futuro. Esse objetivo demanda enfrentar desafios que abrangem mudanças no mundo do trabalho, no perfil dos trabalhadores em decorrência da reestruturação tecnológica e a enorme pressão dos aparelhos ideológicos e culturais das classes dominantes. Em consequência, faz-se necessário atualizar estudos das classes sociais no Brasil, em particular o perfil e a situação do proletariado. A classe trabalhadora se reconfigurou, sua composição vai desde o trabalho mais precário, informal e de serviços até os trabalhos mais complexos, de estratos médios como engenheiros e técnicos. Portanto, torna-se mais complexa a formação de uma consciência social avançada, e cabe ao Partido fazer-se o elo de unidade da classe, e disputar a consciência dos(as) trabalhadores(as) mediante a luta política e ideológica, pois, como na visão leninista, as massas elevam o seu nível de consciência com sua própria experiência e interagindo com ideias avançadas.
186
O PCdoB precisa reforçar persistentes ações políticas com os trabalhadores e trabalhadoras, priorizar a estruturação partidária na classe trabalhadora – reforçando a presença da juventude e das mulheres – e aumentar a capacidade de comunicar-se e difundir as ideias avançadas entre o proletariado, formando inclusive intelectuais orgânicos vinculados ao campo do trabalho. Para tal, comunistas que atuam no sindicalismo devem prosseguir na luta para superar o corporativismo e o economicismo e assumir as lutas políticas em curso. Na ação sindical, os quadros e militantes que atuam nessa frente devem lutar para fortalecer a CTB, organizar-se nas empresas e também nos locais de moradia e estudo.
187
Deve-se persistir na atuação sindical classista desde o local de trabalho e também assumir bandeiras relacionadas à luta por um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento, que vão além das relacionadas a esse setor, como mobilidade urbana, educação e cultura. É uma tarefa que requer o empenho não só dos sindicalistas, mas também do coletivo partidário. Comitês Estaduais, Municipais e Distritais devem se empenhar na conscientização e mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras, na luta pelos seus direitos. É preciso executar projetos focados na construção de Organizações de Base em empresas e categorias, sobretudo nas estratégicas. Os avanços nesta frente devem se refletir na composição social de todas as instâncias do Partido.
188
Particular importância e prioridade deve ter a participação dos comunistas na constituição de um movimento de jovens trabalhadores (do mercado formal, informal e desempregados) vinculado à CTB, entidade plural e classista. Deve-se atentar para a situação de desigualdade imposta às trabalhadoras, que a crise exacerba.
Recadastrar os(as) filiados(as) e militantes e utilizar o PCdoB Digital como ferramenta de mobilização e de estruturação partidárias
189
As recentes tecnologias de comunicação e informação são a nova “revolução comunicacional” e exigem uma renovada e rápida atitude do PCdoB. É preciso fazer uma “digitalização” para impulsionar a atividade do Partido e o seu controle, com ferramentas e métodos contemporâneos. O “ambiente digital” e as ferramentas que já estão disponíveis têm potencial de alavancar a construção partidária em todas as dimensões, inclusive permitir conhecer a situação real do Partido, em tempo real, e dar condições para o controle das ações das organizações partidárias e da vida partidária dos(as) filiados(as), militantes e quadros, facilitando muito o trabalho de inteligência organizacional.
190
O recadastramento dos(as) filiados(as) e militantes é condição obrigatória para a participação no 14º Congresso do Partido. Ao se recadastrar no PCdoB Digital, o membro do Partido se insere em uma Organização de Base e passa a contribuir financeiramente com o Partido por meio do aplicativo ou do Portal do PCdoB (www.pcdob.org.br). O PCdoB Digital e as redes sociais facilitam a comunicação não presencial e a preparação prévia das atividades e reuniões presenciais. No entanto, é imprescindível a realização regular das atividades e reuniões presenciais. A utilização dessas ferramentas de comunicação, em especial as redes sociais, precisa ser regulamentada para fortalecer a democracia interna e, ao mesmo tempo, resguardar a unidade do Partido e o respeito às instâncias e organismos partidários.
Fortalecer a unidade, a disciplina e as direções partidárias, mediante a política de quadros e um sistema de direção atualizado
191
As direções coletivas do Partido, os Comitês Estaduais e os Comitês Municipais, e suas Comissões Políticas, precisam ter força e poder real de execução dos Planos Bienais, com autoridade para dirigir o Partido, de acordo com o centralismo democrático, para garantir que as decisões coletivas e os Comitês dirigentes prevaleçam em relação a outras expressões de poder que existem dentro do Partido, a partir da posição de quadros comunistas no âmbito do Estado (governos e parlamentos) ou em organizações populares, como os sindicatos.
192
As direções executivas do Partido precisam inclusive dispor de mais força material – em termos administrativos, patrimoniais e financeiros –, e trabalhar de forma realista com um orçamento derivado de um processo de planejamento, que define as prioridades. Os Comitês e as suas Comissões Políticas devem se reunir e ter suas atividades e seu funcionamento regulares, e serem, em seu nível de responsabilidade, o centro coletivo de poder e de planejamento, de acompanhamento e de controle da ação política e da estruturação partidária, que dirige as lideranças comunistas em seu nível – no Executivo, no Legislativo, nas entidades do movimento sindical e popular, entre outros.
193
Nestes tempos difíceis, os quadros são ainda mais decisivos. A estruturação partidária é, antes de tudo, um tema político e ideológico, que envolve valores e atitudes, assim como a conduta prática, sobretudo dos quadros. Nos próximos anos será preciso formar mais quadros e, mediante a política de quadros, fortalecer e renovar as direções partidárias – dos Comitês Municipais às OBs – com os melhores quadros, para que essas direções tenham a capacidade de unir o Partido em torno do projeto político e de estruturação partidária em seu nível, em especial nas capitais e nos municípios estratégicos.
194
A política de quadros também deve dar especial atenção aos dirigentes dos Comitês Distritais (CDs) e das OBs. Todos(as) os(as) dirigentes devem estar inseridos(as) em uma OB, para dar sua contribuição política e seu exemplo. Muitos quadros que só atuam hoje em Comitês Estaduais e Municipais, em cargos e funções de governos e parlamentos, Frações e Coletivos, devem assumir também tarefa de direção nos CDs e nas OBs. Dessa maneira, a ação do Partido pela base será valorizada, e será impulsionada a formação de novos quadros de base, o que deverá resultar futuramente em maior quantidade e qualidade de lideranças intermediárias e superiores.
195
A situação política atual exige dos quadros maior capacitação política e firmeza ideológica. Além da formação teórico-ideológica e política, da convicção revolucionária e da capacidade de elaboração e análise política, é preciso valorizar a capacidade realizadora e o espírito prático, a capacidade de liderança e de mobilização dos(as) filiados(as) e militantes, de forma permanente e organizada.
196
Os sistemas de direção partidária precisam ser atualizados, em nível nacional, estadual, municipal e local (distrital e de base), para serem mais simples, coerentes e articulados, sem perder a complexidade nos Comitês onde o Partido é mais forte politicamente e melhor estruturado, como as músicas do maestro Tom Jobim, com melodias simples e harmonias complexas.
198
Os CDs e OBs são imprescindíveis para se organizar a ação do Partido, a partir das lutas e dos movimentos políticos, sociais e culturais reais. Eles devem ser alavancas da mobilização do povo. Sem os CDs e as OBs não há participação organizada dos(as) filiados(as) e militantes na luta política e na vida partidária, não se formam novos quadros, não há democracia e nem disciplina para os(as) filiados(as) e militantes.
Estruturar os Comitês Distritais e as Organizações de Base, imprescindíveis para um Partido Comunista de quadros e de massas
197
Os Comitês Distritais (CDs) e as Organizações de Base (OBs) são imprescindíveis para a concretização de um Partido de quadros e de massas, que é uma necessidade histórica e também do momento, para elevar o papel do Partido na resistência democrática na atualidade. Sem a real existência de CDs e OBs com vida política, ideológica e organizativa permanente, o Partido acaba se bastando a um círculo de alguns milhares de quadros.
199
É preciso estruturar, nos municípios estratégicos, Organizações de Base grandes, com muitos(as) militantes e filiados(as), e relacionadas com amigos(as), eleitores(as) e simpatizantes; utilizar formas inovadoras, com flexibilidade de formas e tipos de OBs, com pauta, agenda de atividades – políticas e culturais – e métodos apropriados. Deve ser garantida a prioridade para as OBs de trabalhadores(as). Nas capitais e nos municípios com mais de 200 mil eleitores e nos municípios estratégicos onde o Partido estiver mais estruturado, organizar os Comitês Distritais.
201
A radicalização da luta política e a busca de saídas para o país demandam reforçar o trabalho na luta de ideias, que abarca as frentes da Comunicação e da Formação e Propaganda. A intensificação desse trabalho com os quadros e os(as) militantes intermediários(as) e de base só acontece se estes(estas) estiverem organizados(as) nos Comitês e OBs.
202
A política de comunicação, de formação e propaganda precisa reforçar a difusão de seus instrumentos e de publicações parceiras, entre eles, o Portal Vermelho, o aplicativo e o Portal do PCdoB (www.pcdob.org.br), a Rede Vermelha, A Classe Operária, a revista Princípios, a Fundação Maurício Grabois, a Escola Nacional João Amazonas, os livros e demais publicações.
203
É preciso ampliar a relação com a intelectualidade das áreas da ciência e tecnologia, e da cultura e arte, e organizar e pôr em ação aqueles(as) intelectuais, cientistas e artistas que são filiados(as) ao Partido. É preciso também estabelecer um programa prioritário para a batalha de ideias. Nele, devem se destacar, entre outros temas, a defesa do papel do Estado no desenvolvimento soberano, a importância dos partidos e da política democrática, e os ideais de solidariedade – em contraposição ao individualismo exacerbado disseminado pelo neoliberalismo – de igualdade social, de defesa da moral e da ética da classe trabalhadora, e do combate à corrupção.
204
Com linguagem mais acessível ao povo, que lide com a percepção que o povo tem do Partido e de suas ideias, a Comunicação precisa ser planejada e realizada em escala de massas. É preciso fazer campanhas publicitárias que unifiquem a comunicação partidária em todo o Brasil, com identidade visual e tendo como carro-chefe os programas de TV e a Rede Vermelha, como central de mídias e redes sociais na internet, para se relacionar permanentemente com amigos(as), eleitores(as) e simpatizantes do PCdoB, parte deles(as) cadastrados(as) e recebendo informações e notícias, e interagindo com a Rede Vermelha. Planejar e realizar atividades culturais do Partido relacionadas à luta de ideias.
Financiar as atividades partidárias de forma independente
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Face a uma realidade marcada por acentuada criminalização da atividade política e pela recessão econômica, impõe-se reforçar as ações militantes e renovar concepções e métodos para fortalecer as finanças partidárias. A política de administração e finanças do PCdoB está passando por uma importante atualização, que visa à progressiva independência material e financeira do Partido, ainda mais necessária na atual situação, de intensificação das exigências legais, administrativas e de contabilidade, a partir de decisões da Justiça Eleitoral.
206
A mudança do quadro político impõe a ampliação da capacidade administrativa e de planejamento financeiro e orçamentário, de gestão financeira e contábil dos Comitês partidários em todos os níveis, com a criação, onde não houver, e o fortalecimento, das Comissões de Controle. No caso do Comitê Central será necessária a contenção de despesas e diversificação de fontes das receitas.
207
Nesse sentido, a iniciativa mais destacada, para todo o Partido, é ampliar a captação de recursos próprios para que, progressivamente, a legenda comunista não dependa do Fundo Partidário. É preciso desencadear desde já a Campanha Nacional de Contribuição Militante. Todos os organismos partidários e quadros são chamados a nela se engajarem pelo sucesso dessa iniciativa. O êxito dessa campanha, que exigirá um trabalho persistente e multifacético – propagandístico, ideológico e político –, será o ponto de viragem da sustentação material e financeira do funcionamento e das ações do Partido. O direito de participar das decisões partidárias, de eleger e ser eleito, depende da consciência, de estar com a contribuição financeira em dia, segundo o Estatuto do PCdoB. É preciso regularizar também a contribuição especial de parlamentares e de assessores, e de quadros que atuam em cargos comissionados na gestão pública, observando o que é permitido por lei e por decisões do Tribunal Superior Eleitoral.
Elaborar um novo Regimento
208
Para atualizar, unificar, desenvolver e consolidar o sistema de direção e o conjunto das normas e processos internos do Partido, é preciso fazer as regulamentações exigidas pelo Estatuto. Logo após o 14º Congresso, será necessária a elaboração de um Regimento do PCdoB.
A resolução da Comissão Política Nacional divulgada na íntegra abaixo, assim como a tese do 14º Congresso Nacional, tem um espaço dedicado para COMENTÁRIO (Dúvidas, críticas ou sugestões).
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LEIA A SEGUIR:
Um novo ciclo de lutas em defesa da democracia, do Brasil e dos direitos do povo
1 – Uma viragem política de grande envergadura
A eleição de Jair Bolsonaro representa o término do ciclo político iniciado em 1985, com o fim da ditadura militar, que teve na Constituição de 1988 um marco da consolidação da redemocratização do país, da conquista de direitos ao povo brasileiro, passando pela resistência ao neoliberalismo na década de 1990, pelos avanços protagonizados pelos governos progressistas desde 2003 até o golpe jurídico-parlamentar de agosto de 2016.
Com o resultado da disputa político-eleitoral de 2018, abre-se um novo período político, marcado pelo ineditismo da ascensão, desde 1985, de uma força de extrema-direita à presidência da República. Um governo determinado a realizar, a ferro e fogo, uma agenda ultraliberal, neocolonial e anticivilizacional. Tal feito representa uma derrota política, ideológica e estratégica para o conjunto das forças progressistas, patrióticas e democráticas, em especial as forças da esquerda política e social.
A eleição de Bolsonaro é resultante de múltiplas causas. Faz parte, como se explicitará adiante, de um fenômeno mundial; além disso, sua vitória foi respaldada pelo imperialismo estadunidense. No âmbito interno, deriva de uma frente constituída pela ampla maioria das classes dominantes, pelos monopólios econômicos e financeiros, e por um arranjo político que coesionou a direita com setores do centro do espectro político nacional. Sua campanha milionária mobilizou recursos materiais, ideológicos e midiáticos, fazendo intensa “guerra digital”. A massiva distribuição de fake news criou factoides e tirou do centro do debate eleitoral as propostas e os projetos para o Brasil, manipulando a opinião pública e o eleitorado. Eleitorado que por longo período foi alvo de intensa campanha midiática que demonizou a política como um todo e desmoralizou sobretudo a esquerda com o estigma da corrupção.
Teve ainda importante destaque no desfecho da disputa eleitoral a participação ativa – e partidarizada – de expoentes do Poder Judiciário e do aparato policial que, a partir da operação Lava Jato, tem interferido intensamente nos rumos da política nacional.
Entretanto, apesar da derrota, na reta final da disputa eleitoral formou-se em torno da chapa Fernando Haddad e Manuela D’Ávila um amplo movimento cívico e democrático contra a candidatura de Bolsonaro que obteve 47 milhões de votos.
Não se trata de um fenômeno isolado
A ascensão ao poder como a de Bolsonaro não é um fato isolado, é a expressão brasileira desse fenômeno maior do crescimento de forças de ultradireita ao redor do mundo. Este fato se desenvolve em um complexo e intricado quadro de transformações do cenário internacional, onde a crise do liberalismo e a questão nacional emergem com força.
Deste quadro se sobressaem a continuidade da crise capitalista, as transformações no processo produtivo com a chamada 4ª revolução tecnológica e uma luta intensa em torno do reordenamento do sistema internacional.
O velho liberalismo político e econômico se encontra em crise. O modelo de globalização neoliberal, regido pelo prisma da financeirização, as medidas de austeridade implantadas como resposta à crise do capitalismo, somadas às transformações produtivas decorrentes das inovações tecnológicas, têm ampliado o fosso entre o capital e o trabalho, produzindo a retirada de direitos e a desvalorização do trabalho e gerado uma enorme massa de desempregados.
Em busca de saídas para enfrentar a crise e o descarte da massa crescente dos deserdados – tidos como “imprestáveis” ao capital nesta atual etapa –, as classes dominantes se encontram divididas. De um lado, os que querem enfrentar a situação mantendo os fundamentos do liberalismo político, ainda que enfraquecidos pela incompatibilidade crescente entre neoliberalismo e democracia. De outro, o robusto número de países, onde forças da extrema-direita já exercem o poder, ou parcela dele, revelando que frações relevantes das classes dominantes aderiram ao extremismo de direita. Há, ainda, outro polo, que apresentam como perspectiva para o enfrentamento do atual quadro de crise da globalização liberal o fortalecimento de seus projetos nacionais autônomos, como China e Rússia, e colocam no centro a luta pelo desenvolvimento soberano e compartilhado e a defesa da paz.
É neste contexto de disputa em torno do reordenamento do cenário internacional, que as potências imperialistas se movimentam para conter a emergência de novos polos de poder. E, dentro dessa chave, pode-se compreender a chamada guerra comercial deflagrada pelos EUA contra a China.
De igual modo, é o que se observa com a adesão de parcelas significativas das classes dominantes brasileiras ao projeto de Bolsonaro. Para elas, se impõe a necessidade de um governo autoritário para tornar realidade seu programa ultraliberal e neocolonial. Nesta mesma ótica, somente um governo deste naipe seria capaz de produzir um novo alinhamento do Brasil aos interesses dos Estados Unidos na arena internacional, contribuindo para conter o processo de transição em curso.
A moldura internacional que contribuiu para a vitória de Bolsonaro se completa com um contexto regional, no qual a América Latina se transformou em um laboratório de experimento do imperialismo, do uso do poder Judiciário com fins políticos, com vistas a conter processos políticos direcionados a promover a democracia, o desenvolvimento soberano e os direitos sociais.
2 – O caráter do governo Bolsonaro
A eleição de Bolsonaro instaura um novo ciclo político no país. E os traços iniciais de sua gestão comprovam que seu governo é de caráter autoritário na política, ultraliberal na economia, retrógrado nos costumes e com forte viés neocolonialista.
Trata-se de uma aliança entre reacionários, conservadores e liberais de direita, corporações do Estado que, sob a égide direta dos setores rentistas, buscam consolidar a nova ordem política, econômica e social, para alterar o regime político democrático garantido pela Constituição.
Tal aliança possui raízes na história política brasileira e construiu a vitória de Bolsonaro com base em um trabalho sistemático, de folêgo, de caráter ideológico-político-cultural. As forças progressistas não perceberam ou menosprezaram esse trabalho que resultou na vitória do que se convencionou chamar de “nova direita”, que nada mais é que a extrema-direita.
O discurso desta nova direita expressa a exacerbação de um falso nacionalismo, de um engodo de que o corte de direitos é capaz de alavancar o desenvolvimento, e de um moralismo com traços inquisitoriais, e faz da intolerância e do ódio contra a esquerda, contra a população LGBT, contra os negros, uma de suas marcas. Dissemina a intolerância religiosa, manipula a religiosidade do povo, exalta a negação da política, e o individual sobre o social.
O discurso e o programa de Bolsonaro são marcados por uma ação corrosiva, destrutiva até de conquistas civilizatórias, como o elenco de direitos sociais, o conjunto de políticas públicas e as instituições focadas nos direitos e no bem-estar do povo que o país constrói desde a década de 1930.
Bolsonaro tem buscado se apresentar como um governo de ruptura com a política. Segue midiaticamente satanizando “a velha política”, mantém os partidos relativamente à margem da constituição de seu ministério; mas, aos poucos, é impelido a dialogar com sua base parlamentar, sobretudo em relação aos cargos federais nos estados.
Apesar dos desgastes iniciais, como as crises envolvendo os filhos do presidente, as graves denúncias envolvendo o senador Flávio Bolsonaro, e dirigentes do PSL, os desencontros no núcleo do governo e na sua base de sustentação, o governo tem força e não pode ser subestimado. Saiu das eleições com um capital político grande, com amplo respaldo dos setores econômicos e financeiros, de parcela expressiva do poder Judiciário, com a complacência de grande parte dos meios de comunicação, além de ter todas as condições para formar uma forte base parlamentar.
O resultado eleitoral não dá carta branca a Bolsonaro
No entanto, é necessário pontuarmos que, apesar dessa vitória, o eleitorado brasileiro não é largamente de direita. Muito menos de extrema-direita. Ele assiste ao desgaste da política, não vê solução para seus problemas, sente os impactos da crise, encontrou uma força, com um discurso mobilizador, que promete colocar as coisas no lugar e impor certa ordem no caos.
Do mesmo modo, não é possível afirmar que os votos dados a Bolsonaro sejam um referendo ao projeto de privatizações e de desmonte do Estado. Dados do Datafolha confirmam esta afirmação, ao indicar que 60% dos brasileiros se dizem contrários às privatizações e 57% rejeitam a redução das leis trabalhistas.
Os polos de poder do governo
A coalizão de Bolsonaro abriga em si distintos núcleos, polos de poder não homogêneos, com agenda própria e em disputa pelos rumos e a visão do governo. Apesar de não possuírem consenso em torno de um projeto de país, tais polos se unificam em torno da agenda econômica ultraliberal – que opera sem intermediários – sob o prisma do rentismo.
a) O Clã
É o círculo ideológico que expressa o pensamento de fundo do presidente e de seu entorno político. É composto pelo núcleo familiar (filhos), lideranças evangélicas e expoentes da bancada da bala. E conta ainda com Olavo de Carvalho e Steven Bannon como ideólogos e estrategistas do neoconservadorismo. Buscam incidir de fato no governo, indicando nomes para ministérios, como o de Relações Exteriores, da Educação, da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. É dele a responsabilidade de manter mobilizado o setor mais extremista da base social e política de apoio do governo. Embora expresse força, o Clã, enquanto núcleo político, é também o mais vulnerável e se tornou o alvo predileto da imprensa.
b) A Farda
É o núcleo composto por expoentes das Forças Armadas que, após 34 anos, retornaram à vida política do país com a eleição do capitão da reserva, Jair Bolsonaro, e do vice-presidente, general Hamilton Mourão. Desde a redemocratização, não se produziu um momento com a presença tão extensiva de militares em funções de governo, com destaque para o Exército.
Até o momento, já há 45 militares de alta patente no governo, com destaque para a presença do Exército, com 18 generais e 11 coronéis da reserva, entre tantos outros. Um dos motivos para tamanha presença é a completa falta de quadros políticos no entorno de Bolsonaro que, sem alternativa, teve de se apoiar na expertise de quadros das Forças.
As Forças Armadas, em que pese não homogêneas, possuem uma visão estratégica de país, mesmo que predominantemente na história tenham desvinculado a dimensão democrática de seu projeto nacional. Nesta nova realidade resta saber como irão se posicionar diante de um projeto ultraliberal, de privatizações e de um alinhamento aos EUA que se acerca a vassalagem.
O vice-presidente, general Mourão, criticado abertamente por expoentes do Clã, mantém intensa agenda de encontros, entre os quais se destaca o recebimento de expoentes da Central Única dos Trabalhadores, CUT, para debater a reforma da Presidência.
c) A Toga
Trata-se do expoente jurídico e policial do governo. Envolve, em essência, setores do Judiciário de primeira e segunda instâncias e Ministério Público, e da Polícia Federal, que ganharam protagonismo na Operação Lava Jato, e possuem como referência principal o ex-juiz e atual ministro, Sergio Moro.
Entre os pontos da agenda de Moro, destacam-se o Pacote Anticrime e a aprovação das Dez Medidas de combate à corrupção, que no fundo buscam revisar a dimensão garantista de nossa Constituição, como presunção de inocência, limite do uso do habeas corpus e ampliação de penas. E ainda manterá sob mira “inimigos internos”, tendendo a atuar na criminalização de movimentos, lideranças e partidos políticos, sobretudo da esquerda.
A participação de Sergio Moro é um trunfo importante para o governo Bolsonaro. Contudo, será o mais cobrado pelos deslizes de membros do governo e terá de apresentar resultados para além do combate à corrupção. Até o momento tem havido um silêncio ensurdecedor sobre as sérias acusações contra um dos filhos do presidente.
d) O Mercado
Os agentes do mercado financeiro já não atuam por intermediários. Escalaram para postos-chave do governo, sobretudo da Fazenda, um time dos sonhos do rentismo: agentes do próprio mercado, como se vê na nomeação de um funcionário do Santander para presidente do Banco Central.
Sob a batuta de Paulo Guedes, o fiador da aliança de Bolsonaro com os círculos financeiros internacionais e nacionais, a agenda econômica a ser implementada consiste em: dar uma guinada ultraliberal na orientação econômica brasileira, direcionar o Orçamento Federal para assegurar os ganhos fabulosos da banca, implementar um ambicioso projeto de privatização, reduzir impostos, zerar o déficit público e realizar reformas consideradas regressivas e de caráter conservador – como a da Previdência, prioridade número um do novo governo.
É o núcleo com maior nitidez de objetivos em torno de sua agenda, conta com vasto apoio entre os setores econômicos, a grande mídia e as elites do país. O ministro da Economia tem atuado de forma independente do articulador político do Congresso, o que tem criado atrito com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
e) Forças que atuam no Congresso
Entre os parlamentares e partidos que apoiam o governo Bolsonaro, estão núcleos que representam expoentes da política tradicional, notadamente da direita e extrema-direita. Não é um bloco coeso, mas um agrupamento de matizes políticos diversos, distintos interesses corporativos que atuam no Congresso por intermédio de frentes parlamentares, como a ruralista, a evangélica e a da bala.
3 – As primeiras ações do governo Bolsonaro confirmam seu caráter
Apesar de desencontros e improvisações, o caráter autoritário, antipovo e entreguista do governo Bolsonaro se expressa nas primeiras iniciativas adotadas pelo presidente e os principais núcleos do governo.
A política externa do governo Bolsonaro realiza uma profunda reorientação diplomática do Itamaraty, levando o país a se afastar de diretrizes como a não ingerência em assuntos internos, a autodeterminação e a busca da solução mediada dos conflitos, preceitos caros à tradição diplomática brasileira. Essa nova orientação visa a estabelecer um alinhamento automático do Brasil com as ações dos EUA, distanciando-o do movimento de desconcentração de poder na arena internacional. São expressões práticas disto o envolvimento ativo do Brasil na desestabilização do governo da Venezuela, e a promessa de mudança da embaixada de Tel Aviv para Jerusalém – ambas com graves repercussões geopolíticas para o país.
O caso da Embraer merece destaque por seu papel estratégico para o país e pelos projetos na esfera da defesa que estão associados à empresa. A empresa de maior valor agregado no Brasil será vendida por uma pechincha de pouco mais de U$ 4 bilhões, que correspondem à parte de suas encomendas. Segundo Bolsonaro, a proposta “preserva a soberania e os interesses nacionais”, por mais que, após dez anos, a Boeing possa comprar os 20% restantes de ações, nas mãos dos acionistas controladores da Embraer. Chama a atenção a anuência dos militares para a realização desta venda, pois a operação pode comprometer o projeto KC-390, avião de transporte militar.
O Pacote Anticrime apresentado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, é a expressão de uma concepção autoritária, punitivista, que usa da violência para combater a violência. Tal medida é um remendo ao arcabouço legal do país, violando preceitos constitucionais, como a presunção de inocência, ao defender a prisão em segunda instância. No conjunto das propostas, não há indicações sobre a realização de investimentos em inteligência e infraestrutura de segurança, em valorização e capacitação dos profissionais da área. Tais medidas ampliarão a população carcerária e darão licença para matar – o que atingirá a população mais pobre e jovens em situação de vulnerabilidade. Em essência, essas medidas ficam longe de responder às demandas efetivas da sociedade, que exige o direito à paz, à segurança, num país que na última década perdeu 553 mil vidas por mortes violentas – ou 153 pessoas por dia.
Por sua ineficácia, por conter elementos que uma vez mais atacam o Estado Democrático de Direito, a jornada dentro e fora do Parlamento para se contrapor a este pacote pode aglutinar amplos setores da sociedade, do mundo jurídico, do movimento de direitos humanos.
4 – Nova tática: união de amplas forças tendo a democracia como bandeira central
Para o PCdoB, a tática deve emanar da nova realidade imposta pelo resultado das eleições de 2018. Diante do vasto reagrupamento das forças reacionárias no país, a questão principal é a união de amplas forças políticas, sociais, econômicas e culturais, do campo democrático, patriótico e popular, para se opor ao governo Bolsonaro, impor derrotas e reveses à sua agenda. É no caminhar de uma ativa resistência nas ruas, no parlamento, na luta de ideias, que se reverterá as atuais adversidades, acumulando forças e descortinando perspectivas de vitórias vindouras.
Deve reger a constituição dessa frente a união de todas as forças possíveis de serem unidas, com o objetivo de isolar e derrotar o governo da extrema-direita. Essa é a tática geral da luta atual.
O objetivo estratégico de derrotar a hegemonia política dessas forças reacionárias e conquistar a hegemonia das forças democráticas, populares e progressistas, se encontra, diante dessa nova realidade, num horizonte distante. Dessa análise se conclui que o campo da nação e da classe trabalhadora se encontra num período de defensiva estratégica.
Essa nova tática tem como foco emergencial: a defesa da democracia ameaçada. Isto decorre das ameaças explícitas à liberdade política e às liberdades básicas, ao Estado democrático de direito, por ação de um governo com ímpeto saliente de autoritarismo e tendência fascistizante. O fato de o Estado democrático de direito ter sido mutilado por inúmeras violações abre caminho e expõe o país a um grave risco: a mudança do regime político democrático instituído pela Constituição de 1988.
Essa flexão que aponta a democracia como foco emergencial da tática não desdiz, nem colide, o Programa do PCdoB que concebe como vértice a questão nacional (soberania nacional) da luta por um novo projeto de nacional de desenvolvimento, relacionando-a com a causa democrática e o progresso social. Conjunturalmente, ganha centralidade a bandeira democrática, visto que as liberdades definem as circunstâncias e as condições nas quais se realizará a resistência.
Trata-se, então, de formar uma frente de perfil democrático marcante, de características antifascistas, podendo assim combinar uma relação de ação comum desde a esquerda, centro-esquerda, setores populares, personalidades liberais e do centro político. Exemplos da prática política recente demonstram a possibilidade desse tipo de convergência, como alianças no Nordeste nas eleições presidenciais de 2018, o arquivamento da proposta do execrável projeto que institui a Escola Sem Partido, e a aliança pela restauração do Estado Democrático de Direito.
A aplicação da tática geral para alcançar essa união ampla requer uma conduta política que escolha e direcione as lutas que sejam capazes de acumular forças, tendo em conta o quadro muito desfavorável ao campo progressista. Seria errado, portanto, num momento político com tais características, ter como centro a radicalização de posições; ao contrário, é preciso ter presente quais ações, quais combates, proporcionam a ampliação de forças.
Para ser efetivamente combativa, o pressuposto é ser uma tática ampla, flexível, capaz de reunir um leque vasto de forças e pô-las em movimento na ação oposicionista. A radicalização eficaz e consequente virá do grau dessa ampliação e de uma viragem na correlação de forças que seja favorável à oposição.
O papel da esquerda política e social
A esquerda se destaca como principal núcleo de oposição a Bolsonaro, e no curso da jornada oposicionista está chamada a desempenhar papel de destaque na construção da frente ampla. Todavia, a divisão que a debilitou na campanha eleitoral persiste. Ela está desafiada a construir sua convergência num quadro em que já não há uma força hegemônica em seu âmbito. Sua necessária unidade poderá ser construída dentro e fora do parlamento a partir de composições e formas distintas às do ciclo anterior.
Têm surgido diferenças e divergências entre os partidos de esquerda, como é comum quando emergem ciclos políticos novos. Exemplo disto se deu na eleição à presidência da Câmara dos Deputados. Para o PCdoB, tais discordâncias devem ser superadas pelo debate, pelo exame crítico e respeitoso das diferenças e sem que nenhuma legenda se arrogue detentora do monopólio da oposição. Iniciativas como o Observatório da Democracia, projeto conformado pelas Fundações do PT, PCdoB, PSB, PDT, PSOL, contribuem para a gestação de entendimento em outras esferas da vida política.
É falsa a contraposição entre “frente ampla” e “frente de esquerda”. Uma ampla e forte oposição necessita do protagonismo do povo, da classe trabalhadora, da mobilização das massas, da ascendente ação dos movimentos sociais e entidades classistas.
A pressão popular, a luta política nas ruas, será um elemento de grande relevância. Outra tarefa de grande importância é conseguir, a partir do diálogo, construir convergência com entidades de representação como OAB, setores da igreja católica e de outras religiões, juristas, acadêmicos, artistas, em torno da defesa da democracia, do Estado de direito e das conquistas históricas do nosso povo. A Frente Brasil Popular, a Frente Povo Sem Medo e o Fórum das Centrais sindicais, entre outras articulações, atuam no campo da frente ampla oposicionista com sua autonomia e bandeiras – buscando sempre, é claro, convergências que resultem em massivas mobilizações respaldadas por amplas forças. Sempre que amplas coalizões políticas e sociais ganharam as ruas, o Brasil e sua gente saíram vencedores.
Resistência, Amplitude e Sagacidade
Com amplitude, sagacidade e flexibilidade, o campo da oposição pode explorar as tensões e contradições de interesses e ideias que existem no governo Bolsonaro e na sua base de sustentação no Congresso Nacional e na sociedade. Na base de sustentação, há quem respalde integralmente a pauta da agenda ultraliberal e neocolonial, mas tem restrições ao crescente sufocamento do Estado Democrático de Direito pelo Estado de exceção. Neste cenário, manobras, alianças pontuais e passageiras podem ocorrer para explorar fissuras no campo adversário, como fator de reforço da jornada oposicionista.
A dinâmica da atuação da frente, por sua heterogeneidade e composição policlassista, rege-se pelo binômio unidade e luta; sobretudo agora, no seu nascedouro, se a ênfase for na luta, isto é, na exacerbação das divergências e na demarcação de posições, sua constituição terá enorme dificuldade. Essa disparidade de matizes das oposições – que abarca forças resolutas no enfrentamento ao governo, forças intermediárias e mesmo vacilantes – demanda coesão da esquerda e das forças populares para que a frente tenha uma direção política consequente, cumpra sua missão de isolar e impor derrotas ao governo.
As principais bandeiras
Para o PCdoB, a frente ampla se constituirá, no percurso das batalhas, em torno destas bandeiras: Defesa da democracia, da soberania nacional e do patrimônio público, dos direitos do povo e da classe trabalhadora. Como já destacado, a bandeira democrática ganha centralidade.
a) A defesa da democracia se materializa nas jornadas em defesa das liberdades, dos direitos civis e sociais contidos na Constituição; do Estado Democrático de Direito, contra o Estado de exceção; da autonomia das universidades, da existência da Justiça do Trabalho, seriamente ameaçadas; da liberdade de imprensa e de expressão, alvos de restrições, chantagens e ameaças. Além disso, se somam às batalhas para restabelecer o equilíbrio entres os Poderes da República, notadamente recompondo prerrogativas do Legislativo; contra a censura às manifestações artísticas; e o rechaço às ameaças autoritárias do presidente Bolsonaro no sentido de criminalizar, e mesmo banir, os partidos de esquerda e os movimentos sociais.
b) Defesa soberana do país e o patrimônio nacional. Ganham relevância as jornadas em defesa das empresas e dos bens estratégicos do país, em especial da Petrobras, do pré-sal e do regime de partilha, contra a entrega dessa riqueza às petroleiras estrangeiras; a oposição firme à política externa subserviente aos EUA; defesa dos princípios da diplomacia brasileira de respeito à soberania e à autodeterminação dos países, e não ingerência em assuntos internos; e busca de soluções pacíficas e negociadas para os conflitos.
c) A defesa dos direitos do povo e da classe trabalhadora. Com a política ultraliberal do ministro Paulo Guedes, os principais alvos serão saúde, educação, segurança, assistência social, direitos básicos, que seguirão sob ameaça de um processo crescente de cortes, de queda de qualidade e abrangência, em consequência do arrocho orçamentário advindo da Emenda do Teto do Gasto e outras medidas da chamada austeridade. Já foi anunciado que haverá um novo giro no corte dos direitos trabalhistas, inclusive aqueles assegurados pelo artigo 7º da Constituição (13º salário, FGTS, férias, repouso remunerado).
Defesa do direito à aposentadoria: grande batalha
A jornada contra a reforma da previdência, em andamento, apresenta-se como uma grande batalha em torno da concepção de Estado e da defesa dos direitos. Essa reforma está vinculada às imposições da Emenda do Teto do Gasto e encerra uma concepção de Estado nacional. Estado mínimo, fraco para impulsionar o desenvolvimento nacional e assegurar ao povo e aos trabalhadores os direitos conquistados em lutas ao longo dos últimos cem anos. E Estado “forte” para canalizar o grosso do Orçamento Federal para os rentistas, banqueiros e especuladores.
A defesa dos direitos dos trabalhadores, portanto, a uma aposentadoria justa e digna, se apresenta como a principal batalha a ser enfrentada neste primeiro semestre de governo. Ela será travada dentro do Congresso Nacional e ecoará nas demais Casas Legislativas, nas ruas com as mobilizações unitárias lideradas pelas centrais dos trabalhadores e trabalhadoras e pelo conjunto dos movimentos. É preciso desde agora engajamento e preparação para que se realize com êxito uma agenda de mobilização das centrais, com atos de rua, que se iniciam em 20 de fevereiro. Intensa luta de ideias deverá ser empreendida em todos os espaços possíveis, sobretudo nas redes.
Lula Livre
As forças reacionárias para vencer as eleições tiveram que, arbitrariamente, prender o ex-presidente Lula com o objetivo de excluí-lo da disputa presidencial de 2018. Em decorrência dessa afronta ao Estado Democrático de Direito, na esfera democrática, destaca-se, entre as tarefas das forças progressistas, uma campanha nacional e internacional pela libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que sofre uma prisão arbitrária e injusta.
6 – Preparar o PCdoB para um novo ciclo político
A construção partidária requer a compreensão pulsante da realidade da sociedade brasileira, e de suas transformações e implicações na vida partidária. A questão está em colocar o PCdoB à altura dos desafios que o novo ciclo político nos exige, traçando novas linhas de acumulação, novos caminhos, a partir da atualização da tática.
Construir o partido em conjunto com a resistência
A situação concreta exige resistência, amplitude e sagacidade, e, apesar dos ataques à esquerda, é possível crescer na luta pela democracia. Desse modo, tem lugar a necessidade de compactar a ação da direção partidária e promover a atuação das diferentes frentes em sincronia e com foco no planejado coletivamente.
Essa nova realidade exige um partido forte, coeso e influente nos parlamentos, nos movimentos sociais, nas lutas das mulheres, dos trabalhadores e da juventude. E, ainda, protagonizando o debate de ideias na sociedade, com condições de cumprir seu papel aglutinador das forças democráticas.
Além das formas tradicionais de mobilização, o uso adequado das novas tecnologias de comunicação e informação pode contribuir para fortalecer a organização partidária e a propaganda das nossas ideias, em diálogo direto com a sociedade, para mobilização e engajamento de filiados, militantes, simpatizantes, amigos e eleitores.
Fortalecer as direções partidárias
Na luta político-ideológica, é preciso persistir no desenvolvimento da teoria de Partido e na atualização da política de estruturação partidária. É estratégico o papel das direções partidárias em todos os níveis, com funcionamento regular e dinamismo para dar respostas aos desafios apresentados por essa nova realidade, além de serem o polo organizador de toda a nossa ação. É no âmbito das direções que o binômio ação política/estruturação partidária, alicerçado na ação planejada, ganha existência efetiva e, por isso, assume importância estratégica.
Só assim poderemos unir forças para alcançar êxitos políticos e eleitorais nas eleições municipais de 2020, preparando desde já os comitês municipais para esta batalha – a antessala de 2022 –, atraindo quadros políticos, lideranças do povo, trabalhadores, mobilizando militantes e filiados para enfrentar os desafios presentes.
A luta pela superação da cláusula de barreira e a incorporação do PPL
A adoção em 2016 da cláusula de barreira, um instrumento autoritário que cerceia a liberdade organizativa dos partidos políticos, constituiu importante obstáculo para a vida democrática. O não cumprimento desta cláusula pelo PCdoB, na eleição de 2018, representou um revés importante sobre o qual a direção nacional buscou atuar de forma efetiva.
Como resultado deste esforço, o PCdoB e o PPL desencadearam um elevado diálogo político programático, buscando uma solução política e jurídica para atender às exigências, na forma da lei, de superação da cláusula de desempenho e assim criar as condições para que sigam desempenhando um papel relevante na resistência democrática e na busca de soluções de fundo para que o Brasil se torne uma nação próspera, democrática, soberana e socialista.
Desse diálogo frutífero, veio a convicção de que as duas legendas possuem afinidades e convergências programáticas e, em face ao presidente eleito da extrema-direita, têm o entendimento comum: a visão tática confluente de que é preciso agregar um leque amplo de forças para empreender a resistência e a oposição democrática, anunciando assim a unificação do PCdoB e PPL.
Com a realização do nosso congresso extraordinário, novas tarefas surgiram no trabalho cotidiano das comissões de enlace, nos níveis nacional, estadual e municipal. A unidade entre PPL e PCdoB resultará no reforço ao enfrentamento das medidas autoritárias, antidemocráticas e de lesa-pátria em curso. De igual modo, reforça o papel das forças revolucionárias e patrióticas que lutam no Brasil por uma Pátria Livre, Democrática e Socialista.
Caminhamos para o Centenário do PCdoB, e as diretrizes aprovadas no 14º Congresso abordam com abrangência e atualidade as diferentes frentes da estruturação partidária.
A jornada da oposição se fortalecerá crescentemente
O Partido Comunista do Brasil, legenda quase centenária, desde a República Velha em conjunto com as demais forças progressistas do país, lutou contra todos os governos e regimes autoritários e tiranos que infestaram a história da República. Com base nessa experiência, transmite ao povo brasileiro a certeza e a confiança de que, apesar das graves ameaças que pairam sobre o país, não será fácil a Bolsonaro realizar a obsessão de sepultar a democracia brasileira. Ela deitou raízes profundas no solo pátrio, custou à nação muitas lutas e vidas.
A resistência rumo a uma oposição vigorosa realiza seus primeiros passos, e tem potencial para se efetivar no âmbito de toda a vida política e social do país, a começar pelo Congresso Nacional e outras casas legislativas, se estendendo para os movimentos sociais, as organizações da classe trabalhadora, segmentos do empresariado, o universo acadêmico, a intelectualidade, os artistas, o mundo jurídico, setores religiosos, e inclusive os integrantes de instituições da República. Os governadores e os prefeitos do campo democrático terão importante papel nesta empreitada, tal como tem atuado o Prefeito de Aracaju, Edvaldo Nogueira e o Governador do Maranhão Flávio Dino.
O PCdoB está convicto que no curso das mobilizações e da resistência, uma maioria progressivamente se levantará para defender a democracia, os interesses do Brasil e os direitos do povo e da classe trabalhadora.
Brasília, 15 de fevereiro de 2019
Comissão Política Nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)
Do Portal PCdoB
Projeto de Resolução ao 15º Congresso do Partido Comunista do Brasil
O 15º Congresso ocorre no contexto das tendências das lutas de classes no âmbito nacional e internacional, e no das exigências das saídas para as graves crises em que está mergulhado o país. Ele deverá ensejar o revigoramento do PCdoB para superar os imensos desafios que se apresentam em relação à sua presença na vida institucional do país.
O Partido encaminha-se para celebrar seu centenário de lutas pela construção soberana do Brasil, reafirmando – e tendo em conta os desafios da contemporaneidade – seu compromisso com a classe trabalhadora e com o socialismo que tem por caminho a construção de um novo Projeto Nacional de Desenvolvimento. Ao mesmo tempo, empreende a necessária atualização e renovação de suas linhas de ação e construção partidárias, para que estejam de acordo com as exigências atuais das lutas de classes.
Ao longo de sua jornada, o Partido enfrentou as mais diversas situações. Longos períodos em que o autoritarismo, de governos conservadores ou de ditaduras, implicou a cassação de mandatos, prisões e perseguições de toda espécie e a resistência prolongada dos comunistas; e aqueles em que houve ascenso democrático e exercício das liberdades; embates ideológicos complexos, como aqueles travados à época da crise do socialismo e da ofensiva neoliberal na década de 1990; e, mais recentemente, na atuação institucional, como parte dos governos progressistas.
Em todos esses momentos, o Partido defendeu uma política de ampla união de forças em defesa da democracia, do povo e da nação, e procurou manter sólidos laços com a vida e a luta dos trabalhadores e das camadas populares. Disso derivam a força, o prestígio e a permanência do PCdoB.
Mais uma vez, o Brasil e seu povo vencerão, a democracia será fortalecida, os direitos dos trabalhadores e do povo serão crescentes. O PCdoB estará sempre nas primeiras fileiras desse combate, ao lado de todas as forças avançadas, para fazer do país uma grande nação, respeitada e querida pelo povo e em todo o mundo.
I – TRANSIÇÃO NA ORDEM MUNDIAL SE INTENSIFICA E ACELERA NA PANDEMIA
O 15° Congresso do Partido Comunista do Brasil realiza-se em meio à maior crise sanitária mundial do último século. A Covid-19, que varreu e abalou o mundo em 2020 e 2021, intensificou tanto as contradições do modo de produção capitalista dominante no planeta quanto a profunda transição em curso na ordem mundial neste século 21.
A principal característica da conturbada transição em curso são o declínio relativo da superpotência estadunidense e a emergência de novos polos de poder econômico, político, diplomático e militar, oriundos sobretudo da antiga semiperiferia e periferia do sistema internacional. O fenômeno mais representativo dessa tendência é o protagonismo da China socialista como potência, e a recuperação do poder nacional da Rússia. O quadro internacional é de agravamento e expansão das disputas, tensões e confrontações de responsabilidade dos EUA, que tentam de todas as maneiras impedir que outros países trilhem soberana e livremente o caminho da cooperação, da paz, do desenvolvimento econômico e do progresso social.
Diversos Estados estruturam projetos nacionais de desenvolvimento, buscando resguardar sua soberania e ampliar a margem de autonomia no novo contexto geopolítico mundial, marcado por emergente e crescente multipolaridade. Essa evolução abarca países com governos de orientação político-ideológica muito diversa, como a própria Rússia, a África do Sul, a Índia, a Turquia, o Irã e até mesmo a Coreia do Sul (apesar da ocupação militar dos EUA).
Essa mudança na correlação de forças internacional decorre do desenvolvimento desigual das nações e cria um contexto mais favorável para a realização de projetos nacionais contra-hegemônicos, embora ainda persista o quadro de defensiva estratégica gerado pelo colapso do antigo campo socialista no final do século 20.
Lições para o enfrentamento da crise sanitária
A pandemia da Covid-19 gerou uma avalanche de mortes e sofrimento em todo o planeta. Mas a megacrise sanitária não atinge os países de forma homogênea. Aqueles que preservaram estruturas de planejamento e regulação estatal, diante da ofensiva de desmonte neoliberal das últimas décadas – notadamente os países socialistas, mas também países capitalistas como a Coreia do Sul e a insular Nova Zelândia –, conseguiram enfrentar com maior êxito a situação.
Ao longo da crise sanitária, a mortalidade causada pelo novo coronavírus, em proporção ao tamanho das suas populações, foi maior nos países da Europa, nos Estados Unidos, na Índia e na América Latina. Um contraponto fundamental a este balanço funesto é dado pelo desempenho dos países de orientação socialista. A China implementou um programa intenso e integrado que lhe permitiu conter a situação e retomar a normalidade das atividades econômicas em curto espaço de tempo. Desenvolveu quatro vacinas próprias, disponibilizando quase 600 milhões de doses para outros países, em muitos deles gratuitamente. As mesmas trajetória e solidariedade foram trilhadas por outros países socialistas, como Cuba e Vietnã.
A ortodoxia neoliberal é incapaz de responder aos desafios do mundo
A partir de março de 2020, a pandemia fez desabar uma economia que mal havia conseguido se recuperar da crise deflagrada em 2007-2008 que, por sua vez, foi o desdobramento de uma crise mais geral, de longa duração, de natureza estrutural do capitalismo. A economia dos EUA cresceu de 2010 a 2019 à razão de 2% ao ano, a do Japão a 1,5% e a da Europa a 1%. Desde 1991, até 2019, último ano antes da instalação da crise sanitária, a participação dos Estados Unidos e dos países da Europa Ocidental no PIB mundial, medido por Paridade de Poder de Compra, já havia encolhido de 41,6% para 28,9%, enquanto a participação da China e da Índia passou de 6,6% para 27,3%.
Em 2020, enquanto os PIBs da China e do Vietnã tiveram crescimento de 2,3% e 2,4%, respectivamente, com a chegada da pandemia, a economia mundial caiu 3,3%, a dos Estados Unidos teve retração de 3.5%, a do Brasil 4,1%, a dos países da zona do Euro 6,6% e a do Reino Unido 9,9%. Essa mesma dinâmica desigual se expressa em 2021. De maneira geral, os países em desenvolvimento da Ásia foram os menos afetados pela crise, em 2020, e os que sustentam os índices mais elevados de recuperação econômica em 2021.
Depois de posturas negacionistas iniciais de dirigentes como Donald Trump, nos Estados Unidos, e Boris Johnson, no Reino Unido, os países capitalistas centrais abandonaram a ortodoxia neoliberal frente à crise sanitária com amplos programas de financiamento e investimento estatal. Um levantamento do Bank of America revela que, para conter a crise, 97 países selecionados injetaram na economia nada menos de US $25 trilhões (29% do PIB global). Esses governos têm recorrido igualmente à emissão de moeda para financiar o esforço fiscal e monetário. Isso não conseguiu reverter, contudo, pelo menos em curto prazo, as consequências de décadas de desmonte e/ou enfraquecimento dos sistemas de saúde pública e de proteção social nesses países.
Assim, o retorno do Estado, e, com ele, do investimento público como força propulsora da economia – como ocorrera na Grande Depressão e particularmente no segundo pós-guerra –, é um dos desenvolvimentos mais importantes ocorridos devido à pandemia; que pode ou não se transformar em tendência, a depender do andamento da crise e da correlação de forças que venha a se estabelecer como resultado dela.
O declínio relativo dos EUA e a ascensão da China constituem a principal tendência da geopolítica contemporânea
Os impactos multifacetados da pandemia agravam as principais contradições da evolução internacional. Ela acentua e intensifica a dinâmica de desenvolvimento desigual que vem minando as bases da hegemonia dos Estados Unidos, no sistema internacional, e das configurações multilaterais que as materializam. Neste âmbito, os variados movimentos nacionais de questionamento e resistência às assimetrias impostas por essa forma de dominação imperialista decadente têm centralidade na evolução internacional, mesmo que sem assumirem uma retórica ou orientação abertamente “anti-imperialista”.
A crescente disputa entre os Estados Unidos e a China configura a principal tensão geopolítica no mundo, em acelerado agravamento. O objetivo estratégico central dos Estados Unidos é conter a todo custo a China e recompor o dinamismo da sua economia para reverter o declínio relativo da sua hegemonia no sistema internacional. O novo governo Biden deflagra intensa campanha midiática, diplomática e militar contra aquele país, tentando responder ao que os EUA consideram ameaças ao seu papel de potência hegemônica: enfrentar a ascensão chinesa, conter militarmente a Rússia e fazer frente à aliança Sino-Russa.
O vértice da disputa entre EUA e China se expandiu para a fronteira da Revolução Científica e Tecnológica mundial (incluindo a tecnologia 5G), enquanto a Rússia enfrenta um cerco militar cada vez mais hostil com a expansão da OTAN para a Europa Central e do Leste e as tentativas de desestabilizar o seu entorno estratégico. O plano do governo dos EUA, acordado com o G7, é lançar o projeto Build Back Better – B3 (“Reconstruir melhor”) para se contrapor ao projeto de cooperação em infraestrutura Iniciativa do Cinturão e Rota que a China estabeleceu com uma centena de países do mundo.
O governo Biden se movimenta, também, para recompor as relações com os aliados tradicionais do G7 e sua liderança nas instituições multilaterais, ao mesmo tempo em que anuncia pacotes trilionários de investimento público em infraestrutura, transição energética, desenvolvimento industrial tecnológico e inovação. Desfaz-se da política de escalada protecionista e distanciamento da “Aliança Atlântica” de Trump. Contudo, o faz a partir de uma posição de poder relativo mais débil no mundo. É crescente a disposição dos países da União Europeia de buscar maior autonomia em relação aos EUA, como na adoção de um acordo de investimentos e da implantação da tecnologia 5G com a China, e do gasoduto Nord Stream 2 entre a Rússia e a Alemanha.
Os EUA mantêm seu caráter imperialista como política de Estado, instrumentalizando os variados recursos de poder de que dispõe para tentar barrar uma nova ordem multipolar. Sua natureza agressiva se expressa através das chamadas guerras híbridas, em que se incluem sanções e outras medidas coercitivas unilaterais, também através do cerco diplomático e midiático e de tentativas de golpes, da intervenção ou da guerra direta. Violam os mais básicos princípios do humanismo, das relações internacionais e do direito dos povos e nações à autodeterminação. A recente cúpula da OTAN é também a demonstração do caráter belicista do imperialismo.
Os países socialistas – destacadamente a China – desempenham papel central nessa nova realidade geopolítica. Estruturam projetos nacionais de desenvolvimento, de orientação socialista, no âmbito da própria economia capitalista mundial. Não se apresentam, contudo, estruturando um sistema mundial socialista alternativo ao capitalismo. Suas trajetórias nacionais comprovam, no entanto, a viabilidade de projetos socialistas renovados e de sua maior capacidade de combinar desenvolvimento econômico soberano com erradicação da pobreza e da miséria, expansão de direitos sociais e proteção da vida e do bem-estar do povo.
A forma de inserção internacional adotada pelos países socialistas, nas primeiras décadas do século 21, evidencia que o movimento operário, os movimentos populares e as forças progressistas, revolucionárias e de esquerda ainda enfrentam um período de defensiva estratégica no mundo. Neste quadro, a centralidade das tarefas nacionais e democráticas necessariamente se impõe na construção de alternativas estratégicas contra-hegemônicas e anti-imperialistas em países da América Latina e do Caribe, da África, do Oriente Médio, da Ásia e da Oceania.
Cresce a contestação dos trabalhadores, povos e nações
O pano de fundo dos desenvolvimentos e tensões do mundo em transição é o agravamento das contradições inerentes ao modo de produção capitalista dominante: a brutal concentração da riqueza nas mãos de poucos, a multiplicação da miséria, a extrema exploração dos trabalhadores, a precarização das condições de trabalho e de vida, a concentração monopolista, o predomínio do parasitismo financeiro, a destruição de forças produtivas, o desemprego em massa e a degradação ambiental.
A redução do custo da força de trabalho é a arma do grande capital para enfrentar a crise capitalista e ampliar seus lucros. Em quase todos os países, os governos neoliberais aprovam contrarreformas trabalhistas e previdenciárias e promovem medidas antissindicais, para avançar na precarização do trabalho e enfraquecer a resistência dos trabalhadores. As aceleradas mudanças tecnológicas e seu uso intensivo, em benefício exclusivo do capital, criam fenômenos novos, como a individualização das relações no trabalho – nova modalidade de trabalho não regulado, a “uberização” – com jornadas maiores, salários menores e cortes de direitos. No entanto, mesmo com dificuldades e as particularidades em cada país, persistem a denúncia e a resistência para a recuperação dos direitos e também a luta para desenvolver a consciência classista dos trabalhadores.
Os crescentes desespero e desesperança com a dura realidade do capitalismo “liberal” alimentaram, em escala global, uma onda política antissistema, antidemocrática, de extrema-direita de cunho fascista. A derrota eleitoral de Trump nos Estados Unidos ajudou a desarticular o polo aglutinador dessas forças que, hoje, têm o presidente Bolsonaro, ainda que isolado internacionalmente, como um de seus maiores bastiões. Na Europa preocupa o espaço político alcançado por partidos de extrema-direita e protofascistas como o Vox da Espanha, o Chega em Portugal, AfD na Alemanha e os governos consolidados da Hungria e da Polônia, entre outros.
As lutas populares na América Latina e as tarefas internacionalistas
A eleição de Biden não altera a política dos EUA para a América Latina. Contudo, os povos da região resistem e impõem derrotas à contraofensiva imperialista. Ocorrem vitórias importantes com a mobilização popular e nas urnas eleitorais. A eleição de Luis Arce, na Bolívia; a liderança de Alberto Fernandez, na Argentina; a eleição de uma nova Assembleia Constituinte, no Chile; a vitória do professor Pedro Castillo, no Peru, são todos sinais de crescimento das forças progressistas e de esquerda. O Partido expressa sua solidariedade às lutas do povo de toda a América Latina. Em especial, manifesta solidariedade à República Bolivariana da Venezuela e congratulações ao PC de Cuba pela realização do seu 8º Congresso, saudando sua resistência e imensa solidariedade internacionalista.
O internacionalismo é parte constitutiva da identidade dos comunistas. A luta pela paz mundial e pela solidariedade aos povos em luta ao redor do mundo é uma exigência de nosso tempo. Neste sentido, o PCdoB conclama as forças progressistas a reforçarem a atividade do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz) como um instrumento da luta internacionalista de massas. Proclama seu firme apoio ao povo palestino por seu direito a um Estado livre e soberano. Reafirma seu compromisso com o Encontro Internacional dos Partidos Comunistas e Operários (EIPCO), fórum importante para o intercâmbio de análises e desafios das lutas de classes. Igualmente, reafirma o compromisso com a construção e fortalecimento do Foro São Paulo, importante plataforma para a construção de convergências políticas frente ao imperialismo e ao neoliberalismo na região.
O tempo presente e futuro clama pelo socialismo
Na perspectiva de um mundo em transição, novos horizontes de avanços táticos poderão se abrir para os povos. A luta pela constituição de alternativas é a questão nodal do nosso tempo. Cabe às forças progressistas, revolucionárias e de esquerda saber aproveitar esse contexto para deflagrarem um novo ciclo político de avanços democráticos, pela soberania nacional e progresso social. O desenvolvimento do socialismo com particularidades chinesas, que impressiona o mundo, junto a outros países socialistas, com seus partidos comunistas no poder de Estado, demonstra que há, sim, alternativas à classe trabalhadora e às nações contra o neoliberalismo e o imperialismo. É nesse ciclo que se situa a nova luta pelo socialismo hoje no mundo.
II – ISOLAR E DERROTAR BOLSONARO – A QUESTÃO PREMENTE PARA SALVAR O PAÍS
O governo Bolsonaro aprofundou uma crise de múltiplas faces no país: política, sanitária, econômica, social, da infraestrutura, ambiental, elétrica e educacional. O caráter autoritário de seu projeto de poder procura levar as instituições ao impasse, buscando corroer o ambiente democrático, dando sinais de que procurará de todos os modos se agarrar ao poder.
O resultado geral desse governo, transcorrido mais da metade do mandato, é um desastre. É grave a regressão do Brasil enquanto país soberano e democrático. O sofrimento do povo é enorme. Os direitos sociais e trabalhistas são crescentemente eliminados. As mulheres são fortemente atingidas por essa maré reacionária, com corte de direitos e aumento da violência, em especial contra as mulheres negras. O Estado nacional, posto a serviço do capital especulativo e do rentismo, sofre processo de desmonte e se torna disfuncional para a democracia e ao papel de alavanca do desenvolvimento soberano e do progresso social. O patrimônio nacional está sendo dilapidado.
A crise sanitária adquiriu a envergadura de catástrofe nacional
Além de o país ter ultrapassado a dolorosa marca de meio milhão de mortes, a Covid-19 prossegue grave no país, com patamar alto de transmissibilidade do vírus, e de mortes, e com a rede hospitalar sobrecarregada. A vacinação segue lenta. A Nação paga alto preço também pela postura de Bolsonaro de sabotar o enfrentamento do distanciamento social para, supostamente, proteger a economia. A resultante é devastadora, levando o Brasil a uma taxa de mortalidade situada entre as maiores dos países do Ocidente.
Como vem comprovando a CPI do Senado, respaldada por amplo apoio popular, essa tragédia é resultado da conduta criminosa e irresponsável do presidente. O governo brasileiro se omitiu de socorrer as pessoas, revelou a mais absoluta negação da ciência, estabeleceu uma guerra cultural através de potente comunicação, levou as pessoas ao encontro do vírus sem as devidas medidas sanitárias, promovendo o falso sentimento de proteção, com propaganda mentirosa da eficácia de medicamentos. O estratégico complexo econômico industrial da saúde, para a produção nacional e integrada de vacinas, foi vitimado com o corte de investimentos em ciência e inovação. A cada depoimento, novos indícios de que, por razões de cálculo político, foi sabotada uma estratégia nacional integrada, com bases científicas e em defesa da vida, para o combate ao SARS-CoV-2, ao custo de milhares de vidas. São muitos os crimes sanitários e contra a vida.
A política econômica de Bolsonaro e Guedes aprofundou as desigualdades
A política ultraliberal e neocolonial, da dupla Bolsonaro-Guedes, aprofunda a desnacionalização da economia e a desindustrialização e agrava a exclusão e as desigualdades sociais. Agrava as desigualdades e de gênero, penalizando enormemente a população negra e as etnias indígenas. As reformas liberais promoveram a elevação da taxa de lucros e da exploração do trabalho. No sistema financeiro, os dois maiores bancos privados elevam os lucros em 74% e 64% em um ano. Cresceu o número de bilionários justamente aqui, onde há a segunda maior concentração de renda entre mais de 180 países. Enquanto isso, são mais de 800 mil empresas quebradas e o desemprego é recorde, com 14,8 milhões de pessoas sem trabalho.
Cai a renda do trabalho e a inflação em alta atinge sobretudo o povo, com a carestia dos alimentos, aluguéis, transportes, energia elétrica, gás e combustíveis. A tragédia social está estampada nas ruas, com milhares de pessoas e famílias ao relento. Mais da metade da nação – 116,8 milhões de pessoas – vive em insegurança alimentar e 19 milhões estão passando fome. A Amazônia e outros biomas estão expostos à devastação criminosa, os povos indígenas sofrem ataques de bandos armados, o governo opera o desmonte da legislação ambiental e dos órgãos de fiscalização e o ministro do Meio Ambiente caiu, acusado de corrupção. O Brasil se isola internacionalmente e adota uma política externa de país pária. As áreas da educação, da cultura, da C&T e as instituições de fomento e Institutos de Pesquisa e Desenvolvimento sofrem com o processo de desarticulação e estrangulamento financeiro. Mesmo assim, demonstrando a qualidade alcançada, desenvolveram rapidamente processos de sequenciamento genético precoce do novo coronavírus, garantindo as condições básicas para obtenção das vacinas nacionais, algumas destas iniciativas sem incluir qualquer importação de tecnologia.
Sob crescente isolamento, Bolsonaro manobra em busca de se manter no poder
Desde o início do ano, o isolamento de Bolsonaro se manifesta no afastamento de parcelas das classes dominantes de sua base de apoio, e também de camadas médias; e igualmente na crise que provocou com a cúpula das Forças Armadas.
Todavia, Bolsonaro reage. O Centrão rende-lhe, no momento, base de apoio no Congresso Nacional, embora volátil e pragmática. Faz sinalizações aos banqueiros, rentistas e grandes grupos econômicos, aumentando a taxa básica de juros, garroteando o Orçamento Federal nas áreas dos direitos sociais e estratégicos do desenvolvimento para assegurar os fabulosos lucros do capital financeiro e realizar privatizações. Em meio a uma crise da produção de energia elétrica, Bolsonaro impõe a privatização da Eletrobrás que, além de ser um crime de lesa-pátria, vai onerar o preço das tarifas; instituiu a chamada independência do Banco Central; e deu início à nefasta reforma administrativa, que debilita o Estado e cortará direitos.
Na esfera econômica, joga com crescimento puxado, sobretudo pela elevação temporária dos preços da exportação de commodities que, devido à forte demanda internacional, tem até aqui participação diminuta da indústria e dos serviços. Desde o anúncio do crescimento de 1,2% do PIB no primeiro trimestre, em grande medida efeito estatístico face à queda de 2020, o governo passou a propagandear a narrativa de um “país das maravilhas” quando, na verdade, o Brasil ficou em 19º lugar, no ranking de 50 países, na retomada do PIB.
Dobra a aposta no discurso negacionista e golpista e com ele convoca às ruas os segmentos mais reacionários de sua base. Construiu uma teia orgânica de apoio nas polícias e robusteceu as milícias, com portarias que liberaram a compra e a circulação de armas. Louva a barbárie, naturaliza e estimula a violência. Conta com a leniência que grassa em segmentos das Forças Armadas, decorrente do vínculo com as ideias e os compromissos do projeto que as levaram a apoiar a eleição de Bolsonaro. Mantém o aparato criminoso de fake news por meio do “gabinete do ódio”. Sustenta guerras culturais para impor à sociedade verdadeira regressão civilizacional com ideias e práticas reacionárias. É parte do modus operandi a política de intimidação aos oponentes, seja por meio de aparatos do Estado, como a Polícia Federal (PF), Procuradoria Geral da República (PGR), a Advocacia Geral da União (AGU), seja usando entulhos autoritários da época da ditadura militar, como a Lei de Segurança Nacional (LSN), ou ainda, por meio das milícias digitais. Exemplo recente disto têm sido as constantes agressões sofridas por Manuela d’Ávila, que chocaram o país e despertaram amplo movimento de solidariedade #Força Manu e pede #Punição aos criminosos.
Conter e repelir a escalada golpista de bolsonarista
Bolsonaro persiste em sua contínua escalada contra as instituições e normas democráticas e, diante disso, são reais as ameaças de ruptura do regime democrático, que segue sendo seu plano estratégico. Os sinais para isso são crescentes. Nesse sentido, decisões do STF têm sido importantes para repelir as transgressões do presidente. O PCdoB, por iniciativa própria ou em conjunto com outras legendas, tem impetrado ações, várias exitosas, em defesa tanto do Estado Democrático de Direito quanto da vida.
Eleva a pressão sobre as instituições e Poderes da República levando-os a desconfigurações, divisões e impasses com o objetivo de submetê-los ao projeto autoritário de poder. Contesta o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com discurso em torno de fraude nas urnas, supostamente ocorrida em 2018, propugnando mudança no sistema de votação eletrônica, disposto a tumultuar as eleições de 2022 com acusações de fraude se não vier a ser vitorioso. É crescente, também, a investida de Bolsonaro sobre as Forças Armadas visando a subjugá-las, como ficou patente no episódio que resultou no grave erro de não se punir o ex-ministro da Saúde, general Pazuello, o que insufla a indisciplina e a quebra de hierarquia. Importantes líderes da reserva do Exército fizeram forte libelo contra Bolsonaro.
Em síntese, hoje cresce o isolamento do presidente, mas ele dispõe de bases de apoio e margem de manobra. E ainda mantém força, segundo as pesquisas, para as eleições de 2022. Seria grave erro subestimar sua estratégia autoritária de se manter no poder a qualquer custo. A reeleição de Bolsonaro representaria ameaça ainda mais destruidora contra a democracia e a nação. Impõe-se a união de amplas forças, de todos e todas que defendem a vida e a democracia, para barrar a estratégia autoritária de Bolsonaro e desmascará-lo, isolá-lo e derrotá-lo para abrir caminho à reconstrução nacional.
Os polos dinâmicos das oposições
Vai se robustecendo a luta das oposições. Elas se apresentam com três importantes articulações. Uma liderada pelo ex-presidente Lula que, tendo recuperado os direitos políticos por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), cresce nas pesquisas e articula sua possível candidatura com amplo leque de apoio. O retorno de Lula tem forte impacto positivo, muito apoio popular e fortalece a luta oposicionista.
Ciro Gomes, do PDT, prossegue como liderança destacada do campo progressista no tabuleiro da sucessão presidencial. É positiva também a movimentação do denominado Centro na construção de convergência para candidatura presidencial desse espectro. Abarca lideranças da direita, centro-direita e centro que se opõem, ou têm contradições, a Bolsonaro, como os governadores tucanos João Doria, Eduardo Leite, o senador Tasso Jereissati e o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta.
Cresce a consciência da necessidade de ampla frente democrática
Ganha influência entre as oposições a tática da frente ampla democrática defendida pelo PCdoB. O campo político democrático e progressista acumula forças e empreende a transição para superar a fase de defensiva tática. A esquerda ganha dinamismo e protagonismo político. Entre os movimentos, têm papel destacado as ações democráticas de instituições de Estado e da sociedade civil; e o Fórum de Governadores continua tendo grande relevância na resistência.
Desse acúmulo, fruto da resistência democrática e popular, vai despontando novo ambiente político, marcado por iniciativas democráticas e pelo crescimento do antibolsonarismo. A esperança do povo desperta. Vai sendo criada a possibilidade real de as oposições vencerem as eleições de 2022, derrotando e expelindo Bolsonaro do governo, único meio de livrar o país do pesadelo em que se encontra.
Mobilização do povo, vertente impulsionadora das lutas
A mobilização do povo e da classe trabalhadora, que sofreu duro refluxo devido aos impactos do distanciamento social face à Covid-19, volta a irromper no cenário político, como vertente impulsionadora e decisiva dos movimentos em defesa da Vida e da Democracia e contra Bolsonaro. A jornada vem em uma crescente, desde o 8 de Março, passando por um 1º de Maio Unitário, de largo espectro democrático, organizado pelo Fórum das Centrais Sindicais, e chegando às grandes mobilizações de 29 de maio e de 19 de junho convocadas por frentes de movimento sociais. Respeitando as normas sanitárias do país, elas marcaram a retomada do povo nas ruas, tendo como palavras de ordem unificadoras a defesa da vida, da democracia, da vacina, da educação, do emprego, do auxílio emergencial, da saúde e Fora, Bolsonaro. A militância do PCdoB inserida nestes movimentos está na linha de frente dessas mobilizações e deverá reforçar ainda mais seu engajamento. Destaca-se o processo que se afunila de unificação da CTB e da CGTB, que fortalecerá o protagonismo do sindicalismo unitário e de luta.
Destacam-se, na retomada da batalha das ruas, as mobilizações da juventude estudantil lideradas pela UNE, pela UBES e pela ANPG, com o apoio da União da Juventude Socialista (UJS) e da Juventude Pátria Livre (JPL), por “Vida, pão, vacina e educação”, respeitando as normas sanitárias. Cumprem, também, papel destacado as frentes de movimentos. A CONAM empreende jornada em prol dos direitos das comunidades, ressaltando a batalha pelo despejo zero e a luta por moradia. Diante do aumento da violência contra a população negra, cresce a luta antirracista da qual a UNEGRO participa com destaque. A pandemia agrava a sobrecarga de trabalho, as discriminações, a violência contra as mulheres. As entidades feministas UBM e CMB batalham pelo aumento da renda e por políticas governamentais que promovam oportunidades de emprego e renda para a autonomia econômica das mulheres, reforçam suas agendas de luta e denúncia e realizam ações de solidariedade às mulheres brasileiras, sobretudo das camadas populares. Com a liderança da Bancada Feminina na Câmara, entidades e partidos políticos, através das Secretarias de Mulheres, unem-se para avançar nas conquistas de mais espaços no Parlamento. Reforçam o movimento pela reserva de cadeiras para mulheres, como forma de enfrentar a sub-representação feminina, que perdura historicamente no Brasil e nos coloca na vergonhosa 142ª posição dentre 199 países. As mulheres – que já têm um forte protagonismo na sociedade brasileira, chefiam 43% das famílias, são mais de 40% da força de trabalho ativa, mais da metade da população e do eleitorado – precisam ocupar efetivamente os espaços de poder. A homofobia recrudesce e exige reforço das lutas em defesa da população LGBTQi+, contra a violência e discriminações, pelos direitos, na qual está inserida a União Nacional LGBT.
Frente ampla: caminho à vitória das oposições
O PCdoB sublinha uma vez mais a convicção de que é a tática de frente ampla democrática, respaldada pela mobilização política do povo, a orientação e a conduta política eficazes para se enfrentar, desmascarar, derrotar Bolsonaro, bem como conter e repelir o persistente estratagema golpista para liquidar o regime democrático. As bandeiras capazes de unir e pôr em movimento grandes forças políticas, sociais, econômicas, culturais e institucionais são: enfrentamento à Covid-19; defesa da vida, com vacina para todos e todas, distanciamento social, respeito às demais normas sanitárias; fortalecimento do SUS e da pesquisa científica ligada ao combate ao SARS-CoV-2; auxílio emergencial de R$ 600 e combate à fome; luta pela proteção e geração de empregos; socorro a micro, pequenas e médias empresas; e defesa da democracia, rechaço ao golpismo de Bolsonaro.
As forças democráticas e progressistas, os movimentos e entidades do povo e dos/as trabalhadores/as precisam continuar apoiando e pressionando a CPI para que vá até as últimas consequências nas investigações e responsabilização de Bolsonaro e seus auxiliares. As mobilizações populares fortalecem seu trabalho e, juntas, ampliam e avolumam a pressão pelo impeachment do presidente. Com os novos fatos já apontados na CPI, um novo pedido de amplas forças políticas partidárias foi preparado, com participação do PCdoB.
Brasil está diante de grande disjuntiva na disputa de 2022
Todas as forças políticas e sociais oposicionistas democráticas precisam elevar a unidade de ação a patamar superior. O confronto dos movimentos das forças democráticas contra o presidente genocida e neofascista resulta numa dinâmica político-institucional instável e de um futuro de razoável imprevisibilidade. Repõe-se a noção de encruzilhada histórica na vida nacional.
Ao mesmo tempo em que valoriza todas as iniciativas e os esforços para barrar o golpismo, derrotar Bolsonaro nas eleições e retomar o caminho do desenvolvimento nacional e da democracia, em amplo diálogo com todas as candidaturas democráticas que se oponham ao bolsonarismo, o PCdoB julga necessário construir a unidade de forças progressistas em torno dos caminhos das saídas para a crise nacional. Realizará esse esforço com todas elas, considerando importante que se apresente expectativa de vitória em 2022 para dar outro rumo à nação e esperanças ao povo.
O PCdoB incorporará, ao Projeto de Resolução do 15º Congresso, Diretrizes para uma Plataforma Emergencial de Reconstrução Nacional, como base para tal unidade face à crise do país, por meio de convergências progressivas. Um novo governo, sustentado por amplas forças, terá o desafio da Reconstrução Nacional, por meio do resgate do Estado Nacional democrático, da recuperação da economia nacional, da valorização do trabalho, empregos e renda, de reformas sociais para o bem-estar do povo, da defesa do meio ambiente em função da soberania e desenvolvimento do país, e da retomada da política externa altiva e independente para reforçar as alianças estratégicas do Brasil no mundo. Essas são condições iniciais para se implementar um novo projeto nacional de desenvolvimento, soberano, democrático e a serviço dos interesses populares.
III – O dilema das restrições democráticas para o papel institucional do PCdoB
A Constituição Federal de 1988 consagrou o pluralismo partidário no Brasil. Tal conquista democrática ainda não logrou ampliar devidamente a representação política institucional dos trabalhadores, mulheres, negros e outros setores oprimidos, embora socialmente majoritários. Jamais cessaram as pressões dos setores conservadores para restringir e elitizar o sistema eleitoral e partidário. Isso se somou, nos anos mais recentes, à criminosa ofensiva conservadora da extrema-direita no poder, recrudescendo o anticomunismo, que atinge a toda a esquerda, em especial o PCdoB.
A legislação eleitoral restritiva e casuística confronta forças políticas estruturadas com base em programa e ideário bem definidos, cuja presença dignifica o sistema político-partidário no Brasil. A Cláusula de Desempenho, mais a proibição de alianças eleitorais em eleições proporcionais – esta, especificamente, atentatória à autonomia partidária para estabelecer alianças –, são as mais recentes iniciativas que se voltam contra o pluripartidarismo democrático. Visam a eliminar a representação institucional dessas legendas do cenário político do país.
É preciso aperfeiçoar o sistema político-partidário com reformas política e eleitoral de caráter democrático, levando em conta as características próprias do Brasil. Neste momento, como passo primário, impõe-se flexibilizar a legislação e permitir a união de legendas como frente eleitoral, com os direitos e deveres dos partidos políticos e caráter programático definido e duradouro, assegurando a manutenção do registro das legendas integrantes com sua autonomia organizativa e identidade.
Na formação histórica do Brasil, as amplas frentes políticas e sociais unitárias foram determinantes para a nação alcançar novos patamares civilizatórios. A atuação em frentes, sejam elas políticas, sejam elas eleitorais ou na luta social, é parte constitutiva da identidade dos comunistas, de sua estratégia e tática.
Superar grandes obstáculos na luta democrática tem sido marca indelével da luta do PCdoB, sob condições de anticomunismo agressivo e obscurantista e em meio a prolongados períodos de ditadura. Entretanto, o Partido sempre sobrepujou tais situações e mantém atividade ininterrupta como o mais antigo partido do país. A centenária legenda tem sido, assim, um marco vivo na história política e institucional no país, com contribuições importantes na construção dos avanços democráticos, nas conquistas civilizacionais com a defesa dos interesses do Brasil e do povo.
O PCdoB lutará decididamente para superar as atuais restrições democráticas e assegurar sua representação institucional. Para tanto, quer contar com o apoio e a cooperação de todos os democratas e progressistas do país. O PCdoB é indispensável à democracia no Brasil, e a vitória de um projeto democrático para o país em 2022 precisa dos comunistas com plena representação institucional no espectro partidário brasileiro.
A construção de saídas pautará a dinâmica do processo congressual do 15° Congresso, com espírito de soluções coletivas, coesão e urgência. A direção nacional formulou, em meio a debates feitos com abertura, unidade, espírito combativo e respeito às diferenças de opiniões, um consenso majoritário em torno de três premissas constituintes:
a) A ação prioritária em torno da aprovação do Projeto de Lei da Criação das Federações Partidárias, a partir de um intenso e amplo movimento político no Congresso Nacional.
b) A compreensão de que a superação dos desafios para o papel institucional do PCdoB passa pelas saídas à crise brasileira, unindo amplas forças para derrotar a extrema-direita e para a construção de caminhos que favoreçam seus objetivos eleitorais, em torno de uma Plataforma Emergencial de Reconstrução Nacional soberana e democrática.
c) Construir o projeto eleitoral de 2022 desde já, com a formação de chapas próprias a deputados, perseguindo a filiação de novas lideranças sociais e políticas, para o desafio da superação da cláusula de desempenho.
A combativa bancada do PCdoB na Câmara dos Deputados, liderada pelo deputado Renildo Calheiros, em democrático e intenso diálogo com praticamente todas as legendas presentes no Congresso Nacional, busca construir uma maioria que aprove as Federações partidárias. Esgotado esse esforço, o PCdoB procurará alternativas políticas e legislativas de frentes políticas nas quais possa assegurar sua atuação institucional no país, tendo como pressuposto a preservação da continuidade histórica, identidade e autonomia do Partido Comunista do Brasil.
IV – Revigorar o Partido
O contexto concreto de atuação do PCdoB é de grande singularidade. O 15º Congresso tem, nesse sentido, dimensão histórica para enfrentar a escalada antidemocrática e anticomunista e assegurar sua representação política-institucional. Tal singularidade exige, nesta hora, linhas de força bem focadas, no âmbito das tarefas gerais da construção partidária, num plano imediato bem definido, centradas nos temas da comunicação, atividades de massas e estruturação partidária.
É imperativo superar limitações e insuficiências que se apresentaram nos últimos anos e levaram ao enfraquecimento de sua influência na luta social e setores médios, com reflexos importantes na sua força organizativa e em seu desempenho eleitoral. Fazer do PCdoB a força consciente, combativa, coesa e militante, para enfrentar o neofascismo e constituir uma ampla frente popular, democrática e patriótica para a transformação do Brasil, demanda um revigoramento geral da vida partidária. São necessárias a atualização e a renovação de suas linhas de ação e construção política, ideológica e orgânica do Partido, adequadas às exigências atuais da luta de classes pela qual o país atravessa.
O Partido forte junto ao povo, orgânico, influente e de grande capacidade de comunicação, é condição insubstituível para constituir maior força eleitoral e assegurar a ação e representação institucional do PCdoB. O Partido precisa ser do tamanho de suas ideias avançadas para a nação e generosas com o povo, como partido de ação política de massas, de luta de ideias, políticas, institucionais e eleitorais, com forte apoio no seio do povo, maior influência na sociedade e mais força nas urnas.
Capacitar o Partido para enfrentar o neofascismo bolsonarista
O enfrentamento da ofensiva ultraconservadora no país requer ação na disputa de ideias e na força de comunicação, na contraofensiva por intermédio das redes digitais contemporâneas, na atualização da imagem e identidade do Partido nos termos das características brasileiras, na luta social em suas múltiplas e renovadas dimensões, no aperfeiçoamento de suas redes organizativas e no protagonismo das liderança, voltando todos esses fatores também para alcançar maior força nas disputas eleitorais.
Nas condições de defensiva estratégica e tática em que vivemos, o fator maior da edificação do Partido é a construção política. Construir a nítida compreensão de sua orientação tática, capacidade de disputá-la em todos os terrenos de ação, para assegurar a unidade, confiança e perspectivas dos quadros partidários. Isso se ampara na construção ideológica, tendo o Programa do PCdoB à frente, mais o permanente esforço de unidade das fileiras militantes, disciplina e espírito coletivo de partido, para um período de resistência.
Política de quadros em consonância com um período de resistência
A política de quadros é imprescindível nessa direção. Ela exige singular atenção ao fortalecimento dos compromissos ideológicos e em torno do Programa Socialista do PCdoB e demanda, mais que nunca, quadros voltados à formação de uma base organizativa sólida e capilarizada, ligada estreitamente às lutas populares, a partir de direções municipais que direcionem a ação para bases.
Ela deve ser dinâmica e sistêmica, para situar os quadros nos desafios em seus melhores papéis, alocar segundo as prioridades dos desafios, fortalecer sua têmpera, servir à construção das bases militantes e à elevação da consciência e organização do povo. Os comitês partidários e órgãos executivos precisam ser fortalecidos, reposicionando quadros mais maduros e comprometidos com quadros novos, em maior proporção de mulheres e jovens.
Neste momento, as lideranças públicas precisam encabeçar o esforço de atrair uma ampla gama de novas lideranças e construir chapa de candidatas e candidatos influentes para alcançar votações expressivas e mandatos eletivos. Uma grande questão a ser encarada com uma responsabilidade nacional, nesse sentido, é um conjunto de iniciativas voltadas ao fortalecimento desse esforço em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas, pela centralidade que assumem nas lutas políticas, sociais e eleitorais.
Linha de ação de massas renovada
No terreno da intervenção concreta, a par da fundamental organização do Partido nos locais de trabalho e estudo, adquire grande importância a atuação em territórios, junto às comunidades e aos bairros populares, na cidade e no campo, onde se manifestam as dificuldades da sobrevivência e da vida das pessoas.
O enfrentamento da carestia, das condições precárias de habitação, da violência, da falta de alternativas culturais e de lazer, e da insuficiência dos serviços públicos de saúde e educação exige variadas formas de organização. Desde as mais tradicionais – sindicatos, associações, movimentos, conselhos participativos e de controle social – e se estendendo aos coletivos de mulheres, aos movimentos antirracistas, aos grupos culturais, de defesa do meio ambiente, aos cursinhos populares, aos núcleos de economia solidária e popular, de geração de renda e trabalho, às ações de solidariedade no combate à fome e em apoio às pessoas com deficiências ou desprotegidas socialmente. Há, também, sobretudo nos bairros populares, ações de solidariedade ao povo realizadas por religiosos, templos e igrejas. Conforme a tradição do Partido de defesa e de respeito à religiosidade do povo, deve-se dialogar também com estes segmentos sobre tais ações.
O Partido precisa se ligar mais profundamente aos trabalhadores em geral, da cidade e do campo, as classes fundamentais que representamos. É preciso dominar as mudanças ocorridas no mundo do trabalho e o novo perfil da classe trabalhadora. Assim, deve-se dar atenção especial às novas categorias de trabalhadores jovens, explorados e sem direitos; às mulheres que atuam e lideram em todas as frentes de luta; aos negros e negras que enfrentam a opressão do racismo e a violência em todas as suas formas; à juventude rebelde que vai às ruas em defesa da educação e da democracia, de oportunidades, contra a opressão racial, de gênero e de orientação sexual.
No contexto de uma guerra cultural, empreendida pela extrema-direita, fazendo uso das redes sociais e de outros meios, é premente reforçar o trabalho do Partido na esfera da luta de ideias. O Partido deverá constituir um plano de luta ideológica e cultural para enfrentar o bolsonarismo e a extrema-direita, formular saídas para a crise, combater os estigmas e preconceitos disseminados contra os comunistas e toda a esquerda. E desenvolver uma ação comunicacional contínua que ressalte o PCdoB como indispensável à democracia e ao Brasil.
Por um salto qualitativo na comunicação digital
Mesmo com a disparidade e assimetria dos meios dos campos em disputa, a internet é o espaço central da comunicação do Partido, e as redes são arenas indispensáveis à luta política, social, cultural e de ideias, como também para a própria organização e estruturação partidárias.
É imperativo empreender um salto qualitativo na capacidade de se comunicar com a sociedade, incrementar a cultura e a prática digital entre os militantes, organizações, mandatos e movimentos. Romper com a compartimentação e efetivar uma sinergia entre portais, influenciadores digitais, lideranças e contas institucionais do Partido, avançando na constituição de um sistema nacional de comunicação, onde um núcleo nacional interage com sistemas estaduais.
A comunicação deve romper com atrasos e deficiências para ter largo alcance, para além dos nossos grupos de relacionamento, ser ágil, leve e contundente, sob o primado da verdade, com a produção de conteúdos próprios, com estética e linguagem próprias às redes digitais. Disputar a tática e posições do Partido, sem sectarismos, repelindo ataques, defendendo suas ideias, para reforçar a unidade no âmbito das alianças. Responder aos anseios e problemas mais sentidos pelo povo, ter foco em temas do Programa partidário a partir dos fatos do dia e da hora. Rechaçar e enfrentar de modo sistêmico o anticomunismo, combatendo os estigmas.
É necessário trabalhar de modo renovado a representação da legenda do Partido na sociedade. Vincar a identidade, lemas e imagem a valores da brasilidade e contemporaneidade. Requer-se disseminar as ideias do Programa, apropriar-se da história brasileira, valorizar a cultura nacional e impregnar-se das singularidades características do povo brasileiro. Revigorar sua essência de partido revolucionário e patriótico, marcado pela rebeldia e a presença intrépida no cotidiano das lutas do povo. Vincular mais e mais a identidade do Partido ao desempenho positivo de seus parlamentares, gestores, lideranças dos movimentos, à vigorosa oposição a Bolsonaro; ao zelo com o patrimônio público. Neste esforço, o Partido deve se apoiar na expertise de vários/as publicitários/as e influenciadores/as digitais de suas fileiras.
Tal transformação na esfera da comunicação requer do Comitê Central, dos Comitês Estaduais e Municipais, decisão política, aporte de meios e recursos, e busca de engajamento de apoio e trabalho voluntário. Ela se orienta, por excelência, ao projeto eleitoral de 2022, promovendo as lideranças que farão parte das chapas, ajudando-as a criar, fortalecer e expandir suas redes.
Estrutura partidária junto ao povo, rede orgânica e territorializada
Todas as frentes de atuação da militância partidária devem convergir para fortalecer o vínculo com a luta do povo, e constituir uma base eleitoral fidelizada à legenda dos comunistas. Para isso, o Partido deve estar junto ao povo, ter base militante extensa, viver e pulsar a dinâmica dos/as trabalhadores/as, da juventude, das mulheres, dos negros e negras, daqueles e daquelas que lutam contra a injustiça e a desigualdade, por oportunidades e um futuro melhor. Demanda uma extensa estruturação nas organizações de base, ampla influência de massas junto aos setores populares e progressistas, e protagonismo eleitoral, com mais lideranças na disputa e mais votos. Construir bases de massa sólidas é tarefa de todos e todas, implica ligar-se permanentemente às lutas em curso, comprometer-se com seu desenvolvimento e resultados. Cada organismo e cada militante são chamados a contribuir na revitalização do Partido nessa dimensão.
O centro do trabalho de direção deve estar nas organizações de bases partidárias, capilarizadas nos territórios populares e setores estratégicos da luta, no sentido de transformá-las em polos de crescimento, de novos militantes e filiados, de espaços de organização das lutas e formação de lideranças. Para isso é fundamental que tenham apoio, presença constante de quadros mais experientes dos órgãos de direção; utilizem meios digitais como fatores organizacionais em tempo real; impulsionem e aglutinem as iniciativas das diversas frentes.
Nesse mesmo sentido, inclui-se a atuação nas entidades sociais. Destaca-se a unificação da CTB e CGTB, fortalecendo a luta sindical e impulsionando a unidade de todas as centrais na luta pelos direitos dos/as trabalhadores/as, pela Vida e pela Democracia, contra Bolsonaro.
Destacada importância tem a 3ª Conferência Nacional do PCdoB sobre a Emancipação das Mulheres, realizada vitoriosamente em março último. Impulsionado e orientado pelas conclusões dessa Conferência, o coletivo militante, no atual contexto de crise com duras consequências para as mulheres, reforçará, sob a ótica do feminismo popular, a jornada pela emancipação das mulheres, igualdade de direitos, condenação da violência e protagonismo nas eleições de 2022.
O Partido realizará a 1ª Conferência Nacional de Combate ao Racismo, antecedida por um Seminário Nacional preparatório, ainda este ano, para a formulação política e teórica, definição de linhas do trabalho popular e partidário e envolvimento de grande contingente de militantes na luta contra a discriminação racial.
Também tem sentido estratégica a atuação junto à juventude. Frente à atual crise civilizatória e de falta de perspectivas e oportunidades, é fundamental despertar em amplos setores das juventudes a consciência de que é preciso combater e superar o sistema capitalista, alterando seu modo de vida e sua relação com o meio ambiente, a cultura, a ciência e o trabalho, na perspectiva do socialismo.
O Partido deve ampliar, também, a presença de jovens em postos de comando, em todas as frentes de atuação social e das organizações partidárias, intensificando a interação com a União da Juventude Socialista e a Juventude Pátria Livre, dando amplo espaço para sua atuação combativa e habilidade com a comunicação digital e a linguagem das redes.
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Os desafios para superar a crise brasileira e assegurar a presença institucional do PCdoB na vida política do país são de grande envergadura e estão interligados. Desafiam, neste 15º Congresso, as presentes gerações de quadros e militantes para celebrarem o centenário da legenda com a perspectiva de sua superação.
O Centenário – sua agenda de comemorações, atividades, publicações – constitui-se um trunfo relevante para emular o coletivo militante e sensibilizar os setores progressistas da sociedade quanto ao legado do PCdoB à Nação, à classe trabalhadora e sua indispensabilidade à democracia e ao país.
O Comitê Central convoca a todos e todas, nas fileiras partidárias, a aprofundarem a elaboração e aplicação dos rumos aqui apresentados, os quais também receberão subsídios a ser incorporados ao debate. Estejamos, todas e todos, confiantes de que, com lucidez, espírito militante e coesão de nosso coletivo, serão superados os desafios atuais.
Brasília, 24 de junho de 2021
Comitê Central do Partido Comunista do Brasil-PCdoB
FRENTE AMPLA: NOVOS RUMOS PARA O BRASIL
Democracia, soberania, desenvolvimento, progresso social
SUMÁRIO
I – CONFLITOS E TENSÕES NO MUNDO, OFENSIVA IMPERIALISTA E LUTA DOS POVOS
II – BALANÇO DOS GOVERNOS LULA E DILMA E AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DO PCdoB
III – GOVERNO ILEGÍTIMO CONTRA O BRASIL E O POVO
IV – FORTALECER O PCdoB E ELEVAR SEU PAPEL NA RESISTÊNCIA